Queda no mercado de ações chinês tornou-se uma prova de lealdade política

10/07/2015 11:20 Atualizado: 10/07/2015 11:20

Após atingir o pico de uma subida de sete anos em junho, o mercado de ações chinês caiu terrivelmente. O Shanghai Composite, o principal índice financeiro do país, perdeu impressionantes 29% em apenas algumas semanas. Desde o pico do mercado no dia 12 de junho, mais de U$2.5 trilhões evaporaram. O resultado disso tudo tem gerado pânico político.

O Ministro das Finanças e grandes casas de corretagem entraram em ação e prometeram injetar aproximadamente U$20 bilhões no mercado para manter os preços.

Nas bolsas de Shanghai e Shenzhen, desde quarta-feira (8), quase todas as companhias deixaram de negociar, de acordo com informação da Wind Information, citada pela estação televisiva de Hong Kong , Phoenix Television. Depois do fechamento do mercado na terça-feira (7), mais de 600 companhias submeterem um pedido para que suas cotações parassem de ser negociadas. Acrescentando àquelas já suspensas, somou um número total para 1.400 cotações paradas. Isto significa que os preços estão congelados no último valor negociado, mas o capital dos investidores está bloqueado.

Em outros lugares, as verdadeiras táticas do regime comunista também vieram à tona: rumores de conspirações, censura e propaganda que parecem ter como objetivo transformar o mercado de ações em uma prova decisiva de lealdade ao Partido Comunista Chinês.

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As primeiras vítimas desta investida foram os jornais que se atreveram a reportar sobre suicídios decorrentes da queda da bolsa.

No sábado passado (4), a comissão reguladora de títulos anunciou que iria castigar três companhias de mídia chinesas por reportar “notícias falsas”. O muito temido Gabinete de Segurança Pública foi chamado para assistir o caso.

Os relatos em questão envolvem casos de indivíduos que saltaram de edifícios para se suicidar. Oficiais chineses disseram que os suicídios não ocorreram por conta dos indivíduos terem perdido dinheiro no mercado, mas eles não disseram como podiam ter a certeza disso.

Tendo publicamente inflacionado a bolha no mercado de ações até este ponto, a manutenção dos preços no mercado tornou-se um teste à credibilidade do regime.

“O regime chinês está tentando investigar rumores para que as pessoas não se atrevam a publicar histórias online sobre como alguns cometeram suicídio devido à queda das ações”, disse Zhu Xinxin um antigo editor da estação de rádio O Povo de Hebei, em entrevista à Radio Free Asia.

“De fato, isto resulta na censura de qualquer história verdadeira sobre pessoas que saltam de edifícios. A razão por de trás é o medo da instabilidade social, que levará ao colapso do sistema de “manutenção da estabilidade” do regime, diz Zhu.

O colapso do mercado no passado desencadeou agitação social, segundo Zhu, por isso as autoridades estão agora trabalhando “desesperadamente para que o mercado de ações se recupere”.

O Partido Comunista acusa algumas grandes companhias de notícias, incluindo o website oficial de notícias da Província de Fujian, de promover rumores. Essa estratégia tem o objetivo de distinção entre as informações que são verdadeira e as que, de fato, são rumores.

Um comentador online questionou se o People’s Daily deveria ser investigado depois de um artigo publicado em abril intitulado “4000 é apenas o princípio de um mercado especulativo”, parte de uma campanha de propaganda deliberada pelo regime chinês para fazer o mercado subir e treinar os investidores de varejo a especular que os preços subiriam.

O índice Shanghai Composite fechou a 3,727 na terça feira, quase 300 pontos abaixo da promessa implícita pelo People’s Daily.
Na realidade, o Partido Comunista tem promovido o mercado com entusiasmo.

Na segunda-feira (6), o People’s Daily online (que chegou a ser apelidado de “a boca do governo chinês”), junto com a estatal Xinhua, publicou artigos com títulos tendenciosos, do tipo: “Capazes e confiantes na manutenção de um mercado de capitais estável”, “Confiança no desenvolvimento estável e saudável do mercado de capitais”, e “Investir em ações é um processo de aprendizagem”. Todos se destinavam a fomentar apoio ao mercado de ações enquanto os índices afundavam.

“O mercado tem 20 anos de desenvolvimento… é plenamente capaz de ultrapassar esta crise temporária”, dizia um dos artigos. “É muito perigoso ser irracional quando as ações estão em alta e não é correto vender irracionalmente quando o mercado está em baixa”, continuou.

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E enquanto notícias sobre aqueles que se suicidaram devido às quedas do mercado foram suprimidas, histórias daqueles que ficaram ricos da noite para o dia são encorajadas.

O “The Legal Evening News” reportou que a Sra. Sun, de 78 anos, gastou 20 mil yuan (cerca de U$ 3.215) para comprar ações em 1994, e que em 10 de junho estavam valendo 600 mil yuan (cerca de U$ 96.477).

“Eu especulei e negociei ações seguindo as políticas do governo central”, foi citada. “A News Simulcast é imperdivel”, continuou, referindo-se ao maçanta programa estatal de notícias que cobre os líderes do Partido Comunista e suas políticas.

Tais relatos foram extensivamente ridicularizados na seção de comentários da Internet, e foram compartilhados na mídia social.

O regime chinês tem boas razões para estar preocupado. Tendo publicamente estimulado a bolha de ações  até o ponto que o fez, manter os preços no mercado tornou-se um teste à credibilidade do regime. Mesmo depois das negociações em pânico do fim de semana passado e os anúncios de uma injeção de capital, os mercados falharam em subir na segunda e na terça-feira.

Agora que metade das companhias presentes nos dois principais mercados de ações da China não estão negociando, fica claro que os mercados na China não são livres para estabelecer seus próprios valores.

O problema pode se tornar muito mais sério para o regime, e vai muito além de pequenos e furiosos investidores de varejo que até se suicidarem após perderem suas poupanças. Isto ocorre porque grande parte do capital que gerou a rápida subida do mercado, é composta por dinheiro emprestado – seja por companhias, ou por empresas de corretagem que providenciam capital, chamado empréstimo com margem, para os investidores especularem.

Esta alavancagem, que poderá consistir entre 5 a 10 por cento do mercado, de acordo com Anne Stevenson-Yang da J Capital Research, também é parte da razão pela qual o preço das ações caiu tão rapidamente: à medida que os preços das ações baixam, as posições de ações são forçosamente liquidadas para que as corretoras não percam os seus empréstimos.

De acordo com o People’s Daily, o Partido Comunista agora parece ter efetivamente ordenado aos corretores que não vendam ações enquanto o índice Shanghai Composite estiver abaixo dos 4.500 pontos.