O que significa a desvalorização da moeda chinesa

10/03/2014 16:20 Atualizado: 11/03/2014 18:21

Ao olhar para os últimos movimentos por parte das autoridades monetárias chinesas, tem-se a impressão de que as coisas estão fora de controle. Em dezembro, a China vendeu um recorde de US$ 48 bilhões em títulos do Tesouro dos Estados Unidos, um movimento de criação de liquidez, pois os dólares foram reconvertidos em yuan.

Em janeiro, o Banco Popular da China (BPC), que é o banco central chinês, obrigou os bancos a emprestarem US$ 218 bilhões (ou seja, criar dinheiro de crédito), o maior valor mensal já registrado. A onda de liquidez em janeiro não é incomum considerando a data do Ano Novo Chinês, uma época em que as pessoas sacam mais dinheiro e os bancos fecham por uma semana. Ainda assim, é a maior quantidade já registrada.

Pouco depois do Ano Novo Chinês, o BPC retirou de circulação um excesso de liquidez no montante de US$ 16 bilhões por meio de transações normais de recompra. Mas o verdadeiro choque ocorreu em 25 de fevereiro, quando o yuan chinês fechou abaixo do preço oficial fixado pelo BPC pela primeira vez desde setembro de 2012. Também registrou-se a maior queda de sete dias (0,95%) em relação ao dólar desde 1994.

Por que isso é chocante? Desde o início da história do crescimento chinês, o yuan tem aumentado de valor em relação ao dólar enquanto mais dinheiro flui para a China. Através de intervenção estatal, o BPC tem conseguido retardar a valorização do yuan. Este é um grande movimento contra uma das tendências mais estabelecidas nos mercados financeiros.

Neomercantilismo

Os movimentos caóticos e confusos das autoridades chinesas apontam diretamente para a fragilidade do modelo econômico chinês. Isso começou com a política de tudo barato no início da década de 1990. Terra barata, mão-de-obra barata e taxa de câmbio barata – receita perfeita para um novo modelo econômico mercantilista de bens de exportação ultracompetitivos, níveis elevados de emprego e crescimento rápido.

Esse modelo funcionou até a crise financeira de 2008, quando os países ocidentais pararam de comprar produtos chineses, quando suas economias se aproximavam de um colapso terminal. Porque o regime chinês precisa evitar agitação social e elevada taxa de desemprego custe o que custar, ele teve de criar crescimento de outra maneira.

Ele desencadeou um programa de estímulo de US$ 600 bilhões no final de 2008. O dinheiro fluiu para ativos fixos, como novas fábricas, aeroportos, estradas, trens e imóveis. Mas US$ 600 bilhões foi apenas o começo. Por meio de seus bancos, o regime chinês criou empréstimos no valor de US$ 14 trilhões, injetando mais e mais dinheiro nesses projetos.

E o plano funcionou. O desemprego manteve-se baixo e o PIB continuou a crescer rapidamente. O problema é que a maior parte desses ‘investimentos’ não gera fluxo de caixa, porque não têm qualquer uso real. Eles só foram efetuados para gerar crescimento e distribuir dinheiro.

Alguns anos e uns tantos trilhões adiante, as autoridades chinesas sabem que essa trajetória não pode continuar para sempre, e é por isso que elas continuam falando de desalavancagem. No entanto, eles também sabem que não podem simplesmente estourar a bolha, porque uma desalavancagem descontrolada levaria a grande desemprego e caos, precisamente o cenário que o regime quer evitar. Esta situação sem saída explicaria os movimentos erráticos de drenar e adicionar liquidez, tentando alcançar dois objetivos opostos ao mesmo tempo.

Beco sem saída

Então, naturalmente, as autoridades tiveram de mudar seu foco na abordagem neomercantilista que funcionou tão bem no passado e estão tentando reduzir a taxa de câmbio. O problema, graças à impressão de dinheiro do Federal Reserve (o banco central americano) e do BPC, é que as coisas não são mais baratas na China. Os preços da terra explodiram e os salários subiram.

Ajustada para a inflação e numa base comercial ponderada, a taxa real efetiva de câmbio da China está numa alta inédita. Outros países, como Vietnã, Filipinas e inclusive o México, são agora mais competitivos em termos de custo unitário de trabalho. Então, a única saída parece ser a de tomar o caminho da desvalorização da moeda. Mas mesmo esse caminho pode levar a um beco sem saída por causa da composição do balanço do BPC.

Sem yuan

A fim de baratear o yuan, o BPC tem de vender yuan e comprar dólares. Até aí tudo bem. Mas para evitar mais inflação de preços com o movimento, o BPC teria de vender ativos existentes em yuan em seu balanço e trocá-los por dólares.

No entanto, devido ao pequeno tamanho dos mercados chineses de capitais de renda fixa, os ativos em yuan no balanço do BPC compunham apenas 15% dos ativos totais no final do terceiro trimestre de 2013. O resto está tudo em reservas internacionais e vender estas de fato fortaleceria o yuan. Assim, o BPC precisa imprimir dinheiro para comprar dólares, como ele fez no passado.

Mas a impressão de mais dinheiro promove maior criação de crédito e mais bolhas. Isso também levará a novos aumentos dos preços domésticos e perda de competitividade. Para o BPC, isto é verdadeiramente uma opção de soma zero.