Enquanto a China estaciona uma plataforma de exploração de petróleo de US$ 1 bilhão numa região disputada do Mar do Sul da China e isso desencadeia um protesto mortal anti-China no Vietnã, os vizinhos do Sudeste Asiático parecem relativamente mudos e impotentes. A Birmânia (também conhecida como Mianmar), que sediou a reunião dos 10 países da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), publicou um comunicado em 11 de maio expressando “sérias preocupações sobre os desenvolvimentos em curso no Mar do Sul da China”. A declaração dizia que os líderes pediam contenção e resolução pacífica do conflito, mas sem mencionar a China.
Isso é notável, pois o primeiro-ministro vietnamita Nguyen Tan Dung havia alertado seus colegas na reunião da ASEAN que “as ações [da China] foram extremamente perigosas e uma ameaça direta à paz, à estabilidade e à segurança, especialmente à segurança marítima”.
O presidente filipino Benigno Aquino III, que também contesta as alegações chinesas no Mar do Sul da China, abordou com os colegas da ASEAN indicações de que a China reivindicava terras em torno do disputado Recife Johnson do Sul, parte das Ilhas Spratly, possivelmente para construir uma pista de voo no local. Pouco antes da reunião, a polícia marítima filipina prendeu pescadores chineses que estariam caçando tartarugas marinhas protegidas perto das ilhas, também reivindicadas pelas Filipinas.
Os ministros das Relações Exteriores da ASEAN emitiram uma declaração rara expressando “preocupações sérias” sobre os desenvolvimentos nos mares da região e pediram uma ação mais rápida na negociação de um código de conduta entre a China e o grupo. O Vietnã e as Filipinas, sem dúvida, esperavam maior apoio de seus vizinhos, dois dos quais, a Malásia e Brunei, têm reivindicações próprias entrelaçadas com a China no Mar do Sul da China, que serve como uma importante rota de navegação internacional, possui ricos recursos pesqueiros e também teria depósitos de petróleo e gás.
Relutância em desafiar a China
O agrupamento heterogêneo da ASEAN provavelmente fez tanto quanto se poderia esperar, considerando que o grupo se baseia no consenso e tem lutado recentemente para alcançar uma posição conjunta sobre as tensões no Mar do Sul da China. Dois anos atrás, os chanceleres da ASEAN falharam pela primeira vez em emitir um comunicado final na reunião do Camboja, porque Phnom Penh se recusou a incluir qualquer referência à discussão sobre as disputas marítimas. Muitos países do Sudeste Asiático estão relutantes em desafiar a China, porque se tornaram seu maior parceiro comercial e, em alguns casos, beneficiários, como Camboja e Laos.
Além disso, os principais pontos da declaração do presidente resumindo a reunião dos líderes teriam sido acordados antes da China estacionar sua plataforma de petróleo, como ficou claro quando nenhum líder sênior da Tailândia, em meio a uma crise política de mais de um mês, foi capaz de participar da reunião e isentou-se de grandes revisões.
Ainda assim, lendo nas entrelinhas das declarações da ASEAN, os líderes claramente passaram um tempo considerável discutindo os desenvolvimentos no Mar do Sul da China e os recentes movimentos da China os têm preocupado. Os líderes também anteciparam que essa não seria sua última palavra do ano sobre a atitude cada vez mais incisiva da China.
No início de agosto, os chanceleres da ASEAN poderão contar com o apoio dos chanceleres dos Estados Unidos, Japão, Índia, Coreia, Austrália e outros quando se encontrarem com eles no Fórum Regional da ASEAN na Birmânia. Este será seguido em novembro pela Cúpula do Leste Asiático, que conta com a participação dos líderes dos Estados Unidos, Japão e Índia, entre outros. Nestas reuniões, os oficiais da ASEAN reconhecem que não precisam assumir a liderança nas discussões com a China sobre o Mar do Sul da China.
‘Linha de Nove Traços’ contestada
A resposta dos EUA foi rápida. O secretário de Estado americano John Kerry teve uma conversa telefônica com o chanceler chinês Wang Yi em 12 de maio e um porta-voz do governo americano informou que Kerry descreveu a instalação de uma plataforma de petróleo da China em águas disputadas com o Vietnã como uma ação “provocativa”.
