O vestibular nacional na China, realizado todo mês de junho, é o teste mais sério e árduo que os adolescentes na China enfrentam. Famílias chinesas muitas vezes apostam tudo no sucesso de um dos filhos nesses exames, que determinam que universidades as crianças poderão frequentar e assim, até certo ponto, que futuro terão.
Para alguns, a pressão é simplesmente demais e, nos últimos meses, uma onda de suicídios e tentativas de suicídio tem sido relatada.
“Eu abandonei meu corpo e minha alma, mas eu sempre estarei aqui, olhando para o céu e a terra”, disse uma nota encontrada numa carteira escolar do estudante chinês Xiaofeng [um pseudônimo] do Colégio Pingyang, em Wenzhou, capital da próspera província chinesa de Zhejiang.
Seu corpo foi encontrado num rio nas proximidades e as mensagens codificadas que ele deixou indicavam que foi um suicídio; isto apesar do fato de que Xiaofeng sempre esteve entre os 10 primeiros da classe.
Uma estudante da Escola Experimental Tsinghua, em Shenzhen, fez uma tentativa frustrada de suicídio, também em maio, apunhalando-se no estômago com uma faca de frutas. A cena foi capturada em imagens de vigilância e ela foi levada para o hospital, onde permanece em estado crítico. A escola suspeita que a pressão psicológica do exame iminente foi demais para ela.
Outras reportagens falam de estudantes pulando de edifícios escolares ou de janelas. Em março, um estudante pulou da janela do 5º andar às 19h numa escola na província de Zhejiang. Crianças chinesas frequentemente estudam até tarde da noite, devido à competitividade e exigência do ambiente. Ele morreu no hospital.
O vestibular nacional, chamado ‘gaokao’ em chinês, efetivamente decide que universidade um estudante pode frequentar. Alunos do último ano do ensino médio de todo o país fazem o exame em 7 e 8 de junho. Eles são testados em seus conhecimentos de matemática, inglês e, mais especificamente, de humanidades ou ciências.
As escolas secundárias são classificadas segundo o desempenho de seus alunos, por isso as crianças são pressionadas a serem bem-sucedidas tanto pelos pais como pelos professores e administradores escolares.
Junho é frequentemente chamado de “Junho Negro” por causa do clima de nervosismo e pânico que o teste cria para estudantes, pais, professores e escolas. Não apenas a preparação é fatigante, mas a espera e ter de lidar com o resultado também podem provocar grande ansiedade. Muitos suicídios são relatados após a liberação dos resultados, quando alunos não conseguem atingir as notas que esperavam.
Estudantes na China são conhecidos por protestarem contra as longas horas de estudo e de pesados trabalhos de casa necessários para se prepararem para os testes. Uma carta publicada num website do governo do distrito de Huinong, em Ningxia, Sudoeste da China, se queixa de que os alunos da escola secundária nº 21 tem de ficar na escola 11 horas e meia por dia e não é permitido sair. “Nós estudantes vivemos deprimidos!”, diz a carta.
Apesar de tudo, ficar retido na escola por 10-12 horas por dia se tornou normal na China. Depois dessa maratona, os alunos em seguida vão para casa fazer lições que lhes consomem mais 2-4 horas. Atividades extras ocupam os fins de semana e sobra pouco tempo para se socializar, conectar-se com a natureza ou tocar um instrumento musical.
O suicídio foi a principal causa de morte entre adolescentes e adultos jovens chineses em 2013, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China. Em muitos países ocidentais, lesões não intencionais são a principal causa de morte entre pessoas dessa faixa etária.
Intelectuais chineses têm apontado que o sistema de avaliação educacional, que se baseia estritamente em testes padronizados e pontuações, é o cerne do problema. Cheng Pingyuan, professor de desenvolvimento social na Universidade da Capital de Nanjing, disse em ensaios que o modelo precisa ser mudado fundamentalmente: para um estilo mais personalizado e diversificado de testes que permita que habilidades individuais sejam consideradas e medidas. Uma educação humanista e a inculcação de valores, em vez da estrita memorização ou tarefas técnicas, também devem fazer parte da educação, argumenta ele.
O sistema baseado na pontuação também gera conflitos entre professores e alunos, mostra a pesquisa de Cheng. Professores repreendem os alunos e geralmente são insensíveis às enormes tensões a que eles estão sujeitos. A mídia chinesa diz que pelo menos 14 alunos se mataram no ano passado após serem criticados ou verbalmente abusados por seus professores.
Isso ocorre porque a falha em se atingir uma pontuação elevada pode refletir mal sobre o professor ou a escola. Aqueles que não tiram boas notas nos principais temas são assim considerados “maus alunos” pelos professores, que desconsideram talentos em outras áreas e não são incentivados a considerar o desenvolvimento pessoal global dos alunos. O professor Cheng diz que o ambiente de estudo intenso, a competição e a avaliação rigorosa acabam prejudicando a aprendizagem real, a criatividade e o pensamento independente.