Repressão à indústria do sexo na China volta povo contra governo

11/02/2014 12:00 Atualizado: 11/02/2014 12:00

A emissora estatal China Central de Televisão (CCTV) foi com força total recentemente numa investigação agressiva expondo a desenfreada indústria do sexo na cidade de Dongguan, mostrando como bordéis operam em plena luz do dia e como a polícia não faz nada para impedi-los. Prostitutas cobriam o rosto em sinal de humilhação enquanto as câmeras rodavam.

Como muitas coisas na China, a prostituição é tecnicamente ilegal, mas na realidade a lei é amplamente ignorada, inclusive por aqueles que deveriam aplicá-la.

Dezenas de locais de venda de serviços sexuais – sob a forma de casas de massagem, salões de beleza e até hotéis de alta classe – foram expostos na reportagem de 9 de fevereiro. Muitos deles foram fechados e um grande número de envolvidos foi preso. Dois chefes de polícia também foram demitidos.

Repórteres da CCTV usaram câmeras escondidas para documentar uma espécie de concurso de beleza, em que clientes podiam selecionar prostitutas que desfilavam com etiquetas de preço. As instalações anunciavam disponibilizar uma grande variedade de serviços sexuais.

No entanto, a opinião pública foi fortemente crítica à abordagem da CCTV. Uma torrente de comentários irritados encheu os blogues da China e as redes de (microblogues) Weibo. Internautas expressaram simpatia com as mulheres que se voltaram para a prostituição, e acusaram a CCTV de hipocrisia, pois a própria estação foi constrangida anteriormente por uma série de escândalos sexuais picantes.

‘Bordel nacional’

Entre as observações cáusticas e perguntas sarcásticas feitas pelos internautas havia: “Um bordel nacional expõe bordéis civis”, “Quantas belas apresentadoras de televisão foram contratadas como amantes de altos oficiais?” e “Todos os altos oficiais têm amantes! Por que vocês não revelam isso?” Muitos dos comentários foram feitos no Sina Weibo, um mídia social chinesa semelhante ao Twitter.

A CCTV é a porta-voz da propaganda oficial do Partido Comunista Chinês (PCC), e tenta manter uma imagem de compromisso austero com os valores socialistas, mesmo que seus oficiais tenham sido amplamente reportados envolvidos em devassidão, violência contra as pessoas comuns e desfalque do erário público.

Por causa de seu papel fundamental na difusão da mensagem do PCC, os internautas dizem que a exclusiva emissora nacional CCTV “vendeu sua alma”.

Esta observação instantaneamente se tornou viral na internet chinesa e despertou muitos elogios e risadas: “Desde o incidente da CCTV expondo a indústria do sexo em Dongguan, podemos ver que alguém que vendeu sua alma menospreza pessoas que vendem seus corpos.”

Hao Jian, professor da Academia de Cinema de Pequim, entrou na conversa dizendo: “Os trabalhadores do sexo têm ainda mais dignidade do que os jornalistas, editores e produtores da CCTV que os expuseram… Pelo menos não há corrupção burocrática na indústria do sexo.”

Ele continuou: “Há inúmeras queixas na China. Quando a CCTV as retratou? A coisa mais imunda é vender a própria alma!”

Proteção oficial

O relatório oficial sobre a repressão em Dongguan explicitou outra pergunta dos telespectadores: “Afinal, por que a indústria do sexo é tão desenfreada na China?”

Dongguan, conhecida como um centro de fabricação e processamento de produtos de exportação, tem sido conhecida por anos como a Cidade do Pecado da China. Serviços sexuais estão disponíveis abertamente lá há uma década e a polícia praticamente não intervém.

“Isso não é nenhuma surpresa”, escreveu um internauta em resposta à reportagem da CCTV. “Sem a proteção dos mais altos escalões do governo, como isso poderia ser tão desenfreado?”

Interesses políticos estão vinculados a algumas partes da indústria. Liang Yaohui, por exemplo, o presidente do Crown Prince Hotel, um hotel cinco estrelas que oferece serviços sexuais como relatados pela CCTV, é também um político. Ele é o representante da província de Guangdong no Congresso Popular Nacional, o legislativo-carimbo que funciona em sincronia com o Partido Comunista.