A crise na Ucrânia provavelmente acabará com a Rússia controlando de forma permanente a Crimeia, e com o restante do país mais firmemente aderido à órbita russa do que o previsto algumas semanas atrás. É fácil atribuir tudo ao apetite imperial do presidente russo Vladimir Putin, mas por um longo tempo agora o Ocidente tem perseguido políticas econômicas em relação à Rússia que servem muito mal a seus objetivos.
Desde a queda do Muro de Berlim, os Estados Unidos e seus aliados europeus têm agido como se a transição da Rússia para uma democracia não-ameaçadora pudesse ser acelerada por meio do engajamento econômico. Após a II Guerra Mundial, o aprofundamento do comércio ajudou a superar séculos da inimizade entre os Estados da Europa Ocidental.
A Rússia fornece 30% do fluxo de gás natural da Europa – metade passa através da Ucrânia – e é um importante fornecedor de petróleo bruto e outros recursos fundamentais ao Ocidente. Por outro lado, a Rússia depende da Europa para máquinas sofisticadas, produtos químicos e produtos de uso diário para preencher suas prateleiras. A França está construindo navios para modernizar a Marinha russa e multinacionais ocidentais estão ajudando a reequipar sua indústria automobilística e viabilizar o petróleo e o gás em locais de difícil acesso no Ártico.
Apesar das limitações constitucionais e protestos nas ruas, Putin tem conseguido comandar a Rússia desde 1999. Ele arriscou repetidamente a cooperação econômica com o Ocidente, usando os suprimentos de gás natural da Rússia para avançar sua agenda, e travou guerras na Chechênia no início de 2000 e na Geórgia em 2008.
Isso expressa a doutrina de política externa de Putin, que a Rússia tem uma esfera de interesse privilegiado em países ex-soviéticos – algo que o Ocidente se recusa a reconhecer formalmente, mas deu-lhe todas as razões para esperar. Afinal de contas, o Ocidente duas vezes pisou no freio sobre a agressão russa, mas fez pouco em resposta, preservou a participação da Rússia no G8 e concedeu-lhe a entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC).
Enquanto isso, Moscou está formando uma união aduaneira com Estados ex-soviéticos para conter os laços econômicos com a União Europeia (UE), e aumentar a influência de sua política externa. A chanceler alemã Angela Merkel se queixou de Putin estar vivendo em “outro mundo”, e ponderou se ele está “em contato com a realidade”. Dificilmente. Putin agarra firmemente seus objetivos e a determinação dos ocidentais que possam parcialmente frustrar sua reconstituição do império soviético.
O Ocidente tem uma ampla gama de sanções que podem ser aplicadas, mas todas têm consequências negativas recíprocas. Por exemplo, eles podem congelar ativos russos, mas seus bancos têm significativa exposição – Société Générale da França e UniCredit SpA da Itália, entre outros, tem operações substanciais na Rússia.
Infelizmente, o presidente americano Barack Obama, Merkel e a maioria dos outros líderes ocidentais estão dispostos a avaliar a crise ucraniana como um incidente isolado e concluir que a Crimeia, com seu porto para a frota do Mediterrâneo, é muito mais importante para a Rússia do que para o Ocidente.
A Polônia, presa entre a Alemanha, a Rússia e uma história trágica, é mais realista, e seus líderes mais inclinados a concordar com o senador americano Marco Rubio (R-Fla.), que disse: “A própria credibilidade e as fronteiras do mundo pós-Guerra Fria estão em jogo.”
Empregar todas as medidas – sanções de comércio, congelamento de ativos e restrições de viagem aos líderes russos – seria caro e doloroso. E os europeus finalmente terão de desenvolver suas substanciais reservas de gás natural, que podem ser libertadas por meio de fracionamento (fracking), e diversificar suas importações.
Reordenar as relações com a Rússia, como se a Guerra Fria tivesse despertado de uma longa hibernação pode parecer reacionário, mas é realista. A Rússia quebrou a paz, o engajamento econômico falhou e continuar essa política nada mais é do que apaziguamento.
Putin está raspando a ferrugem da Cortina de Ferro e é apenas uma questão quanto a oeste os líderes americanos e europeus lhe permitirão fincar o arrame farpado.
Peter Morici é professor da Robert H. Smith School of Business da Universidade de Maryland e um reconhecido especialista em política econômica e economia internacional. Anteriormente, ele atuou como diretor do Escritório de Economia da Comissão Internacional de Comércio dos EUA