Recentemente fui convidado para falar sobre a remoção de conteúdo da internet, quando este é ofensivo a honra, imagem ou reputação de alguém. O público era alunos do ensino médio com cerca de 15 anos. O convite surgiu porque um dos alunos da instituição publicou em rede social a opinião de que determinada professora estava muito estressada porque, eufemisticamente, não mantinha a vida sexual em dia. O caso gerou rebuliço total e o aluno se viu em situação terrível.
Mas o que isso tem a ver com o chocolate e a traição? As mulheres – sobretudo as de boa forma – sofrem para evitar o chocolate ao argumento de que ele traz um prazer que dura segundos na boca, horas no estômago e o resto da vida na cintura. Em suma: é uma escolha sem volta. Também a traição, sobretudo para quem é cristão e vive o casamento como verdadeiro sacramento. Mas o que isto tem a ver com a internet?
Com relativa frequência, as pessoas procuram advogados para remover conteúdos da internet, por acharem que tal conteúdo lhes é ofensivo. Buscam algo que o advogado nunca poderá lhes dar… Na realidade, uma das linhas históricas defende que a internet surgiu justamente como aplicação militar para desvincular a informação de determinada base física. Mais especificamente, para garantir que, se fosse destruída uma base militar as informações contidas no arquivo local – então em papel – não se perdessem. Ou seja, a finalidade da rede, para quem pensa dessa forma, seria manter as informações sempre disponíveis.
Na sociedade contemporânea há um agravante para isso. Fatos que poderiam passar despercebidos ou ser comentados por pouco tempo, caindo em seguida no esquecimento, quando associados à internet se tornam virais, alcançam milhares de pessoas em poucos segundos e ganham projeção mundial. Quem for ofendido por esse conteúdo poderá buscar, juridicamente, uma série de reparações. Eventualmente, até adotar medidas criminais contra o infrator. Nada disso, porém, lhe assegurará que o conteúdo seja totalmente retirado da internet.
Afinal, existem inúmeros expedientes para dificultar a retirada de conteúdo online. A primeira dificuldade é identificar quem de fato é responsável pelo conteúdo, visto que determinados ambientes online favorecem o anonimato. Mesmo conhecendo o responsável, há ainda o risco de que a rede social em questão não possua sede no Brasil, caso em que será preciso que o processo alcance sua sede internacional, o que custa tempo e dinheiro. Até julho de 2012, por exemplo, o Twitter não tinha sede no país.
E mesmo que se consiga superar com sucesso todos esses obstáculos, nada disso garante que o conteúdo seja efetivamente retirado da internet. Basta que uma pessoa, em qualquer parte do mundo, decida recolocá-lo online, em outra conta de rede social, muitas vezes hospedada em outro país, para que os problemas recomecem.
Apenas para ilustrar, Xuxa, Diego Maradona, Daniela Cicarelli e Carolina Dieckmann enfrentaram esse problema. Cada um deles, por motivos diferentes, teve conteúdo ofensivo a sua imagem publicado na Rede. Em comum, o fato de terem adotado medidas judiciais objetivando remover esse material ad eternum (como se isto fosse possível). Evidentemente, nenhum deles foi bem sucedido. Basta uma rápida pesquisa no Google para ver que o material continua disponível, até com certa facilidade. Afinal, é para isso mesmo que serve a internet: preservar a informação. Admitindo-se sua controversa origem militar, ela é uma “arma” criada com tal finalidade, ainda que tenha evoluído para consagrar também objetivos mais nobres, como o intercâmbio de informações, cultura, lazer e progresso social. Mas tudo ancorado na premissa de compartilhar e preservar conteúdos, mesmo contra a vontade de A ou B.
Isto sem falar que determinados sites (caso do Orkut), mesmo depois que a pessoa encerra sua conta pessoal, continuam mantendo as informações nos servidores, as quais podem ser acessadas por qualquer um que faça busca a respeito. Neste caso, reaparecerão, como num passe de mágica, fotos, comentários e etc.
Assim, ao menos no estágio atual de arquitetura da rede, a remoção definitiva de conteúdo na internet é uma utopia. As ações judiciais que buscam isto costumam sair como tiro pela culatra, pois aguçam a curiosidade e geram ainda mais publicidade para o que se pretende esconder (experimente pesquisar “streisand effect” no Google). Ou seja, a publicação de conteúdo online também é uma escolha sem volta. Convém pensar bastante e ponderar se vale mesmo a pena partilhar determinados aspectos ou fazer certos comentários na rede. Pois, uma vez feitos estarão disponíveis lá, queiramos ou não.
Ocorre que qualquer um de nós, num dia de fúria, pode perfeitamente perder a razão e ter uma vontade incontrolável de fazer algo do qual sabidamente irá se arrepender. Nestes casos, a escolha costuma ser definitiva, sem volta. Meu conselho então é o seguinte: tenha sempre um chocolate por perto.
Leonardo Netto Parentoni é procurador Federal e professor de Direito Empresarial do IBMEC/MG
Esse conteúdo foi originalmente publicado no Portal Migalhas