Por trás da morte de Li Wangyang

21/06/2012 03:00 Atualizado: 21/06/2012 03:00

Chineses participam de um protesto pelo dissidente chinês Li Wangyang em Hong Kong em 10 de junho. (Philippe Lopez/AFP/Getty Images)Comentário

A morte recente do ativista Li Wangyang, um manifestante da Praça da Paz Celestial (Tiananmen), num quarto de hospital em Hunan foi inicialmente rotulada de suicídio pelas autoridades chinesas, mas posteriormente foi classificada como acidente.

Observadores na China e no exterior acreditam que a morte de Li pode ter sido arranjada pelo Comitê dos Assuntos Político-Legislativos (CAPL), num último esforço da fação do ex-líder chinês Jiang Zemin para salvar Zhou Yongkang, outro componentes principais da facção.

A morte suspeita de Li Wangyang e a cremação apressada fizeram manchetes internacionais. Em Hong Kong, protestos estão em andamento. Cerca de 25 mil pessoas se uniram à marcha do último fim de semana, a maior marcha de protesto contra a perseguição de uma figura do movimento democrático desde que Hong Kong retornou à China em 1997.

Numerosas organizações de Hong Kong uniram esforços para lançar uma petição de 100 mil assinaturas solicitando uma investigação minuciosa da morte de Li. Li não era tão conhecido como o ativista cego Chen Guangcheng. No entanto, sua morte imediatamente evocou a ira do público em geral e se tornou um foco da mídia.

Em 6 de junho, o corpo de Li foi encontrado num quarto de hospital, pendurado numa barra de segurança da janela com os dois pés no chão. Li estava sendo tratado por diabetes e doenças cardíacas, e também era cego e quase surdo devido a vários anos de tortura na prisão. Seus parentes disseram que não acreditam que Li teria sido fisicamente capaz de se matar.

A indignação pública a respeito do caso de Li mostra que o povo chinês no país e no exterior não mais toleram a perseguição de ativistas da Praça Tiananmen ou as numerosas violações dos direitos humanos na China. Os internautas chineses também estão pedindo justiça pela morte de Li e alguns exigem que algumas autoridades comunistas chinesas renunciem.

A morte de Li ocorreu pouco depois da turbulência política desencadeada por Wang Lijun e os escândalos de Bo Xilai. Qualquer evento súbito e inesperado na China agora recebe atenção imediata da comunidade internacional.

Há muitas circunstâncias suspeitas em torno da morte súbita de Li. Muitas pessoas estão certas de que o CAPL orquestrou a cena de suicídio depois de assassinar Li Wangyang.

O CAPL é uma ferramenta utilizada pelo regime comunista para perseguir o povo chinês. O regime usa comumente a segurança pública, as forças judiciais, a procuradoria e os militares para reprimir o povo. Em outras palavras, a visão de que o Partido Comunista Chinês (PCC) assassinou Li Wangyang é baseada no fato de que o PCC usou o sistema político e judicial para perseguir e assassinar Li. O sistema prendeu Li ilegalmente por mais de 20 anos, mutilou-o através de todos os tipos de tortura e, finalmente, depois de liberá-lo da prisão, ele foi encontrado morto.

Oportunidade e momento

Durante os 20 anos em que Li esteve ilegalmente detido, o CAPL teve muitas oportunidades para matá-lo. No entanto, a morte de Li não veio até um momento de dupla crise, a reviravolta política do regime e o memorial do massacre de 4 de junho. Muitos observadores acreditam que isto não é uma coincidência.

Sem uma investigação criminal para provar que Li não cometeu suicídio enforcando-se, conforme as autoridades alegaram inicialmente, não é possível decifrar por que os pés de Li tocavam o chão e a corda em seu pescoço estava numa área improvável de causar uma fatalidade. Outro fato é que Li era cego e mal se movia. Poderia um homem com mobilidade limitada subir tão alto para pendurar uma corda e fazer um nó de escalada profissional?

