O Partido Comunista Chinês está preocupado: seus oficiais estão se tornando religiosos

06/06/2015 20:25 Atualizado: 06/06/2015 20:25

Ainda que o Partido Comunista Chinês seja oficialmente ateísta, ele sempre manteve 5 religiões sancionadas, as quais o Partido utiliza para reforçar o seu próprio domínio sobre o povo chinês. O secretário geral Xi Jinping reiterou este ponto no dia 21 de maio numa reunião política, dizendo que a religião deve ser usada para guiar os corações e as mentes do povo a favor da doutrina do Partido.

A maior preocupação nos últimos anos tem sido o aumento da religiosidade entre os próprios oficiais comunistas. O partido pode tolerar a existência de religiões, porém os seus próprios oficiais estão proibidos de acreditar nelas. O crime econômico é o principal componente das “violações de disciplina” que tem sido largamente aplicado em oficiais chineses, que consequentemente são despedidos de seus cargos. Entretanto, a crença em “superstições” também é pretexto para incriminação quando o Partido quer mudar seus postos.

Um monge passa em frente a uma porta no templo Yonghegong Lama, em Pequim (Wang Zhao/AFP/Getty Images)
Um monge passa em frente a uma porta no templo Yonghegong Lama, em Pequim (Wang Zhao/AFP/Getty Images)

A fé das bases

No dia 21 de maio, o governo municipal de Wenzhou, na província de Zhejiang, relatou as recentes descobertas feitas pela equipe de inspeção local do Partido. O relatório mencionava uma nova ronda de esforços com o objetivo de resolver o problema dos oficiais de baixo escalão abraçarem práticas religiosas ou de oficiais que perderam a fé no partido, que esqueceram-se do sentido de “Natureza do Partido”, ou não possuem mais a qualificação para ser membro do partido.

A Província de Zhejiang tem uma grande população de cristãos, e é chamada de “Jerusalém da China”. Este ano, as autoridades comunistas removeram as cruzes de 400 igrejas para reduzir a visibilidade da religião.

Em setembro no ano passado, uma equipe enviada para Zhejiang pela central do Partido Comunista para realizar inspeções anticorrupção, terminou sua operação de 2 meses, segundo reportagem do web-site de notícias Guncha Net, publicada no dia 22 de maio. Quanto à questão dos oficiais do partido tornarem-se adeptos a grupos religiosos, a equipe de inspeção sugeriu que os oficiais fossem continuamente doutrinados com ideologia comunista, especialmente a nível local, de forma a salvaguardar a “natureza avançada e pureza do partido”.

De acordo com Xia Ming, professor de ciência política da City University of New York, os esforços do Partido para eliminar a fé de seus oficiais dificilmente serão bem sucedidos, pois iria simplesmente fazer com que estes praticassem sua fé na clandestinidade, relatou a Rádio Free Asia (RFA).

“Muitos oficiais de alto escalão e suas famílias são, de fato, Budistas e Cristãos, mas eles disfarçam esse aspecto para esconder a sua fé da sociedade. Resumindo, esta nova ronda de inspeções não pode alcançar nada, e só mostra que o Partido Comunista Chinês está perdendo o controle espiritual sobre as pessoas”, disse Xia à RFA.

Um homem Uyghur caminha frente à Mesquita Id Kah, a maior mesquita da China, em Kashgar, região autônoma de Xinjiang, China (Getty Images/Getty Images)
Um homem Uyghur caminha frente à Mesquita Id Kah, a maior mesquita da China, em Kashgar, região autônoma de Xinjiang, China (Getty Images/Getty Images)

Porque o Partido Comunista teme a religião?

De acordo com um website estatal, “alguns lideres do Partido… são crentes ardentes em Deuses e Budas, e estão na linha da frente da superstição feudalista. Se esta tendência continuar, terá sérias consequências, confundindo as mentes dos oficiais do Partido e colapsando a organização do comunismo”.

Zan Aizong, cristão e escritor independente, é um utilizador ativo de blog e microblog na China. Em entrevista à RFA, ele disse que as afirmações do secretário geral Xi Jinping têm o objetivo de dissociar as religiões ocidentais e chinesas de suas bases espirituais comuns, e reforçar o papel do Partido Comunista como porta voz de tudo o que é chinês.

“O fato é que não existem fronteiras nacionais entre religiões. Quer seja o Cristianismo ou o Budismo, eles existem dentro e fora da China”, diz Zan. “Que papel o Partido Comunista pode desempenhar, uma vez que crê no ateísmo? O governo chinês deveria preocupar-se apenas com o seu próprio governo e a proteção das liberdades religiosas garantidas pela constituição”, continuou.

Bob Fu, presidente da China Aid Association, uma rede de direitos humanos Cristã, disse que a exigência do Partido de que as religiões devem ser leais à liderança comunista vai contra o princípio da liberdade religiosa, relatou a RFA.

“Qualquer grupo religioso ou grupo social que não esteja sobre o controle total, liderança e manipulação do Partido Comunista é considerado como uma ameaça à estabilidade tanto do Partido como da sociedade. Qualquer grupo assim pode desafiar o sistema autocrático do Partido,” disse Fu. “Eu penso que a atitude do partido para com a religião é uma projeção das suas próprias inseguranças quanto à capacidade de governar”.