Eleitores gregos falaram e por pouco aprovaram um partido pró-austeridade. Ao invés de comemorar, os mercados de títulos aumentaram os juros espanhóis na expectativa de mais pressão. Até que ponto a crise da dívida pode chegar?
Na melhor tradição dos economistas, que fazem malabarismos com os problemas usando frases como “por outro lado”, a resposta é que a crise do euro é potencialmente, talvez provavelmente, grave para a Europa com notáveis efeitos de contágio. Mas, contrário à expectativa geral, os efeitos podem ser menos grave no resto do mundo.
A noção de que países excessivamente endividados com economias encolhendo poderiam resolver seus problemas fazendo seus bancos gravemente comprometidos emprestarem dinheiro e comprarem mais dívida de seus governos que afundam tem parecido estranho há muito tempo. Isso evoca a imagem de dois bêbados cambaleando pela rua segurando um ao outro.
Porque a Europa não é politicamente integrada, os políticos têm dificuldade em agir como se as economias do sul merecessem o mesmo grau de apoio que o governo federal dos EUA oferece a regiões em dificuldade sob um sistema federal verdadeiramente integrado.
O resultado tem sido injeções de fundos relutantes, insuficientes e tardias que quase todos os comentaristas chamam de “chutar a lata rua abaixo”. A lata está ficando pesada demais para chutar e, como manifestações de alívio nos mercados financeiros têm encurtado de semanas para horas, podemos estar perto de uma verdadeira decisão, uma Europa mais integrada ou um euro relaxado.
Participantes do mercado descobriram que novos empréstimos podem torná-los parceiros juniores e impor cortes, reduções nas quantias pagas em comparação com o montante devido em títulos do governo, muito similar ao que fez a Grécia. Assim, os investidores exigem taxas de juros elevadas, como o recente 7% de rendimento espanhol que sua dívida mostra. Essas taxas garantem eventual insolvência de países altamente endividados a menos que haja perdão da dívida ou de um resgate.
A Alemanha deve avaliar se quer o problema e a despesa de salvamento de seus maiores mercados de exportação europeus ou cortá-los. O presidente François Hollande disse que quer menos austeridade, mas até mesmo a França é vulnerável nas atuais circunstâncias.
Os alemães sabem que a austeridade imposta é impopular e, de qualquer forma, a Itália, Espanha, Portugal e Grécia juntos são grandes demais para salvar. A Europa está entre uma rocha e um lugar duro. Não se pode forçar a “desvalorização interna” através de salários em queda nem criar um crescimento suficiente para permitir que a dívida existente seja atendida.
Impacto global
E quanto ao resto do mundo? Os Estados Unidos tem apenas exposição moderada à UE através de suas exportações. As exportações dos EUA para a zona do euro são de apenas 1 a 2% do PIB dos EUA. Os bancos norte-americanos, enquanto mais estáveis do que suas contrapartes do euro, ainda não revelaram totalmente sua exposição aos empréstimos, obrigações ou derivados e isso poderia causar problemas. Além disso, muitas multinacionais norte-americanas têm exposição europeia pesada e um colapso da UE atingiria seus lucros e valores de ações dos EUA.
Embora o impacto direto da contração europeia retarde ainda mais uma taxa de crescimento já anêmica e coloque mais pressão sobre o Congresso para gastar mais ou manter os impostos insustentavelmente baixos, isso não causaria uma depressão nos Estados Unidos. Falcões do déficit estão corretos que, ao longo do tempo, os gastos devem crescer menos rapidamente e as receitas fiscais deverão crescer mais rápido. Gastos de estímulo e cortes de impostos, embora necessários se a UE falhar, atrasariam ainda mais e de forma crítica as mudanças fiscais necessárias.
A crise do euro poderia ser um desafio maior para a China. Enquanto as exportações podem ter mostrado um pouco de força, vários trimestres de aperto de crédito têm reduzido a inflação e o crescimento real na China. Porque as autoridades locais são promovidas quando relatam bom crescimento, o crescimento real pode ficar para trás dos dados oficiais, mostrando já uma desaceleração.
