De acordo com a mídia estatal da China, o Partido Comunista Chinês (PCC) acabará discretamente com uma política que incentiva funcionários locais a punir indivíduos de suas jurisdições que apelam em Pequim pela reparação de injustiças.
O Regulamento de Petição teve sua origem nos primórdios da perseguição à disciplina espiritual do Falun Gong. O então líder chinês Jiang Zemin temia o grande número de adeptos do Falun Gong – mais numerosos do que os membros do PCC – e também temia a atratividade e influência dos ensinamentos da prática sobre o povo chinês. Assim, ele ordenou a erradicação do Falun Gong.
Imediatamente após o Falun Gong ser proibido em 20 de julho de 1999, seus praticantes começaram a inundar Pequim para apelar às autoridades centrais que revertessem sua decisão.
Estádios foram lotados com praticantes detidos e, apesar do tratamento áspero nas mãos das autoridades, os praticantes continuavam chegando. De acordo com praticantes que estavam em Pequim na época, cerca de 1 milhão deles se reuniram na cidade em outubro de 1999 para apelar.
Numa série de artigos que descrevem a perseguição ao Falun Gong na cidade de Weifang, pelos quais Ian Johnson ganhou o Prêmio Pulitzer, ele relatou como as autoridades locais passaram a ser responsabilizadas se os praticantes a caminho de Pequim chegassem a 480 quilômetros da capital.
Em 2000, Johnson informou que 11 praticantes do Falun Gong de Weifang, que apelaram em Pequim, morreram sob tortura. As autoridades centrais pressionaram as autoridades provinciais, que por sua vez pressionaram as autoridades de Weifang, que finalmente brutalizaram os praticantes.
“Não há dúvida de que o sistema hierárquico de controle das petições foi uma das muitas tentativas de forçar as fileiras do regime chinês a impedirem praticantes do Falun Gong de apelarem”, escreveu Levi Browde, diretor-executivo do Centro de Informações do Falun Dafa, ao Epoch Times por e-mail.
Manutenção da estabilidade
Em 2005, este sistema de responsabilizar as autoridades locais foi formalizado no Regulamento de Petição. De acordo com o regulamento, uma lista com o número total de petições originárias de cada província da China é contabilizada e preservada. Essa lista, em seguida, é usada para determinar as realizações políticas dos funcionários do governo, segundo a mídia estatal.
“Por muitos anos, houve dois grandes critérios para avaliar e selecionar funcionários dos governos locais na China. Um deles é o PIB local e o outro é a manutenção da estabilidade, o que significa que não pode haver muitos peticionários ‘perturbando a ordem’”, disse Yang Jianli, um defensor da democracia e fundador da organização de direitos civis ‘Initiatives for China’, ao Epoch Times por telefone.
Ele acrescentou: “O regime chinês não relaciona quantos casos de reclamações existem ou sua gravidade a uma falha na governança, mas olha apenas o número de peticionários. Assim, o número de petições reportadas pelas autoridades provinciais é ridículo.”
O Regulamento de Petição passou a fazer parte do sistema de manutenção da estabilidade – uma coleção de práticas empregadas pelo PCC para suprimir a dissidência na população.
Embora a inspiração para o Regulamento de Petição visasse a prevenir que os praticantes do Falun Gong fizessem protestos altamente visíveis na Praça da Paz Celestial, a política logo utilizou as mesmas táticas em outros grupos.
Por outro lado, os praticantes do Falun Gong começaram a mudar sua abordagem, escolhendo formas mais discretas de desobediência civil para transmitir sua mensagem.
Agricultores cujas terras foram desapropriadas pelos governos locais começaram a ir a Pequim para apelar. Assim como aqueles que sofrem com a poluição industrial ou são vítimas de abusos da política do filho único ou qualquer outra queixa de uma longa lista na China atual.
Sem solução
A pressão da sociedade chinesa sobre as políticas de manutenção da estabilidade colocam o regime comunista chinês num “círculo vicioso”, segundo Yang Jianli, e abolir o Regulamento de Petição não solucionará as queixas da população.
“Abolir a avaliação de apelações não resolve o problema em nada, porque os dilemas dos governos locais não serão resolvidos”, disse Yang. “Se o governo chinês continuar a saquear as pessoas financeiramente e suprimi-los politicamente, os peticionários ainda terão queixas e continuarão a apelar em Pequim, o que pressiona à segurança pública. Então, os governos locais permanecerão pressionados pela manutenção da estabilidade e continuarão a reprimir os peticionários.”
De acordo com Yang, diferentes tipos de reforma são necessários para acabar com o êxodo de peticionários que recorrem a Pequim e com os abusos que sofrem como consequência.
“Em primeiro lugar, os tribunais devem ser independentes para que possam resolver os problemas entre as pessoas e os governos locais. Em segundo lugar, deve haver supervisão pública dos governos. As pessoas precisam ter liberdade de expressão e de imprensa para relatarem o que vivem. Só assim os governos mudarão gradualmente”, disse Yang.
O advogado chinês Liu Xiaoyuan comentou no Sina Weibo, uma mídia social na China similar ao Twitter, sobre a futilidade da reforma do sistema de petição. “Num país cujo sistema judicial não é independente e que tem pífio estado de direito, as autoridades locais se comportarão mal, haja ou não pressão e supervisão das apelações.”
Mesmo se o Regulamento de Petição for abolido, Yang vê as políticas de manutenção da estabilidade como algo que o PCC não pode abandonar.
“É óbvio que o líder chinês Xi Jinping reforçou a repressão das forças civis e da liberdade de expressão, como a repressão ao discurso na internet, porque ele tem medo de movimentos de massa imprevisíveis e protestos de grupos”, disse Yang Jianli. “Uma vez que o povo chinês tenha liberdade para apelar, eles com certeza irão às ruas e protestarão, o que ameaçará o regime comunista de Xi Jinping. Se ele não quer perder seu governo, ele não mudará a política de manutenção da estabilidade.”