K. Shanmugan, o ministro das Relações Exteriores da Cingapura, visitou Washington logo após a reunião da ASEAN, e depois, segundo a revista Foreign Policy, Kerry disse: “Queremos ver a criação de um código de conduta; queremos ver isso resolvido por meio do Direito do Mar, por meio de arbitragem ou por qualquer outro meio pacífico, mas não pelo confronto direto e pela ação agressiva”. Shanmugan acrescentou: “A capacidade da ASEAN de lidar com ou reduzir a tensão num incidente não é significativa.”
O presidente americano Barack Obama visitou as Filipinas pouco antes de a China mover sua plataforma para uma área reivindicada pelo Vietnã. “Acreditamos que o Direito Internacional deve prevalecer, que a liberdade de navegação deve ser preservada e que o comércio não deve ser prejudicado”, disse Obama durante sua visita. “Acreditamos que as disputas devem ser resolvidas de forma pacífica e não pela intimidação ou pela força.”
Nas semanas que antecederam a visita do presidente à Ásia, as autoridades americanas haviam desafiado publicamente a legitimidade da linha de nove traços da China, que reivindica a maior parte do Mar do Sul da China, e alertou Pequim que não impusesse sua Zona de Identificação de Defesa Aérea (ZIDA) sobre este mar, com a China fez no ano passado no Mar do Leste da China próximo do Japão.
Muitos analistas norte-americanos sugerem que Pequim moveu sua plataforma para a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) do Vietnã para sinalizar a Washington e às capitais da ASEAN que a China planeja testar o compromisso dos EUA em reequilibrar a Ásia e defender seus aliados diante do expansionismo chinês. “A China está dizendo a seus vizinhos: Têm certeza que vocês querem se comprometer com o reequilíbrio dos EUA?”, comentou um especialista sobre a China.
Grande parte da estratégia de Washington se concentra na construção de apoio internacional para desafiar a assertividade da China em fóruns como a Cúpula do Leste da Ásia e o Fórum Regional da ASEAN, enquanto desenvolvem laços mais estreitos com as partes em disputa no Sudeste Asiático, especialmente as Filipinas, o Vietnã e a Malásia. Os EUA também procuram fortalecer os laços militares com o objetivo de ajudar a solidificar a consciência sobre o âmbito militar nesses países. E desde que a disputa começou, a Marinha os EUA renovou suas ofertas para reforçar os laços com o Vietnã, incluindo a oferta de visitas mais frequentes de embarcações.
Os Estados Unidos e pelo menos alguns países da ASEAN esperam que o aumento da pressão internacional faça a China buscar compromissos edificados em regras globais, como o Direito do Mar das Nações Unidas. No ano passado, Manila desafiou às reivindicações da China pedindo a um tribunal arbitral que decidisse se a linha de nove traços de Pequim tinha legitimidade. A China se recusou a participar do processo, mas alguns observadores esperam que Pequim se sinta pressionada se outros países, por exemplo, o Vietnã, iniciarem ações semelhantes.
Mas é difícil dizer se esta política funcionará, pelo menos no curto prazo. “Do ponto de vista da China, eles não estão pagando um preço muito alto”, disse Bonnie Glaser, um especialista em política externa chinesa do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, que visitou Pequim logo após a emergência do conflito sobre a plataforma de petróleo. “Minha percepção a partir das discussões em Pequim é que os chineses estão determinados a fazer valer as suas reivindicações e estão dispostos a tolerar um grau de tensão com seus vizinhos.”
A China reconhece que não pode desafiar Washington militarmente tão cedo, mas está convencida de que tem uma grande vantagem sobre os Estados Unidos nas relações econômicas com seus vizinhos asiáticos. Glaser disse que os chineses “acreditam que os benefícios que seus vizinhos ganham com a China economicamente prevalecerão [e que] a região acabará por aceitar o domínio chinês sobre o Mar do Sul da China. Uma declaração da ASEAN que expressa ‘preocupações sérias’ não mudará os cálculos da China.”
Murray Hiebert é vice-diretor do ‘Sumitro Chair for Southeast Asia Studies’ do Centro de Estudos Estratégicos e Internacional (CSIS) em Washington DC. Copyright 2014 Centro Whitney e Betty MacMillan de Estudos Internacionais e Regionais de Yale