Reportagem sobre a riqueza da família do premiê chinês serve aos interesses de uma facção
Um artigo publicado na semana passada pelo New York Times em inglês e chinês caiu como uma bomba num momento dos mais sensíveis para o Partido Comunista Chinês (PCC). Se o NY Times entendeu que o artigo era uma bomba e se tinha a intenção de danificar um grupo ou outro, não está claro. Também não está claro se o NY Times foi usado voluntária ou involuntariamente por aqueles beneficiados pelo artigo.
O repórter do NY Times reivindicou sua inocência numa postagem de blogue. Ele disse que escreve sobre negócios e não é especialista em política chinesa. Ele também disse que fez todas as pesquisas pessoalmente para o artigo e nenhuma informação no artigo foi fornecida a ele.
O artigo detalhou a alegada riqueza da família do premiê chinês Wen Jiabao, que envolveria uma fortuna de 2,7 bilhões de dólares. Imediatamente após a publicação, o primeiro-ministro disse que o artigo era impreciso e contratou advogados.
Numa democracia ocidental, tal artigo pode ser um embaraço para um político por alguns dias, mas não teria nenhum impacto político real. As coisas são diferentes na China.
A riqueza de altos oficiais do PCC é um assunto muito sensível. A maioria desses oficiais ficou obscenamente rica nas últimas décadas e todos entendem que o povo chinês, cujos padrões de vida têm sido suprimidos para promover a economia chinesa baseada na exportação, os odiará pela riqueza adquirida.
Ao expor a alegada riqueza de Wen Jiabao, o artigo enfraquece-o politicamente pouco antes do 18º Congresso Nacional do PCC que se reúne de 8 a 14 de novembro. Neste Congresso, uma nova liderança será anunciada.
Nos últimos anos, Wen Jiabao foi o único líder chinês que fez declarações públicas sobre a promoção de reformas políticas, enquanto a facção do ex-líder chinês Jiang Zemin, incluindo Zhou Yongkang e Bo Xilai, é responsável por perseguir o Falun Gong e por muitos outros abusos dos direitos humanos.
Ao ocupar o primeiro-ministro chinês com a tentativa de limpar seu nome, a facção liderada por Jiang Zemin agora espera recuperar um pouco do poder que perdeu como resultado do escândalo Wang Lijun-Bo Xilai.
Após a revelação feita por Wang Lijun de que Bo Xilai e outros tramavam um golpe de Estado, o atual líder chinês Hu Jintao e Wen Jiabao foram capazes de diminuir o poder da facção de Jiang Zemin. Agora, esta facção, graças ao NY Times, tenta lutar de volta.
Obtendo assistência
No Ocidente, se um repórter quer investigar um oficial, o repórter simplesmente escolhe o alvo e começa. Na China, as coisas são mais complicadas.
Há tantos oficiais corruptos, alguns deles em posições tão altas, como alguém escolhe o candidato certo? Alguns amigos chineses poderiam dar sugestões e fazer isso sem nunca fornecer informações detalhadas ao repórter. Alguns poderiam dar pistas para iniciar o inquérito; alguns poderiam organizar uma conversa com a pessoa certa; alguns poderiam ajudar a evitar problemas desnecessários com as autoridades.
Depois que um repórter tem um alvo, realizar a investigação não é fácil. Na China, não há uma linha clara entre informação pública e segredos de Estado. Em muitos casos, a liberação de informação pública pode ser punida como se fosse a publicação de segredos de Estado.
Por exemplo, após Wang Lijun, o ex-chefe de polícia de Chongqing, tentar desertar no consulado dos EUA em Chengdu em fevereiro, ele foi levado para Pequim. Os bilhetes eletrônicos usados por Wang Lijun e vários agentes da segurança do Estado foram disponibilizados na internet e várias mídias internacionais usaram as informações para confirmar que Wang Lijun foi levado para Pequim.
A pessoa que postou a informação foi recentemente posta em detenção administrativa por sete dias por “liberar segredos relacionados ao trabalho da segurança de Estado”. No entanto, com o número do bilhete e o nome do passageiro, qualquer pessoa pode verificar sua autenticidade na Companhia TravelSky Holding da China.
Conduzir uma investigação de quase um ano de duração de um dos homens mais poderosos na China sem que as autoridades percebam ou interfiram – isso só pode ser o resultado de um milagre ou da ajuda das forças de segurança nos níveis mais altos.
Por que Wen Jiabao e Xi Jinping?
Existem apenas dois membros do Comitê Permanente do Politburo – o pequeno grupo de homens que dirige o PCC –que criticaram abertamente Bo Xilai, um membro do Politburo agora desgraçado que era o bastião da facção de Jiang Zemin. Wen Jiabao e o indicado próximo líder chinês Xi Jinping são esses dois e eles são os únicos cuja riqueza tem sido alvo de denúncias na mídia ocidental.
Wen Jiabao criticou Bo Xilai em sua conferência de imprensa no final do Congresso Nacional Popular, dizendo que, sem reforma política, a Revolução Cultural poderia acontecer novamente na China. A maioria das pessoas na China acredita que as políticas de Bo Xilai em Chongqing eram uma imitação da Revolução Cultural.
A riqueza de Xi Jinping foi detalhada num artigo de 29 de junho na Bloomberg. Sua oposição a Bo Xilai foi revelada num artigo da Reuters em setembro, que o citou dizendo que ele não era amigo de Bo Xilai e que Bo Xilai devia ser tratado de acordo com a disciplina do PCC e o direito chinês. Não por coincidência, Bo Xilai representava a maior ameaça a Xi Jinping, não para a liderança atual.
