Quebrando o interminável ciclo de destruição da Síria

24/06/2012 03:00 Atualizado: 24/06/2012 03:00

Kofi Annan (direita), o enviado especial da Liga Árabe para a Síria, e o major-general Robert Mood (esquerda), o chefe da missão de observadores da ONU na Síria, falam numa conferência de imprensa em 22 de junho de 2012 no Escritório das Nações Unidas em Genebra. (Sebastien Bozon/AFP/Getty Images)O principal obstáculo para uma resolução do conflito na Síria tem sido as divisões na sociedade síria. Um pequeno grupo composto principalmente da seita xiita Alawis governa o país, embora o aumento dos ataques contra civis indiquem que o problema é o próprio regime.

Hafez e Bashar Assad, pai e filho, têm controlado a Síria por mais de quarenta anos. Eles tentaram criar a aparência de serem indispensável e muitos cidadãos pensavam que eles eram, porque pareceu às vezes que só eles poderiam manter o país unido.

Isto, naturalmente, tornou-se uma profecia autorrealizável; quanto mais eles pressionavam a maioria sunita da população maior era o medo de retribuição entre os Alawis e outros grupos minoritários. Durante muitos anos houve um temor generalizado, compartilhado por membros de todas as comunidades, das consequências caso os Assad caiam do poder; a guerra civil, a instabilidade e o conflito sectário, um dos quais ou qualquer combinação poderia ser pior do que a opressão que eles têm experimentado diariamente.

O que alimentava esta tendência era que, durante este período que Síria foi de fato um país relativamente estável, um número substancial de cidadãos tinha medo dos resultados de uma mudança de regime. Mesmo com a contínua barbárie do regime há pessoas que pensam desta maneira. O problema com a fórmula para a longevidade política dos Assad é que isso torna a reforma impossível, pois um estado de emergência perpétuo é a base de seu regime.

Se a reforma viesse a acontecer e a emergência fosse aliviada até certo ponto através da democracia, da igualdade e da reforma econômica, o regime de uma família já não seria algo que as pessoas necessitariam se apegar. O regime teria se tornado redundante. Como resultado, há uma carência de válvulas de escape de segurança; tensões e frustrações simplesmente cresceram. O resultado foi que a tampa rebentou numa explosão de protesto popular, mas não houve permanente “suspensão”, pois assim que a tampa explodiu, novamente o regime fechou a tampa firmemente com avidez.

O conservadorismo criado por quarenta anos é parte do problema, embora grande parte desta resistência à mudança esteja agora concentrada dentro do próprio regime. O exército é parte do regime e está disposto a se comprometer e tolerar os piores tipos de atrocidades contra a população civil por medo de represálias, um temor que aumenta a cada atrocidade cometida. O massacre em Houla é o mais recente e dos piores exemplos.

O massacre foi condenado pelo Conselho de Segurança da ONU e ocorreu durante um cessar-fogo da ONU, que só enfatiza a falta de eficácia da comunidade internacional até o momento. Sanções estão funcionando, mas o regime pôde sobreviver até agora. Ele ainda está recebendo armas do Irã e da Rússia e continua a negociar com o Líbano, Iraque e China.

A falta de um avanço da oposição e de apoio efetivo da comunidade internacional abriu a Síria até para a possibilidade de intervenção estrangeira. Se a oposição for incapaz de desalojar Assad por conta própria, quão tentador seria convidar ou permitir que outros países façam o trabalho para eles. O único país que ficou seriamente envolvido na tentativa de ajudar a oposição até agora é a Arábia Saudita, que decidiu enviar armas.

É difícil ver como os sauditas com sua ideologia salafista radical poderão promover a causa da democracia. E quem vai controlá-los? As forças da democracia? É difícil saber exatamente quem elas são e ter certeza de que grupos principais da oposição na Síria apoiam a democracia. É a melhor maneira de unir a oposição, mas é difícil separar quem os reais democratas dos que estão apenas vestindo as cores de camuflagem.

Isso significa que grande parte das conversas sobre a democracia é motivada por um desejo de unidade em vez da própria democracia e é impossível dizer o que acontecerá se os islâmicos, que incluem os salafistas armados, assumirem o poder.

A Irmandade Muçulmana afirmou em sua nova carta que agora apoia a democracia e o secularismo. Este é um passo adiante, mas realizar essa promessa depende das condições; se o caos e o conflito sectário se tornarem as realidades principais após a queda de Assad, pode ser mais tentador para a Irmandade se mover na direção do extremismo em vez da democracia.

Os Estados Unidos e o Reino Unido estão ajudando a oposição, mas apenas com ajuda humanitária. Os Estados Unidos ameaçaram intervir militarmente, mas as condições na Síria são similares àquelas no Iraque. Porque isso é um perigo, os Estados Unidos podem decidir apoiar a aposta dos Saudi de armar a oposição síria. Tentar resolver o conflito na Síria através da intervenção armada corre o risco de aumentar a luta ao invés de eliminá-la.

Se o resultado da intervenção é que isso reforça em termos sectários um lado do conflito contra o outro, isso pode se tornar uma receita para continuar o conflito. A falta de unidade tem de ser superada se a democracia for triunfar, mas este tem que se tornar mais do que a unificação operacional ou cosmética, tem de atingir à raiz do problema, o sectarismo. A única maneira de haver unidade além da superficialidade é através da reconciliação entre a minoria e a maioria na Síria.

Se isso ocorresse, a justificativa para o regime desapareceria e entraria em colapso a partir de dentro. Os membros do exército que agora temem vingança poderiam ser mais facilmente atraídos para depor as armas se isso viesse a ocorrer. É tentador tentar resolver os problemas pelo uso da política das grandes potências; ao eliminar Assad, os EUA poderiam também ajudar a minar o Irã.

Se isso pudesse ser feito por intermediários, o presidente Obama dos EUA não precisaria se preocupar em se envolver em mais uma guerra na região enquanto concorre a eleição presidencial em novembro. No entanto, isso pode não ser o melhor para o povo sírio e pode sair pela culatra, possivelmente levando ao poder outro regime despótico.

Do ponto de vista de muitas pessoas na Síria, quase qualquer intervenção parece melhor do que continuar a suportar as condições atuais, mas para muitos deles, é provável que um reparo fácil seja preferível do que ir à raiz do problema. Houla tem simplesmente reforçado o padrão dos últimos quarenta anos, um ciclo de destruição.

Bob Glaberson é um graduado de filosofia e estudante de política que escreve principalmente sobre o Oriente Médio. Ele vive em Brighton, no Reino Unido.