O grau de disseminação da corrupção e o enorme alarme social criado em momentos particularmente difíceis para o país fazem imprescindível que partidos e instituições façam um exercício cuidadoso de depurar suas responsabilidades para salvar a democracia na Espanha diante do descrédito estrangeiro.
O Financial Times “teme pela Espanha” e o The Economist explica o duplo significado do termo “chouriço” na Espanha e por que as manifestações exibem faixas expressando “Não há pão suficiente para tanto chouriço.”
Clamor cidadão contra a corrupção
Basta ir à rua para ouvir os comentários de total indignação com que falam os cidadãos sobre o escândalo do “caso Bárcenas”, que foi tesoureiro do Partido Popular (PP) por quase 20 anos e que tem entre seu variado patrimônio 22 milhões de euros na Suíça derivados de sonegação fiscal.
Mas esse escândalo se soma ao “caso Urdangarín” – que cerca cada vez mais a Infanta Cristina e conspurca a Coroa –, o caso grave de espionagem a políticos e empresários na Catalunha que já provoca prisões, os ERE na Andaluzia, etc.
Tudo isso ocorre diante de uma cidadania brutalmente golpeada pelo desemprego, crise econômica e despejos, incluindo suicídios, e que não está disposta a continuar emaranhada no que parece ter sido um clima de longa impunidade, a explosão das bolhas imobiliária e financeira, bem como a falta de transparência dos partidos políticos e instituições.
O “caso Bárcenas” e o debate político
Desde que a mídia El País publicou documentos supostamente contendo a contabilidade “caixa dois” do PP, que detalha as gratificações que receberam membros da liderança, incluindo o próprio Mariano Rajoy, o chefe do governo não foi capaz de responder satisfatoriamente desde suas primeiras explicações na cúpula hispano-alemã realizada em Berlim, quando foi questionado pela mídia ali reunida. Embora o Rajoy tenha negado a veracidade dos documentos, “exceto algumas coisas”, a Fiscalização Anticorrupção solicitou os dados das contas do PP para esclarecer se houve financiamento ilegal.
Alfredo Pérez Rubalcaba pediu a renúncia de Rajoy da presidência e levou à Corte Nacional a informação publicada com os dados contábeis de Bárcenas, que também recebeu até dezembro de 2012 um salário do PP de 200 mil euros anualmente em 2011 e 2012, embora já não estivesse no partido. Foi explicado que era um acordo parcelado, mas para muitos isso não é credível porque ele também foi citado pela Previdência Social.
Bárcenas é acusado de suborno (cobrança de comissões ilegais), lavagem de dinheiro e fraude fiscal no caso Gürtel, cuja rede de corrupção está ligada ao PP. Deste último caso, sabe-se que uma rede contribuía para o financiamento ilegal do partido. Embora distribuída por várias partes do país, a rede tinha prevalência em Madrid, Valência e Ilhas Baleares. Os supostos papéis secretos de Bárcenas, que segundo peritos em caligrafia correspondem a sua letra, teriam relação com a suposta trama.
Porém não para aí o cerco intenso ao chefe de governo. Muitos pedem a cabeça da ministra da saúde Ana Mato devido à Unidade de Crime Econômico e Financeiro revelar a existência de viagens gratuitas e presentes de Francisco Correa (suposto líder da “trama Gürtel”) a sua família no valor de 50.049 euros e o Departamento Nacional de Investigação de Fraude descobriu que seu ex-marido Jesús Sepúlveda estaria associado e envolvido na trama. Embora o ex-marido tenha sido absolvido de seus negócios, segundo uma pesquisa da Metroscopia, 85% da população e 70% dos eleitores do PP acham que ele deveria renunciar por ética e responsabilidade.
Um grande pacto pela regeneração ética da política e das instituições
É completamente irresponsável e mina a confiança necessária dos cidadãos nos seus representantes e instituições colocar em risco o sistema democrático criando toda esta imundície e responder como crianças malcriadas evitando assumir responsabilidade. O descontentamento crescente e esmagador dos cidadãos em relação aos políticos e à política, que são agora vistos como parte do problema, requer mudança de curso urgente.
O chefe de governo Mariano Rajoy, por alguns casos, e o chefe de Estado, o rei Juan Carlos, por outros tantos, foram lesados em sua credibilidade, o que tem particular gravidade e consequências quando isso é somado a todos os demais casos.
Cada vez mais os partidos políticos na Espanha, analistas renomados e cidadãos comuns veem como obsoleta, para as necessidades atuais, a Constituição de 1978, conferida aos espanhóis na “transição” da ditadura para a democracia. Aqueles pactos, em que muito havia para fazer, deixaram assuntos inacabados. Outros simplesmente surgiram no desenrolar da democracia que amadurece e agora precisa de outras alavancas para enfrentar a realidade atual da sociedade espanhola. Trata-se de criar uma nova estrutura que aborde reformas urgentes e de longo alcance.
Parece, portanto, cada vez mais plausível e razoável a necessidade de um grande pacto político e social comparável à época. Um que trate da reforma da Constituição para criar um novo quadro que possibilite eficaz resposta política e presteza para enfrentar o que urge em várias áreas, além do crescimento econômico: uma lei dos partidos para garantir a transparência; uma nova legislação eleitoral mais justa e aberta; a reforma do governo; um Estatuto da Coroa adaptado às leis de transparência; a reforma do Judiciário que garanta sua total independência e dar-lhe os meios necessários para agir com a velocidade desejada em casos de gravidade; e todos os grandes problemas que uma sociedade moderna na situação atual da Espanha requer para lidar de forma diligente pelo bem de todos.
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