NOVA YORK – Dois anos depois de a Grécia chocar os mercados financeiros pela primeira vez em 2010, a economia política pode finalmente ter chegado ao horizonte de eventos com o país enfrentando insolvência e a saída da zona do euro. Os resultados poderiam ter consequências de longo alcance, mesmo para os Estados Unidos.
Eleições recentes resultam em impasse político
Antes da recente eleição em 6 de maio, ainda havia esperança de que os dois partidos que trabalham com as instituições internacionais que prestam assistência à Grécia formariam um governo de maioria. Depois de terça-feira passada, no entanto, ficou claro que este não seria o caso, com o partido centro-esquerdista PASOK e o centro-direitista Nova Democracia ficando há apenas poucos assentos da maioria necessária.
Em seguida, diálogos sobre a formação de um governo com partidos no outro extremo do espectro político e principalmente contra a austeridade falharam.
O corte de gastos impostos por instituições internacionais como a União Europeia (UE), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Central Europeu (BCE), a chamada “Troika”, em troca de fundos de resgate são muito impopulares entre o povo grego, que expôs sua raiva na eleição recente.
Dado que é impossível formar um novo governo, eleições terão de ser repetidas em junho, devido à dramática situação no país, e já que partidos anti-resgate tendem a ganhar mais votos.
Inconformidade com as regras do resgate forçam a mão da Troika
Sem ninguém na Grécia para assumir a responsabilidade e vastas áreas do serviço público, incluindo o Ministério das Finanças e o órgão de arrecadação tributária, em parcial ou total desligamento, os funcionários da Troika não têm com quem dialogar.
Por outro lado, eles correm o risco de perder prestígio diante da comunidade internacional se a Grécia continua a violar as regras estabelecidas no “Memorando” sobre cortes de gastos e redução da dívida.
Sinais de que a Troika começará a assumir uma postura mais dura e arriscar a saída da Grécia do euro vieram do BCE anteontem. Mario Draghi, presidente do banco central, disse numa conferência de imprensa, “O Conselho Administrativo prefere fortemente que a Grécia continue na zona do euro”, mas também acrescentou que, “Esta não é uma questão para o Conselho Administrativo decidir”, quando perguntado sobre a eventualidade de uma saída da Grécia. Mais tarde na quarta-feira, fontes não identificadas dentro do banco central vazaram que o BCE interromperá as provisões de solvência para alguns bancos gregos que não têm capital suficiente e, portanto, violam os requisitos necessários para obter financiamento direto através do BCE.
Apostas altas para ambas as partes
Dado o fato de que todo o sistema bancário grego depende do financiamento do BCE, sinais de um banco popular estão emergindo.
As pessoas fazem fila para retirar seu dinheiro na frente dos bancos em todo o país. A retirada de depósitos desde as eleições parlamentares em 6 de maio já soma 700 milhões de euros (893 milhões de dólares), segundo um discurso proferido pelo presidente Karolos Papoulias aos líderes do partido na segunda-feira.
“Houve uma retirada de depósitos da Grécia”, disse Charles Dallara, diretor do Instituto Internacional de Finanças (IIF) e negociador-chefe na mais recente reestruturação da dívida, a jornalistas na Irlanda. Ele expressou suas esperanças de que a retirada de depósitos poderia ser contida após novas eleições, “Uma vez que se tenha um novo governo no lugar, se o governo reafirmar sua intenção de permanecer na zona do euro.”
Se o BCE com a aprovação tácita da UE e do FMI deixar a Grécia sair da zona do euro, os custos para ambas as partes serão enormes. JPMorgan Chase estima que o custo para o setor oficial seja de pelo menos 400 bilhões de euros (508 bilhões de dólares), incluindo empréstimos oficiais, a exposição do BCE, e perdas dos bancos da UE. Esta estimativa não inclui as consequências que vão desde uma reação em cadeia nos derivados até o contágio alastrando-se pela Irlanda, Portugal, Itália e Espanha, bem como a enorme perda de credibilidade e confiança que os políticos da UE e, especialmente, o BCE sofrerão.
A Grécia, por outro lado, enfrentaria um colapso econômico completo, e sem um governo, o risco de agitação social não pode ser subestimado.
Analistas do Goldman Sachs resumiram as consequências econômicas numa nota aos clientes, “O ‘parada’ no pagamento [da Troika] precipitaria uma queda imediata da atividade econômica, dada a necessidade de fechar abruptamente o déficit fiscal primário (que vale cerca de 2,3% do PIB em 2011).”
“Com as obrigações do governo (no valor de cerca de 3,5% do PIB) não pagas, o fornecimento para empresas do setor público (por exemplo, energia, abastecimento de água) e hospitais seria interrompido e sua produção e atividades reduzidas. Neste contexto, a rigidez dos salários gregos resultará em aumento do desemprego, enquanto a rigidez do mercado de produtos provavelmente gerará inflação (ou mesmo o aumento dos preços)”, advertiu Goldman Sachs. O tom bastante acadêmico desta análise máscara a tragédia humana por trás disso, que já está acontecendo agora, enquanto o país ruma para a pobreza.
Mercados dos EUA caem financeiramente
Na quinta-feira, todos os principais mercados estavam profundamente no vermelho durante a semana. O euro perdeu 1,79% desde segunda-feira, caindo para 1,27 dólares na tarde de quinta-feira. As ações europeias caíram 4,9% na semana, com os bancos europeus em baixo desempenho, perdendo 8,7%.
Mas devido à natureza complexa e interligada do sistema financeiro global, os bancos norte-americanos não estão de fora, apesar do fato deles estarem mais capitalizados e menos diretamente expostos à Grécia.
O índice do banco norte-americano KBW teve uma queda de 6% na semana, devido ao fato de que esta crise não está limitada à Europa. Como já foi visto com a falência do MF Global, o tumulto na Europa pode afetar bancos norte-americanos, que enfrentam risco correlato na forma de operações de derivativos se um grande banco europeu falhar.
Próximos passos
Os políticos na Grécia neste momento não são capazes de contribuir significativamente de qualquer forma para resolver este problema. Como consequência, o destino da Grécia está firmemente nas mãos da Troika. Se eles permanecerem duros e cortarem o financiamento, a Grécia falhará severamente no pagamento da dívida e sairá do euro, apesar do fato de que ela também poderia deixar de pagar e permanecer no sistema do euro.
Isso, no entanto, é improvável segundo o economista-chefe do Citigroup, Willem Buiter, “Se a Grécia for forçada a sair da zona do euro (digamos que pelo BCE se recusando a continuar emprestando aos bancos gregos através dos canais regulares no sistema do euro e interrompendo o acesso da Grécia a um maior apoio ao crédito (ELA) no banco central grego), não haveria razão para a Grécia não repudiar completamente a dívida pública retida pelo setor privado e pelo BCE.”
Se eles sinalizarem e mantiverem o financiamento à Grécia, a perda de prestígio não poderia ser refeita e seria um convite aberto a outros países como a Irlanda e Portugal não cumprirem as regras que acompanham a ajuda monetária.