Revolta na Ucrânia: países ocidentais devem atender pedidos de ajuda

11/02/2014 14:29 Atualizado: 11/02/2014 14:30

Dois meses de protestos em Kiev e agora toda a Ucrânia ocidental e o Leste russificado são parte de uma luta renovada pela integridade democrática pós-soviética e pela soberania nacional de um povo corajoso e sofrido.

O Canadá foi o primeiro país ocidental a reconhecer a independência da Ucrânia após 28 milhões – 92% dos eleitores elegíveis – votarem no referendo de 1991 para declarar independência da Rússia. Muitos canadenses têm uma história longa e estreita com a Ucrânia.

O sentimento de nacionalidade ucraniana sobreviveu séculos de ocupação estrangeira e opressão. Em 1918, uma Ucrânia independente foi proclamada, mas sobreviveu apenas até 1920; dois anos depois, a maior parte do território ucraniano foi incorporada à União Soviética. O poeta nacional Taras Shevchenko denominou a Ucrânia como “esta nossa terra que não é nossa”.

Os canadenses de origem ucraniana (cerca de 1,2 milhão) têm desempenhado um papel importante em nossa própria história. Nas três ondas de imigração do que é agora a Ucrânia, aproximadamente três quartos se estabeleceram primeiramente no Oeste do Canadá. Eles estavam entre aqueles que desbravaram terras depois de 1896 e estão entre os colonos mais proeminentes da região.

Eles também superaram desafios além daqueles enfrentados pelos colonos de outros países, como a Lei de Medidas de Guerra de 1914 de Ottawa para o internamento de cerca de 6 mil austro-húngaros, a esmagadora maioria dos quais eram ucranianos. Como Vera Lysenko observou em seu livro “Men In Sheepskin Coats”, durante a I Guerra Mundial: “Uma medida repressiva seguida de outra, dirigida contra os perplexos ucranianos. Milhares de (ucranianos) inofensivos foram presos pela polícia e levados para campos de concentração…”

Tragicamente, os ucranianos foram rebaixados para o status de imigrantes “não-preferenciais” em Ottawa na década de 1930; sem isso, uns 3 milhões de ucranianos, que foram mortos de forma deliberada por Stalin, segundo o professor de história de Yale Timothy Snyder em seu livro “Bloodlands”, poderiam ter escapado para o Canadá. Como um dentre 1.100 observadores canadenses das eleições de 2006 na Ucrânia, eu fui detido por um eleitor, implorando em seus 80 anos num posto de votação perto da fronteira com a Rússia, enquanto ele recontava por meio de um intérprete como seus pais morreram de fome praticamente na sua frente quando era criança no inverno de 1932-1933.

O historiador James Gray explicou em sua abra “Winter Years” o que muitos ocidentais enfrentaram na década de 1930 após a Grande Depressão: “Para eles [ucranianos, poloneses e judeus], Winnipeg estava longe de ser uma cidade de 250 mil na qual eles também eram livres para procurar trabalho. Cerca de dois terços da cidade estava barrada e fechada para eles… Qualquer pessoa com um nome ucraniano ou polonês quase não tinha chance de trabalho, exceto o trabalho duro manual.”

Apesar de tudo, na II Guerra Mundial, um número estimado de 40 mil ucranianos-canadenses, ou mais de 10% de toda a comunidade no Canadá na época, se alistaram nas nossas forças armadas. Depois, muitos milhares de ucranianos, que foram deportados de campos de trabalhos forçados, campos de concentração ou fábricas alemãs, se recusaram a voltar para a Ucrânia, pois esta já era totalmente parte da União Soviética.

A repatriação trágica de muitos milhares deles foi finalmente terminada e os refugiados restantes da Ucrânia receberam o status de “deslocado” e foram reassentados no exterior. Entre 1947 e 1953, aproximadamente 34 mil ucranianos vieram para o Canadá, muitos deles profissionais bem-educados. Eles e as gerações que chegaram desde a década de 1890 ajudaram a moldar o Canadá que vemos hoje.

Os protestos dos últimos meses de amplos grupos de oposição, incluindo uma estimativa de 90% dos residentes de Kiev e talvez metade da população total da Ucrânia, contra o profundamente corrupto presidente Viktor Yanukovich e seu partido político, seus comparsas, oligarcas e o líder russo Vladimir Putin, continuam altamente voláteis. A legislação draconiana de Yanukovich contra os manifestantes só inflamou as tensões. Infelizmente, os manifestantes ainda não têm quase nenhuma organização geral, liderança ou estratégia.

Onde está a pressão econômica da Europa, Canadá, EUA e outros países democráticos para compensar os US$ 15 bilhões oferecidos por Putin para atrair a Ucrânia de volta ao redil russo? Muitos manifestantes foram às ruas durante semanas, porque eles querem fazer parte da Europa e se opõem fortemente ao acordo Putin-Yanukovich.

A Ucrânia não é a Rússia e os defensores mundiais da dignidade humana devem fazer o que for possível para promover esta realidade. Muitos ucranianos-canadenses e outros em nosso país e em outros lugares buscam:

• sanções específicas contra Yanukovich, seus ministros e deputados, que apoiaram a legislação da polícia estatal; os promotores/juízes que têm condenaram manifestantes pacíficos e membros da família imediata desses indivíduos;

• vistos rápidos e sem custo para os manifestantes feridos, suas famílias e parentes de manifestantes assassinados;

• observadores também deveriam ser enviados para documentar os processos judiciais contra manifestantes e registrar os feridos que chegam aos hospitais e clínicas e os corpos que chegam aos necrotérios de Kiev;

Por dois meses, ucranianos-canadenses têm estado angustiados, pois já viram Yanukovich brutalizar seus ‘irmãos’ e ‘irmãs’, enquanto ele tenta introduzir um Estado policial com o incentivo e a ajuda do Kremlin. O Canadá deve se manter firme ao lado do povo ucraniano pela independência nacional e a democracia.

Felizmente, o calendário dos Jogos Olímpicos de Inverno impede que Putin desencadeie violência russa na Ucrânia – pelo menos até que a tocha dos Jogos se extinga em Sochi. Canadá, Europa e EUA devem agir agora.

David Kilgour foi membro do Parlamento canadense em 1979-2006 e atuou como secretário de Estado (Ásia-Pacífico) em 2002-2003. Ele foi proibido de entrar na Rússia desde 2011 por causa de seu livro de 2009 “Colheita Sangrenta“, coescrito com o advogado internacional David Matas

Originalmente publicado no Yahoo Canadá