Reportagem sugere que liderança chinesa repudia perseguição contra o Falun Gong

23/02/2016 23:59 Atualizado: 23/02/2016 23:56

A campanha anticorrupção do líder do Partido Comunista Chinês, Xi Jinping, está entrando em seu quarto ano. Dezenas de milhares de oficiais do PCCh foram investigados e, muitos dos que já foram os homens mais poderosos da China, foram depostos e condenados. Em 12 de janeiro, o primeiro alto funcionário de 2016 foi condenado e sentenciado.

No ocidente, notícias da condenação do ex-vice-ministro de Segurança Pública, Li Dongsheng, focaram na sentença de 15 anos que ele recebeu por suborno. Mas a cobertura do julgamento de Li na China revelou muito mais, sugerindo que a atual liderança do Partido Comunista considera que a perseguição contra o Falun Gong seja de responsabilidade da facção do partido leal a Jiang Zemin.

Desde o início, as acusações de corrupção sobre Li Dongsheng têm sido relacionadas a seu papel na perseguição contra o Falun Gong.

Em dezembro de 2013, quando o site oficial da Comissão Central de Inspeção Disciplinar anunciou a investigação de Li Dongsheng, foram citados três de seus títulos: vice-chefe do Grupo Central de Liderança para a Prevenção e Controle de Assuntos Relacionados a Cultos; chefe de Gabinete do Grupo Central, também conhecido como Agência 610; e Vice-Ministro de Segurança Pública.

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Essa foi a primeira vez que as autoridades chinesas admitiram oficialmente a existência do Grupo de Liderança e sua Agência 610, que foi estabelecida em 10 de Junho de 1999 pelo então líder do Partido, Jiang Zemin, para eliminar a prática espiritual do Falun Gong. A exposição do nome dessa agência secreta sugeriu fortemente que o verdadeiro crime de Li Dongsheng estava, de alguma forma, ligado ao Falun Gong.

Quando Li Dongsheng foi condenado, a agência estatal de notícias, Xinhua, mencionou apenas o título “vice-ministro de Segurança Pública” em sua reportagem, mas no mesmo dia a revista de negócios, Caixin, colocou Li de volta ao contexto de seu papel na perseguição contra o Falun Gong.

‘Arma afiada’

A Caixin tem desempenhado um papel especial na China, nos últimos três anos. A revista publica regularmente notícias que parecem sair diretamente de dentro de Zhongnanhai, sede da liderança do Partido. Por suas “colheradas” sobre a campanha anticorrupção, é assumida uma estreita relação entre a revista e o cabeça desta empreitada, Wang Qishan. Rumores também ligam a Caixin ao atual líder do Partido, Xi Jinping.

A notícia, publicada pela Caixin, trazia a manchete: “Assessor de Confiança de Zhou Yongkang e Ex-Vice-ministro de Segurança Pública, Li Dongsheng, condenado a 15 anos em seu primeiro julgamento”. Em 2009, Li foi promovido a chefe da Agência 610 e vice-chefe do Grupo de Liderança, junto ao cargo de Vice-Ministro da Segurança Pública. Um único parágrafo mencionou dois títulos de Li relacionados à perseguição ao Falun Gong. Em seguida, a revista afirmou que Li foi formalmente promovido a oficial de nível ministerial de alto escalão e, portanto, tornou-se “arma afiada de Zhou Yongkang” em Outubro de 2009.

A frase “arma afiada de Zhou Yongkang” é muito interessante. Nenhuma lei autoriza a perseguição realizada por Li, entretanto, esta é uma campanha política do Partido. Quando Li Dongsheng assumiu as posições no Grupo de Liderança na sua Agência 610, ele deveria ter sido considerado a arma do Partido, e não de Zhou Yongkang.

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Quando Jiang Zemin começou a campanha contra o Falun Gong, ele era o supremo líder do Partido, portanto, o Partido, como um todo, aderiu à campanha. Durante esse período, Jiang e o Partido eram o mesmo. Quem, dentro do Partido, não se juntou ativamente à perseguição foi exceção e, portanto, não representava o partido, só a si mesmo.

