Paradoxo do regime chinês contra a ONU

22/03/2011 03:00 Atualizado: 04/09/2013 16:24
Líbios protestam contra a Rússia e a China, por seus votos no Conselho de Segurança da ONU, diante da embaixa de Moscou em Tripoli (Mahmud Turkia/AFP/Getty Images)
Líbios protestam contra a Rússia e a China, por seus votos no Conselho de Segurança da ONU, diante da embaixa de Moscou em Tripoli (Mahmud Turkia/AFP/Getty Images)

Para se proteger, o PCCh é a favor da não-interferência nos assuntos internos dos países, mas, no caso da Líbia, ele teve que mudar de estratégia para evitar maior condenação internacional

Na tentativa de justificar o uso de força militar contra manifestantes anti-governo, o ditador líbio Muammar Kadafi disse que sua atitude é idêntica à do regime chinês, que reprimiu mortalmente os manifestantes da democracia na Praça Tiananmen em 1989.

Mesmo após esta declaração, o regime chinês, contrariando sua política usual de ignorar o que os países fazem dentro de suas fronteiras, foi favorável à resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que sancionou Kadafi por suas ações. Entre as sanções, incluindo uma nomeação para o Tribunal Penal Internacional em Haia, onde se investiga o assassinato de civis e crimes contra a humanidade supostamente cometidos pelo ditador.

De acordo com David Kilgour, ex-deputado e advogado de direitos humanos do Canadá, este foi um golpe para o regime chinês, “O regime chinês votou a favor de sanções contra a Líbia, mas eu tenho certeza que eles não estavam muito contentes de fazer isso. Claro, eles estavam preocupados que as sanções poderiam algum dia ser aplicadas a China.”

O regime chinês é notório em sua política de oposição a qualquer intervenção da ONU nos assuntos internos dos países. Este é um reflexo dos esforços de conservação do próprio regime comunista, que aplica uma série de medidas duras contra a população chinesa.

Entre os mais expressivos abusos do Partido Comunista Chinês inclui-se o massacre da Praça Tiananmen em 1989, que usou militares para esmagar a revolta estudantil pacífica que exigia democracia e reformas no país; a repressão aos tibetanos e uigures; e a perseguição ao Falun Gong, que começou em 1999 e se perpetua até hoje.

O editor-chefe da revista Primavera de Pequim, Hu Ping, acredita que o regime chinês não teve escolha senão votar com as Nações Unidas a favor de um sistema de sanções contra Kadafi.

“Se o governo chinês não apoiar a resolução, ele estaria do lado de Kadafi, e se tornaria alvo de condenação internacional. Na votação sobre a resolução, o regime também admitiu indiretamente que deve prestar contas ao Tribunal Penal por seus crimes contra a sua humanidade em 1989.”

Na quinta-feira dia 17, a China e a Rússia mudaram suas posições, e a Índia, a Alemanha e o Brasil se abstiveram na votação, em que foi aprovado não só a criação da zona de exclusão aérea, mas “todas as medidas necessárias” para proteger civis contra as forças do ditador Muammar Kadafi.

O futuro da Líbia é incerto, assim como o de Kadafi, no entanto, se o ditador for julgado e condenado por crimes contra a humanidade cometidos na Líbia, a comunidade internacional pode esperar o mesmo resultado para os membros do Partido Comunista Chinês envolvidos em crimes contra os direitos humanos, como o ex-presidente do Partido, Jiang Zemin, o único ditador na história processado em mais de uma dúzia de países.

A esperança de um mundo livre do autoritarismo tem crescido em meio ao tumulto das nações árabes, que desafiam o medo e a repressão, trazendo esperança a lugares onde a liberdade não é um direito questionável, mas é ausente e incomum.