A euforia com o anúncio de que o Brasil sediaria a Copa fez as autoridades e os organizadores cometerem um erro de comunicação, que levou a população a acreditar que o evento resolveria problemas crônicos do país e gerou frustração, disse hoje (7) o coordenador de Projetos da Fundação Getulio Vargas (FGV), Pedro Trengrouse, no 2º Seminário de Gestão Esportiva da FGV. “Nós prometemos demais e entregamos de menos, porque a Copa do Mundo nunca teve esse poder e nunca vai ter”.
“O governo fez uma matriz de responsabilidades muito ampla, incluindo obras de aeroportos, portos, segurança pública, ou seja, uma série de investimentos que já deveriam ou já poderiam ter sido feitos e que deveriam acontecer com ou sem a Copa. Boa parte estava prevista pelo PAC. Tentou-se aproveitar a Copa do Mundo para acelerar esses investimentos e, com isso, passamos para a população a impressão de que a Copa viria para resolver uma série de problemas crônicos e estruturais do Brasil”, disse.
Para Trengrouse, o verdadeiro legado da Copa do Mundo precisa ser a modernização do futebol no país, começando pelo calendário desportivo, que, na visão dele, prejudica os clubes pequenos e impede o crescimento do mercado. Para isso, ele defende que a Federação Internacional de Futebol (Fifa) lidere um processo de reflexão com a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e as federações estaduais e aproveite a paralisação do calendário no ano que vem para reestruturá-lo.
“Nós temos 783 times profissionais e apenas 100 jogam o ano inteiro. São 683 times que jogam quatro meses por ano e dispensam toda a sua comissão técnica, jogadores e profissionais porque não têm atividade o ano inteiro. Essa base da pirâmide poderia gerar R$ 600 milhões e 30 mil empregos se jogasse o ano todo”, disse Trengrouse, que defendeu o maior número de campeonatos locais. “A alteração de calendário pode ser o ponto de partida para pensar toda a estrutura de receitas do futebol no país, porque as receitas decorrem das competições, do público, da relevância das partidas, da qualidade do espetáculo e também, é óbvio, da experiência que um estádio novo como esses de agora pode proporcionar”.
Outro ponto em que é preciso modernizar o futebol é na gestão dos clubes, segundo o professor. “É do século 19”, criticou. Para ele, a Fifa deve promover a experiência entre clubes brasileiros e estrangeiros e as federações de futebol nacional podem seguir o exemplo das europeias definindo modelos de gestão para seus membros. A modernização pode levar o futebol brasileiro a gerar 2 milhões de empregos, em vez dos 370 mil atuais, movimentando R$ 62 bilhões, em vez de R$ 11 bilhões.
Trengrouse também cobrou da Fifa mais iniciativa para organizar um grande número de eventos de exibição pública que respeitem as particularidades do país, o que, para ele, é a única forma de oferecer à população uma experiência diferente das Copas que ocorrem em outros países: “Somos 200 milhões de brasileiros para 4 milhões de ingressos, dos quais metade já está comprometida com os patrocinadores e a outra metade é para todo o mundo. A questão não é só o preço. É preciso reconhecer que o povo brasileiro é apaixonado por futebol e não quer no Brasil a mesma experiência que ele teria se fosse no Japão, na Alemanha ou na África do Sul, que é a experiência de assistir pela televisão simplesmente”, analisou o pesquisador. “É uma questão de inclusão social”.
Na palestra, ele defendeu as exibições públicas em telões como medida de segurança. “Se não for planejado, eles vão acontecer sem planejamento e colocarão em risco a multidão”.
Esta matéria foi originalmente publicada pela Agência Brasil
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