Rousseff assina 20 acordos comerciais na primeira viagem à China

19/04/2011 03:00 Atualizado: 11/12/2014 20:19

A Presidente Dilma Rousseff brinda com oficiais brasileiros depois de uma cerimônia de assinatura com autoridades chinesas no Grande Salão do Povo em Pequim em 12 de abril. (NG Han Guan/AFP/Getty Images)

Na manhã seguinte a presidente Dilma Rousseff ter retornado da China, ela disse ao programa de rádio “Café com a Presidente” que bilhões de dólares em acordos comerciais foram assinados com a China, gerando milhares de empregos no futuro para os brasileiros.

Foi a primeira visita oficial de Dilma à Ásia, e sua segunda viagem ao exterior em 100 dias no cargo. Apesar de sua longa estadia de seis dias, ela cobriu um amplo terreno, seu principal foco girava em torno de parcerias de negócios e investimentos. Quando ela voltou, ela estava visivelmente feliz, tendo muito a mostrar por seus esforços.

Incluídos nos 20 ou mais acordos comerciais assinados durante a viagem, estava um investimento de 12 bilhões em dólares no Brasil pela Foxconn, a fabricante do iPad, e um compromisso combinado de 600 milhões de dólares com as gigantes das telecomunicações Hawuei e ZTE. Ela também fechou acordo para expandir a presença existente da Embraer na China. A Embraer é uma das maiores fabricantes de aeronaves do mundo. O acordo envolve a fabricação de 35 jatos Legacy, uma operação de 1,4 bilhões de dólares. Por sua vez, o Brasil prometeu dar a China seu reconhecimento de status de economia de mercado há muito tempo esperado.

Rousseff, e seu homólogo chinês, Hu Jintao, também assinaram acordos nas áreas da educação, esportes, ciência, tecnologia e campos de energia. Ambos se comprometeram a ampliar e diversificar os investimentos através de parcerias empresariais, especialmente nos setores de alta tecnologia e automotiva, bem como nos setores de logística de mineração e energia.

Um dos principais desafios que a líder do Brasil enfrenta, é como mudar o desequilíbrio comercial entre os dois países, algo que é improvável de ser conseguido através de uma missão comercial.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil, e o maior destino das exportações brasileiras, principalmente materiais. A China, por sua vez, exporta quantidades maciças de produtos manufaturados baratos para o Brasil.

“Nenhum país pode aspirar ao isolamento nem assegurar sua prosperidade à custa dos outros”, disse Rousseff na conferência de imprensa conjunta, após seu primeiro encontro com Hu.

“O mercado chinês está aberto. A China convida Brasil a exportar mais produtos para nosso país, especialmente produtos com elevado valor acrescentado. Esperamos que a visita da Presidente Dilma possa levar as relações econômicas e comerciais existentes entre a China e o Brasil a um novo nível”, disse Hong Lei, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês.

No meio de sua visita, em 14 de abril, Rousseff se juntou a seus parceiros do BRICS, China, Rússia, Índia e África do Sul para uma cúpula em Sanya, numa ilha tropical no sul da China. O grupo originalmente formado para pressionar por reformas políticas internacionais e financeiras, como um contrapeso para as poderosas instituições dominadas pelos EUA e UE, como as Nações Unidas.

Membros da cúpula do BRICS concordaram que a reforma é necessária para que a ONU possa “lidar com os atuais desafios globais com mais sucesso”. A Líbia, é claro, é um excelente exemplo de um desses desafios.

A reforma da ONU, especialmente a expansão do Conselho de Segurança para incluir países como Brasil, Índia e África do Sul (Rússia e China já são membros), é uma questão fundamental para o Brasil. Numa conferência de imprensa conjunta, realizada após a reunião, Dilma Rousseff disse, “A reforma da ONU e seu Conselho de Segurança são essenciais, porque não é possível começar a segunda metade do século 21, ligado a um arranjo institucional criado após a guerra.”

Encerrando sua visita oficial em 15 de abril, acompanhada por 300 empresários brasileiros, Dilma Rousseff participou do Fórum Econômico de Boao para a Ásia, versão asiática do Fórum Econômico Mundial. A presidente disse que a experiência do Brasil com programas destinados a combater a pobreza requer controlar a inflação, sem comprometer o crescimento econômico. Ela disse que seu governo está empenhado em resolver os problemas de infraestrutura que dificultam o investimento.

Rousseff também deixou claro para a China que o Brasil tem “Estado de Direito democrático, estabilidade política, compromisso com os direitos humanos e a sustentabilidade ambiental, e um profundo senso de autoestima do nosso povo.”

Crescimento desequilibrado

O comércio bilateral entre os dois gigantes emergentes, cresceu mais de 600% desde 2004, passando de 9,1 bilhões de dólares para 56,3 bilhões. Depois de passar os EUA, a China é agora o maior parceiro comercial do Brasil.

Segundo o Ministério do Desenvolvimento e Comércio Exterior do Brasil, 83,7% das exportações brasileiras para a China são matérias-primas, como soja e minério de ferro, enquanto 97,5% das importações brasileiras da China são produtos manufaturados. Além disso, quase 90% dos investimentos chineses no Brasil são direcionados aos setores de recursos naturais. Numa entrevista à televisão NTD, quase 50% dos fabricantes brasileiros dizem ter perdido quota de mercado para a China.

De acordo com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, as indústrias brasileiras relataram perdas de 15,2 bilhões de dólares, devido à feroz concorrência de produtos chineses baratos, a desvalorização artificial da moeda chinesa, e amplo uso da China do trabalho escravo, informou O Globo.

Segundo a Confederação Nacional da Indústria, 67% das empresas brasileiras têm sido prejudicadas, de uma forma ou de outra por produtos chineses baratos.

Marcelo Coutinho, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, diz que ainda é muito cedo para tirar conclusões. “As conquistas da viagem comercial da Presidente Dilma à China não são desprezíveis, mas não alteram a situação de desigualdades que marcam atualmente as relações entre os dois países.”

Reforma da ONU, democracia e direitos humanos: pontos frágeis

A diplomacia era o foco da reunião, não os direitos humanos. “Os direitos humanos são um dos aspectos da política internacional que se tornaram mais valorizados pelo governo Dilma, mas não é o único item da agenda. A mudança na política externa para os direitos humanos deve ser feita de forma gradual e cautelosa”, disse Coutinho.

Em sua campanha eleitoral, a ex-guerrilheira Dilma Rousseff disse que as pessoas nunca devem deixar de se levantar contra prisões políticas e censura. Por outro lado, ela também afirmou que “negócio é negócio”.

No entanto, agora que o Brasil busca aumentar as relações comerciais com a China, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil disse que abordar o tema dos direitos humanos com a China era “contraprodutivo”.

Na verdade, a questão dos direitos humanos nunca foi abordada no comunicado oficial, assinado por representantes dos dois governos. A única menção de Dilma sobre o assunto foi feita numa entrevista coletiva em Boao na sexta-feira. Ela disse, “Todos os países têm problemas de direitos humanos. Nós também temos problemas com isso.”