Reforma encontra resistência na China

25/11/2013 10:18 Atualizado: 25/11/2013 10:18

A reforma estava em destaque na agenda quando o topo da liderança do Partido Comunista Chinês se reuniu em 9-12 de novembro em Pequim na 3ª Sessão Plenária do 18º Comitê Central. Mas nas discussões do planejamento para os próximos dez anos e no comunicado emitido posteriormente há razões para duvidar de que o Partido tem os meios para realizar seus objetivos de reforma.

A introdução do plano de reforma pelo líder chinês Xi Jinping teve uma recepção fria. De acordo com pessoas familiarizadas com eventos no Plenário, a leitura de Xi Jinping da ‘Decisão sobre as Grandes Questões Acerca de Reformas Abrangentes e Profundas’ (doravante referida como ‘Decisão’) foi seguida por um silêncio sepulcral.

Xi Jinping e o primeiro-ministro chinês Li Keqiang esperavam oposição. Em preparação para o Plenário, Xi viajou até a província de Hunan, no Sul da China, e Li até a província de Heilongjiang, no extremo Nordeste, para se reunirem com as autoridades provinciais.

Em Hunan, Xi teve uma dupla mensagem. Ao contar aos funcionários com antecedência sobre as propostas de reforma, ele esperava evitar conflitos intensos no próprio Plenário. Ao mesmo tempo, ele deixou os altos funcionários provinciais saberem que seu dever era “implementar o espírito do 3º Plenário”.

A falta de confiança de Xi e Li em qualquer apoio amplo para sua agenda pode ser visto numa sessão de estudo incomum que eles organizaram na Escola Central do Partido Comunista Chinês (PCC). Trezentos funcionários de nível provincial foram obrigados a memorizar os discursos anteriores de Xi por três dias antes do Plenário. Durante o Plenário, eles foram mantidos na Escola sem permissão para sair.

As reuniões a portas fechadas no Plenário consistiram de quatro dias de discussões, quando Xi e Li divulgaram a Decisão. Altos funcionários temiam que mais delongas causassem danos e um comunicado foi emitido na sexta-feira, 15 de novembro, três dias após o fim do Plenário.

Triângulo de poder

O maior vencedor no 3º Plenário foi Wang Qishan. Como chefe do Comitê Central de Inspeção Disciplinar, Wang tem estado ocupado implementando a campanha anticorrupção de Xi Jinping. Em seu mandato, dezenas de funcionários já foram submetidas ao interrogatório abusivo do PCC chamado ‘shuanggui’.

Poucas pessoas se atreveram a desafiar ou confrontar Wang no Plenário. Ele parece ter estabelecido poder e prestígio no PCC e preencherá um nicho na nova estrutura de poder inaugurada pela Decisão.

A Decisão criou dois novos corpos, o Comitê de Segurança do Estado, a ser chefiado por Xi Jinping, e um Grupo de Liderança da Reforma, a ser encabeçado por Li Keqiang. O Comitê de Segurança do Estado terá autoridade direta sobre tudo exceto questões econômicas. O Grupo de Liderança da Reforma lidará com a economia da China.

Juntos, o Comitê de Segurança do Estado, a Grupo de Liderança da Reforma e o Comitê Central de Inspeção Disciplinar formam um triângulo que conduzirá o regime. A chave no futuro para esta nova estrutura será as três partes cooperarem juntas.

‘Caminhos caóticos’

Um membro de dentro do regime comentou sobre a Decisão a um instituto de reflexão de Pequim: “As metas são claras, mas os caminhos são caóticos.”

Por exemplo, a Decisão anunciou a abolição da reeducação pelo trabalho forçado – o vasto sistema de campos de trabalho utilizados para deter criminosos, dissidentes, peticionários e prisioneiros de consciência.

Autoridades de segurança colocam pessoas em campos de trabalho utilizando detenção administrativa sem julgamento ou decisão judicial. A Decisão deixou em aberto às autoridades de segurança o uso contínuo da detenção administrativa, possibilitando enviar os detidos para outros tipos de instalações em vez dos campos de trabalho.

Um jurista famoso em Pequim observou que há pelo menos um limite legal de dois anos para sentença num campo de trabalho forçado. Mas não há limite para sentenças em centros de educação legal – os centros de lavagem cerebral estabelecidos em toda a China. A “reforma” da Decisão pode ser mais abusiva do que o que ela substitui.

Reforma agrária

Outro exemplo de obra inacabada da Decisão envolve a reforma agrária. Não há questão mais controversa na China do que a política de terras. Os governos locais confiscam as terras para evitar a falência (e para engordar funcionários corruptos).

Agricultores e proprietários deslocados formam um grupo cada vez maior com queixas amargas, eles são compensados infimamente, se é que são compensados, pela terra ou habitação tomada deles e muitos ficam desabrigados. Ao mesmo tempo, o mergulho dos governos locais no mercado imobiliário criou uma bolha que ameaça toda a economia chinesa.

A Decisão quer dar aos residentes rurais direitos sobre suas terras, mas os detalhes difíceis não foram resolvidos. A terra rural é de propriedade coletiva. O que isto significa não está claro. Será que a família ou o indivíduo tem participação? Nas cidades, toda a terra pertence ao Estado e o “dono” simplesmente tem o direito de usar a terra. Será que os “proprietários de terras” rurais venderão os direitos de uso? Se sim, por quanto tempo?

Enquanto estas e outras questões deixam a reforma agrária paralisada, isto satisfaz o plano. Uma fonte familiarizada com a discussão sobre a reforma agrária disse que a decisão final de Pequim é “não deixar detalhes restringirem o planejamento maior”. O objetivo é mercantilizar a terra rural e os problemas serão tratados à medida que surgirem, disse a fonte.

Consenso e autoridade

Shi Cangshan, um especialista norte-americano em política chinesa, disse que as reformas do 3º Plenário são principalmente ajustes técnicos que deixam os problemas fundamentais do sistema intactos.

De acordo com Shi, duas coisas são necessárias se o PCC for tentar fazer uma reforma fundamental: consenso e autoridade. Shi acredita que para Pequim criar consenso, o regime comunista chinês precisa de um evento extraordinário, como a negação da Revolução Cultural feita por Deng Xiaoping.

Na história chinesa, os imperadores começariam tomando uma decisão, ou estabelecendo uma meta, e então a burocracia decidiria como implementá-la, ou que caminhos tomar para atingir o objetivo. No final, o sistema tem a palavra final, disse Shi, e assim a verdadeira reforma tem de começar com o sistema.