Dados sobre o crescimento da eletricidade, dados bastante confiáveis e altamente relacionados com a produção, mostram apenas um dígito de crescimento. O imobiliário e o investimento industrial excessivo criaram excesso de capacidade. Monopólios e oligopólios empresariais do Estado e a incerteza econômica mantêm os rendimentos pessoais e o consumo baixos, apenas cerca de um terço do PIB, em comparação com o dobro dessa razão em outros lugares.
Mas a UE compra mais de um quinto das exportações da China. Se isso diminuir, o governo precisa descobrir formas de aumentar a demanda sem recriar o desperdício de gastos e empréstimos ruins comuns na rodada de estímulo de 2008-2010. A China tem mais espaço fiscal que os países mais ricos, mas o excesso de capacidade existente e empréstimos bancários subestimados significam que seus líderes devem se mover com cuidado ou farão os problemas avançarem ainda mais.
Ainda assim, as perspectivas para a China são de crescimento relativamente rápido, 5 a 7% ao ano pelos próximos vários anos, que pode ser esperado mesmo com uma quebra europeia. Um cenário conturbado para a UE colocaria a China 2% acima. A força de trabalho da China não está crescendo tão rapidamente, se é que cresce, então, tal taxa de crescimento pode intensificar as pressões políticas existentes.
A Índia, outro país grande, está muito menos exposto ao comércio do que a China. As exportações de bens e serviços da Índia eram de apenas 22% do PIB, contra 30% da China. Além disso, a zona do euro consome menos de um quinto das exportações da Índia, assim, o impacto direto total da contração seria indesejável, mas não esmagador.
A principal dificuldade de crescimento da Índia agora é seu renhido investimento em eletricidade e infraestrutura e seu governo fraco. A Índia poderia apresentar maior crescimento em si mesma, mas isso teria impacto limitado no resto do mundo.
A maioria das outras grandes nações em desenvolvimento como a Rússia, o Brasil ou a Indonésia dependem das exportações de matérias-primas em muito maior extensão do que a China ou a Índia, que juntas com a Europa são seus principais clientes. Se a Índia e a China desacelerarem como a Europa declina, os preços dessas matérias-primas tendem a cair e isso reduzirá as receitas, mesmo que as quantidades declinem apenas modestamente.
Isso já aconteceu. O petróleo e o cobre, duas matérias-primas indicativas, estão 25% abaixo de suas altas recentes. Carvão, minério de ferro e muitos produtos alimentares seguiram esse padrão. Declínios de preço adicionais são possíveis.
O coringa no baralho econômico é que, enquanto os impactos diretos na maioria dos países, deixando a Europa Oriental e a África do Norte à parte, de um colapso do euro são de pequenos a moderados, poderia haver uma série cumulativa de impactos indiretos que configuram uma espiral descendente.
As posições iniciais são mais fracas. A maioria dos países ricos, incluindo o Japão, agora tem dívidas muito superiores ao PIB e/ou taxas de juros menores do que em 2008. A eficácia da política fiscal e monetária é limitada, pois `
mesmo onde tal política ajudaria, poderia ser politicamente arriscado e impopular.
O resultado é que os mercados financeiros estão com medo. Os investidores estão dispostos a comprar cinco anos da dívida pública dos EUA ou da Alemanha por menos de 1% de juros anuais, muito menor do que a taxa esperada de inflação. Isto só faz sentido se os investidores esperam deflação, causada por economias fracas, ou ver a possibilidade de um resultado altamente negativo e estão dispostos a aceitar a quase certeza de um resultado ligeiramente negativo em seu lugar.
Na verdade, a habilidade dos economistas de entender ligações complexas, repostas e psicologia é limitada e a desaceleração relativamente modesta prevista, por exemplo, nas análises recentes do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, poderia estar bem fora do alvo se a espiral de resposta negativa intensificar e as reações continuarem lentas.
A economia mundial provavelmente sobreviverá com um crescimento anêmico, mas poderia ser muito pior.
David Dapice é professor associado de economia da Universidade Tufts e economista do Programa Vietnã da Escola Kennedy do Governo da Universidade de Harvard. Com a permissão da YaleGlobal Online. Copyright © 2012, Centro Yale para o Estudo da Globalização da Universidade de Yale.