Quando Jiang Zemin aposentou-se, parcialmente em 2002 e totalmente em 2004, houveram mudanças sutis na administração do Partido. Estas mudanças enfraqueceram a autoridade do seu líder supremo, aumentando a autonomia dos líderes individuais e garantindo a Jiang Zemin a continuidade da sua influência sobre a direção do Partido. O número de membros do Comitê Permanente do Politburo, órgão mais poderoso dentro do Partido Comunista, aumentou para nove. Os membros adicionais eram leais a Jiang e, combinados com os membros efetivos anteriores que também eram leais a ele, deram a Jiang uma influência majoritária.

Além de aumentar o tamanho do Comitê, Jiang decidiu que cada membro estaria apenas no comando de sua própria função e ninguém deveria ter o poder de veto sobre os outros. Luo Gan e Zhou Yongkang, que substituiu Luo em 2007, tornaram-se membros do Comitê Permanente e encarregados da perseguição contra o Falun Gong, de forma que os novos arranjos lhes garantiram liberdade total.

A mensagem subliminar no artigo da Caixin referindo-se a “arma afiada de Zhou Yongkang” é que Hu Jintao e Wen Jiabao, os dois principais líderes da época, não foram responsáveis ​​pela perseguição.

Conspiração

Em Junho de 2015, Zhou Yongkang foi condenado à prisão perpétua por três crimes: recebimento de suborno, abuso de poder e revelação de segredos de Estado. Mas essas acusações não compreendem todos os seus crimes ou mesmo o pior dos seus crimes. Seus crimes reais podem ser divididos em pelo menos três partes: corrupção, conspiração contra Xi Jinping (agora referido na imprensa oficial como atividades políticas não-organizacionais), e a perseguição contra o Falun Gong e outros grupos religiosos.

O artigo da Caixin indica que a corrupção de Li Dongsheng e a perseguição contra o Falun Gong estão ligadas a Zhou Yongkang. Teria a Caixin também indicado que Li era uma arma na conspiração de Zhou?

Em junho de 2012, a Bloomberg publicou uma reportagem exclusiva sobre a suposta riqueza da família de Xi Jinping, que na época era o pressuposto sucessor de  Hu Jintao como líder supremo. A publicação deste tipo de informação é levada muito a sério pelos líderes do Partido Comunista, uma vez que tal vazamento de informação ameace a sua capacidade de manter e exercer o poder.

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A reportagem da Bloomberg equivale a um tipo de ataque a Xi. Analistas sobre a China afirmaram que a Bloomberg teria grande dificuldade em desenvolver as informações no artigo sozinha. Presume-se que uma conspiração relacionada com a facção de Jiang estaria por trás do artigo.

Logo após o anúncio, em Dezembro de 2013, de que Li estava sendo colocado sob investigação, o Apple Daily, de Hong Kong, informou que o jornalista Gao Yu, agora preso, disse que a fonte da informação sobre a fortuna da família de Xi Jinping tinha sido rastreada à Central da Agência 610. Outra fonte disse ao Apple Daily que a Agência 610 também vazou informações sobre fortunas de muitas outras famílias de elite para a imprensa estrangeira, mas não a de Zhou Yongkang.

Fontes dentro do Partido Comunista haviam descrito planos feitos por membros da facção de Jiang para derrubar Xi depois que ele assumiu o poder. Essa tentativa de golpe foi derrotada, mas as tentativas de minar Xi persistiram. Se o relatório do Apple Daily for verdadeiro, Li Dongsheng e sua Agência 610 tornaram-se a arma de Zhou e da facção de Jiang Zemin no suposto esforço contra Xi.