Também é altamente improvável que os assassinos profissionais do Departamento de Segurança Pública chinês cometeriam erros tão amadores, a menos que quisessem intencionalmente deixar uma brecha para desencadear um protesto público.

Criar caos e incriminar pessoas têm sido táticas comuns historicamente utilizadas pelas forças comunistas chinesas e pelo CAPL sob a liderança de Zhou Yongkang. O Massacre da Praça da Paz Celestial em 4 de junho de 1989 e as repressões no Tibete e em Xinjiang são alguns exemplos. Sendo este o caso, a especulação de que o CAPL está criando uma conspiração no caso Li é razoável.

Do ponto de vista da situação política atual precária da China, é possível que a morte de Li Wangyang sirva a múltiplos propósitos para o CAPL.

Um dos propósitos poderia ser uma possível retaliação contra os cidadãos de Hong Kong determinados a comemorar o massacre de 4 de junho durante o aniversário este ano. Outro objetivo poderia ser para atordoar os ativistas e apoiadores do 4 de junho.

Se a morte de Li acontecesse durante os protestos de 4 de junho em Hong Kong, o fato se espalharia para a China Continental através da mídia de Hong Kong. Se isso tivesse acontecido teria certamente provocado protestos em massa e acrescentado combustível à chama do 4 de junho.

A morte de Li ocorreu em 6 de junho, permitindo que os protestos de Hong Kong seguissem seu curso, mas para Zhou Yongkang, a morte de Li coloca o atual líder chinês Hu Jintao e o suposto próximo líder Xi Jinping no centro das atenções.

Xi é o chefe do Grupo de Coordenação Central para Hong Kong e Macau, o líder mais elevado do PCC encarregado dos assuntos de Hong Kong. Xi também é um importante aliado de Hu Jintao e do primeiro-ministro Wen Jiabo. Xi estava envolvido na derrubada do Bo Xilai. Agora é o momento crítico antes do julgamento de Bo para Hu, Wen e Xi decidirem sobre acusarem Bo de conspiração por planejar um golpe de Estado com Zhou Yongkang.

Devido à visita programada de Hu Jintao a Hong Kong em 1º de julho para o aniversário da reunificação de Hong Kong com o Continente, Zhou pode ter tentado usar sua influência restante no CAPL para orquestrar o assassinato de Li. O objetivo de Zhou pode ser provocar protestos em Hong Kong que ameassem Hu e Xi e os levem a poupá-lo, enquanto lidam com Bo.

Zhou Benshun, o secretário-geral do CAPL, é um manipulador do mais alto nível como Zhou Yongkang. O diretor do Departamento de Polícia Municipal de Shaoyang (DPMS), Xiaokui Li, e o chefe da Divisão de Segurança Pública no DPMS, Zhao Luxiang, são os prováveis executores por trás dos bastidores.

A morte de Li Wangyang ocorreu em Hunan e este fato também pode ter sido benéfico para Zhou Yongkang. Um importante aliado de Hu Jintao, o secretário-encarregado do Comitê Provincial do PCC em Hunan, Zhou Qiang, foi responsabilizado pela morte de Li por internautas.

Neste quadro, talvez a morte de Li tenha sido orquestrada por Zhou Yongkang para transferir a culpa para Zhou Qiang, colocando Hu no foco das atenções e criando assim um ambiente de barganha com ele.

Mas como diz o ditado chinês, “ser muito esperto traz prejuízos a si mesmo”.

Se o sistema do CAPL da facção de Jiang tentou usar o assassinato de Li Wangyang para assustar os ativistas e apoiadores do 4 de junho e ao mesmo tempo resgatar Zhou Yongkang de Hu, Wen e Xi, então, o blefe de Zhou Yongkang também ofereceu um novo motivo para Hu, Wen e Xi se livrarem dele.

Li Tianxiao é um analista político sênior da NTDTV, uma emissora independente de língua chinesa de Nova York.