Quando o poder brando falha

31/01/2013 14:47 Atualizado: 31/01/2013 14:47
Entre disputas territoriais crescentes com a China, o presidente filipino Benigno Aquina (direita) recebe o ministro das relações exteriores japonês Fumio Kishida numa convocação de cortesia no Palácio Malacanang em Manila, Filipinas, em 10 de janeiro de 2013 (Jay Directo/AFP/Getty Images)

O mais antigo bairro chinês do mundo não está em Nova York ou São Francisco, nos Estados Unidos, ou mesmo em Yokohama, no Japão; está em Manila, nas Filipinas, um fato que surge frequentemente quando Pequim aborda sua ligação de longa data com as ilhas, que ficam a cerca de 600 km a sudeste. Da mesma forma, a China se orgulha de seus três Institutos Confúcio nas Filipinas. Desde 2011, a Chinoy TV também espalha a mensagem do Instituto Confúcio para os filipinos que não podem fisicamente frequentar os eventos culturais e políticos.

O comércio entre os dois países, entretanto, está se expandindo rapidamente. Em 1996, a China nem sequer aparecia entre os dez principais parceiros comerciais das Filipinas. Hoje, com um volume de comércio de 30 bilhões de dólares, a China se tornou o parceiro número três. Depois de uma série de negociações em Pequim em 2011, os dois lados concordaram em dobrar esse número até 2016, o que catapultará a China para a primeira posição.

O exercício de poder brando da China nas Filipinas não é único na região. Pequim tem Institutos Confúcio em toda a Ásia, 7 na Indonésia, 9 na Austrália, 12 no Japão e 17 na Coreia do Sul – a China é o principal parceiro comercial de um número de países do Sudeste Asiático.

Pode parecer, neste breve e rápido esboço acima, que o poder brando chinês tem sido extraordinariamente bem-sucedido nas Filipinas, assim como no resto da Ásia. Mas isso é apenas parte da história.

A China, afinal de contas, não se limitou apenas ao exercício do poder brando para aumentar sua influência na região. Em 1994, numa tentativa de reivindicar o território disputado no Mar do Sul da China, a China construiu estruturas no Recife Malícia, dentro da Zona Econômica Exclusiva das Filipinas. Manila não respondeu militarmente a esta provocação, mas afirmou suas reivindicações sobre a região disputada de outras maneiras, por exemplo, organizando uma investigação sísmica para determinar os recursos petrolíferos submarinos. Barcos de patrulha chineses tentaram impedir a pesquisa. Mais tarde, Manila prendeu pescadores chineses que operavam na área e a China retaliou recusando carregamentos de bananas das Filipinas.

Embora a China não tenha afirmado suas reivindicações sobre o Mar do Sul da China por meio de força militar esmagadora, sua retórica pode ser bastante exagerada. O conceito das “nove linhas tracejadas” de Pequim sobre a soberania chinesa abarca a maior área possível do Mar do Sul da China. Em 2012, os gastos militares chineses subiram 11%, empurrando seus gastos oficiais para mais de 100 bilhões de dólares. Para os Estados Unidos, que gasta cerca de sete vezes mais com os militares, o aumento dos gastos dos militares chineses não representa uma ameaça significativa, mas para as Filipinas e outros países do Sudeste Asiático, os gastos chineses contribuíram para uma grande corrida armamentista na região.

Com a insinuação de seu poder brando, a China tenta expandir sua influência sem inquietar seus vizinhos e parceiros comerciais. Mas, por meio de sua postura de poder duro, a China conseguiu exatamente o oposto. As Filipinas, por exemplo, se aproximaram inexoravelmente dos Estados Unidos, num esforço de equilibrar a China. Manila negociou a duplicação do Financiamento Militar Externo dos Estados Unidos em 2012 e tornou suas bases militares mais acessíveis às forças norte-americanas. Este é um país que sem a menor cerimônia chutou os Estados Unidos para fora de suas bases militares Subic e Clark em 1991. As Filipinas também buscaram ajuda dos EUA em organizações regionais para pressionar a China sobre a questão das disputas territoriais.

O Mar do Sul da China não é o único lugar onde o poder duro chinês interfere com seu poder brando. Atualmente, a China e o Japão têm acirrado suas reivindicações sobre as ilhas Diaoyu/Senkaku. Recentemente, o governo japonês “comprou” as ilhas de um proprietário privado e a China enviou aviões para monitorar caças japoneses na área. O fato de que a China é o maior mercado de produtos de exportação do Japão não parece ter moderado as declarações provenientes de Tóquio.

A condução do poder duro e do poder brando da China não é uma contradição. Na verdade, a abordagem de Pequim é copiada diretamente do criador do conceito: os Estados Unidos.

Em 1990, o Prof. Joseph Nye de Harvard desenvolveu o conceito de poder brando como uma forma de preservar o poder dos EUA num mundo em mudança. Ele nunca imaginou que os Estados Unidos abandonariam o poder duro. Em vez disso, ele pediu que os Estados Unidos contassem cada vez mais com a diplomacia, as relações econômicas e os intercâmbios culturais num momento em que parecia que a força militar rendia retornos decrescentes com o fim da Guerra Fria.

Thomas Friedman formalizou essa dupla abordagem com seu corolário a teoria de Nye: que o poder brando do McDonald precisa do poder duro de McDonnell Douglas para ser bem sucedido. Os Estados Unidos deveriam se esforçar para preservar sua posição no mundo unipolar, argumentou Friedman, com um punho oculto para complementar a mão oculta do mercado. A abordagem chinesa no Mar do Sul da China é simplesmente uma versão asiática da estratégia norte-americana.

Durante a última década, a abordagem dos EUA – retraduzida como “poder inteligente” segundo os gostos de Hillary Clinton – produziu algumas falhas muito proeminentes – no Iraque, sob a liderança do publicitário Charlotte Beers; na África, sob a dúbia liderança do AFRICOM; no mundo muçulmano, na sequência do famoso discurso de Barack Obama no Cairo. Em cada um destes casos, o poder duro dos EUA minou os objetivos de seu poder brando. Os iraquianos não se entusiasmaram com as publicações impressas financiadas pelos EUA enquanto os soldados norte-americanos ainda eram uma força de ocupação.

Os africanos que receberam ajuda humanitária de funcionários de ONGs acompanhados por soldados norte-americanos preocuparam-se com o propósito final de um programa de assistência conduzido sob direção do Pentágono. E, embora os muçulmanos tenham aplaudido as palavras do presidente Obama no Cairo, eles assistiram como os ataques de VANTs (veículos aéreos não tripulados) continuaram a reivindicar, como “dano colateral”, a vida de civis que eram em sua grande maioria muçulmanos.

Washington tem relutado em reavaliar seu “poder brando” quando ele parece tão obviamente uma folha de figueira para a afirmação de dominação militar, mas talvez observando as falhas palpáveis dos esforços chineses na Ásia, os EUA possam aprender algumas lições sobre estratégia. Outros países da Ásia que aspiram a cultivar tanto o poder duro como o poder suave – Japão e Coreia do Sul – também devem tomar nota: raramente pode-se ter as duas coisas.

John Feffer é atualmente associado da Open Society na Europa Oriental e está deixando sua posição de codiretor da Foreign Policy in Focus. Cortesia da Foreign Policy in Focus (fpif.org).

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