Promoção surpreendente

Quando o artigo da Caixin falou sobre Li ter se tornado a arma de Zhou, foi especificado que isto aconteceu em outubro de 2009, quando Li Dongsheng, sem qualquer formação jurídica e experiência anterior, surpreendentemente assumiu a posição de Vice-Ministro da Segurança Pública. A Caixin não deu qualquer explicação. Isso porque nem a Caixin, nem qualquer outra mídia chinesa, foi autorizada a explicar.

No currículo, Li não tinha experiência relevante para a sua posição como vice-ministro da Segurança Pública. Li havia trabalhado em diferentes unidades desde o início dos anos 1990, todas na máquina de propaganda do PCCh. A Central da Agência 610 fornece o elo perdido que liga seus dois papéis na máquina de propaganda e na segurança pública.

Em Junho de 1999, Li Dongsheng tornou-se o vice-chefe da recém-criada Central da Agência 610 e vice-diretor da Central Chinesa de TV (CCTV). Ele estava encarregado da propaganda contra o Falun Gong e lavagem cerebral. Em janeiro de 2001, o chefe de Li na Agência 610, Luo Gan, encenou a autoimolações na Praça Tiananmen, em um esforço para desacreditar o Falun Gong. Li orquestrou a propaganda sobre este incidente para incitar o ódio popular contra os praticantes do Falun Gong.

Na época, Li era o vice-diretor da Administração Estatal de Rádio, Cinema e Televisão, organização superior à CCTV e à outros porta-vozes do Partido. Em seguida, ele foi promovido a vice-diretor da Central do Departamento de Propaganda, enquanto manteve sua posição de vice-chefe da Central da Agência 610.

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Em outubro de 2009, quando Liu Jing, então chefe da Central da Agência 610, estava prestes a se aposentar, era difícil encontrar um substituto, porque mesmo no Partido, não é fácil encontrar alguém que seja mau o suficiente para pegar este trabalho e fazê-lo bem, e que também seja de confiança para Zhou Yongkong.

Li Dongsheng esteve na posição de vice-chefe por 10 anos. Ele era notório por sua ganância (aceitação de suborno), corrupção (trabalhando como cafetão fornecendo jovens apresentadoras da CCTV para Zhou Yongkang e outros líderes centrais corruptos), e crueldade (torturando aqueles que recusavam a lavagem cerebral). Com essas qualificações, ele poderia ser confiável e foi o melhor e único candidato.

Além disso, após 2004, o regime havia mudado sua estratégia para reprimir o Falun Gong. Ele tentou esconder a perseguição para evitar críticas internacionais sobre suas violações dos direitos humanos. A propaganda de ataque ao Falun Gong já não era prioridade. O punho de ferro a portas fechadas tornou-se o método principal. Ser um chefe de propaganda não era suficiente para comandar a força-tarefa para fazer o trabalho. Essa é a única razão pela qual Li Dongsheng foi nomeado para liderar a força policial, assumindo uma posição de autoridade em um campo em que ele não tinha experiência.

De acordo com as informações comunicadas por Xinhua sobre a condenação, Li Dongsheng começou a abusar do seu poder para beneficiar a si mesmo e a sua família de 1996 a 2013, e aceitou subornos de cerca de 20 milhões de yuans (US $ 3,3 milhões) de 2008 a 2013. Sendo propaganda e Segurança Pública dois campos totalmente diferentes, é difícil imaginar que Li poderia carregar suas conexões relacionadas à corrupção de sua posição antiga para sua nova posição. Segundo o tribunal, a alegação de corrupção começou antes dele ter sido nomeado Vice-Ministro da Segurança Pública em 2009.

A única posição que poderia ligar sua corrupção nos dois trabalhos diferentes era o seu cargo na Agência 610. Isso também sugere que a corrupção de Li Dongsheng nunca havia sido investigada antes de Xi Jinping ter assumido o poder, por causa de sua posição na Agência 610 e sua postura contra o Falun Gong.

Heng He é repórter do Epoch Times.

As opiniões expressas neste artigo são opiniões do autor e não refletem necessariamente as opiniões do Epoch Times.