Enquanto Wen Jiabao e Xi Jinping tiveram suas riquezas investigadas, muitas outras poderosas famílias do PCC, cujas reputações são muito piores e que são muito mais ricas do que eles, não tiveram sua riqueza investigada por jornalistas.
Ninguém, por exemplo, passaria um ano investigando a riqueza do chefe da segurança pública chinesa Zhou Yongkang. Ele é quase intocável, porque os agentes de segurança jamais permitiriam que a investigação avançasse. Da mesma forma, ninguém investigou a riqueza de Bo Xilai, provavelmente porque a polícia secreta não cooperaria.
Usando a mídia internacional
Líderes do PCC têm usado frequentemente jornalistas estrangeiros, seja para ajudar o PCC ou para seu próprio ganho pessoal. Quando o Exército Vermelho ainda vivia em cavernas do norte da China durante a guerra contra o Japão, Edgar Snow escreveu sua biografia de Mao, a ‘Estrela Vermelha sobre China’, e Agnes Smedley escreveu a biografia do comandante do exército, ‘A Grande Estrada: A vida e o tempo de Chu Teh’. Estes livros eram relações públicas eficazes para o PCC.
No escândalo Wang Lijun-Bo Xilai deste último ano, ou mesmo antes disso, houve uma guerra de informação entre a facção de Jiang Zemin e os leais a Hu Jintao e Wen Jiabao.
Os dois lados usaram a mídia internacional, principalmente chinesa e inglesa, para expor esqueletos escondidos no armário do outro lado, para testar as águas e para avaliar, direcionar ou desviar a opinião pública. Algumas das informações eram factuais e foram confirmadas mais tarde por anúncios oficiais. Outras eram totalmente fabricadas.
Quase toda a informação foi alimentada aos repórteres, com muito pouca sendo resultado de investigação, se é que houve alguma. No entanto, algumas informações poderiam ter mudado o curso da luta pelo poder.
Corrupção como arma
Hoje, as acusações de corrupção são rotineiramente usadas como armas políticas. Não foi sempre assim na China comunista.
Durante a era Mao, não havia necessidade de encontrar desculpas para liquidar os “inimigos”. A acusação de contrarrevolucionário era suficiente para todos os casos. Quanto a Deng Xiaoping, mesmo que ele não fosse tão poderoso como Mao, ele também não precisou de qualquer desculpa para expulsar Hu Yaobang e Zhao Ziyang, as mãos direita e esquerda de sua reforma.
No entanto, quando Jiang Zemin tomou o poder, ninguém sequer o ouviu. Ele precisou criar um novo sistema e autoridade pessoal. O que ele fez foi incentivar e promover a corrupção, enquanto seletivamente usava acusações de corrupção para se livrar de seus oponentes.
Colocar na prisão Chen Xitong, o então secretário do Comitê do PCC em Pequim, foi a primeira vez que Jiang Zemin utilizou esta arma. Hu Jintao usou a mesma arma para colocar Chen Liangyu, o então secretário do Comitê do PCC em Shanghai, na cadeia. Tanto Chen Xitong e Chen Liangyu eram membros do Politburo e ambos consideraram representar um desafio à liderança do PCC.
Se seus casos acontecessem nos tempos de Mao Tsé-tung ou Deng Xiaoping, ambos teriam sido caracterizados como luta pelo poder ou entre linhas ideológicas, não como corrupção. Hoje, o caso de Bo Xilai é semelhante. Mesmo que a razão verdadeira por trás dos crimes acusados contra Bo Xilai seja sua ideologia e prática da era Mao, ele foi acusado principalmente de corrupção.
Qualquer que seja o contexto para os artigos do NY Times e da Bloomberg, eles serão usados como uma arma contra aqueles que desempenharam o papel mais importante em derrubar Bo Xilai e a facção de Jiang Zemin. Durante a luta de poder no topo do PCC, qualquer movimento feito por outro lado deve ser tratado com seriedade e uma contramedida deve ser tomada imediatamente.
Uma reação lenta ou falta de reação seria considerada fraqueza. Quando Bo Xilai afirmou que “Hu Jintao iria a Chongqing” no dia da conferência de impressa do Congresso Nacional Popular em Chongqing, ele fez seu movimento. A resposta foi o anúncio sete dias depois que Bo Xilai já não era o chefe do PCC em Chongqing.
A maioria dos chineses não tem acesso a Bloomberg ou ao NY Times e a maioria dos leitores destas mídias não tem influência sobre a política chinesa. No entanto, a reação aos artigos será acompanhada de perto pelos aliados, inimigos e pessoas no meio. Isso se aplica a ambos os lados da luta pelo poder.
Zhou Yongkang, que representa os interesses de Bo Xilai e da facção de Jiang Zemin, não quer que as pessoas pensem que ele perdeu completamente o poder. Hu Jintao, Wen Jiabao e Xi Jinping não querem que as pessoas pensem que a situação não está totalmente sob seu controle.
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Nota do Editor: Quando o ex-chefe de polícia de Chongqing, Wang Lijun, fugiu para o consulado dos EUA em Chengdu em 6 de fevereiro, ele colocou em movimento uma tempestade política que não tem amenizado. A batalha nos bastidores gira em torno da postura tomada pelos oficiais em relação à perseguição ao Falun Gong. A facção das mãos ensanguentadas, composta pelos oficiais que o ex-líder chinês Jiang Zemin promoveu para realizarem a perseguição ao Falun Gong, tenta evitar ser responsabilizada por seus crimes e continuar a campanha genocida. Outros oficiais têm se recusado a continuar a participar da perseguição. Esses eventos apresentam uma escolha clara para os oficiais e cidadãos chineses, bem como para as pessoas em todo o mundo: apoiar ou opor-se à perseguição ao Falun Gong. A história registrará a escolha de cada pessoa.