Este discurso de David Kilgour foi apresentado na Universidade McGill, Montreal, em 6 de abril de 2010. Kilgour disse que a principal conclusão do livro “Colheita Sangrenta: A matança de praticantes do Falun Gong por seus órgãos” é a seguinte:
Ocorreu e continua a ocorrer hoje em dia a extração forçada em larga escala de órgãos de praticantes do Falun Gong. Nós concluímos que desde 1999 o governo chinês e suas agências em numerosas partes do país, em hospitais particulares, mas também em centros de detenções e ‘cortes populares’, levaram à morte um grande, porém desconhecido, número de prisioneiros da consciência, os praticantes do Falun Gong. Seus órgãos vitais, incluindo rins, fígados, córneas e corações foram extraídos involuntariamente para serem vendidos por altos preços, algumas vezes para estrangeiros, que normalmente enfrentam longa espera por doações voluntárias de órgãos em seus países de origem.
Dos 52 tipos de evidências examinadas, nossas descobertas não vieram de uma única evidência, mas de seus efeitos cumulativos. Cada uma delas é verificável por si mesma e a maioria incontestável. Em combinação, elas constituem um quadro geral de culpa.
Os esforços de muitos na China e ao redor do mundo, incluindo nosso relatório independente, têm feito diferença para acabar com este novo crime contra a humanidade? O livro aponta vários desdobramentos dentro e fora da China, incluindo estes:
• Os pacientes chineses, desde 26 de junho de 2007, estão tendo prioridade de acesso a transplantes de órgãos, em lugar dos estrangeiros;
• Websites na China que costumavam anunciar os preços de órgãos para transplante e curtos prazos de espera para transplante desapareceram. Nós arquivamos estes sites, mas os sites não são mais visíveis a partir de suas fontes;
• O governo chinês, agora, aceita que esta fonte de órgãos de prisioneiros é imprópria. O vice-ministro da Saúde, Huang Jeifu, no momento do anúncio de um projeto-piloto de doação de órgãos em agosto de 2009, afirmou que prisioneiros executados “definitivamente não são uma fonte adequada para transplante de órgãos”.
Desde que começamos nosso trabalho, tem havido iniciativas significantes fora da China.
• Taiwan proibiu a visita de médicos chineses que negociam transplantes de órgãos;
• A maioria dos hospitais para transplantes em Queensland, Austrália, baniram o treinamento de cirurgiões chineses;
• Israel aprovou uma lei proibindo a venda e intermediação de órgãos. Também terminou o financiamento através do seguro de saúde de seus cidadãos que realizavam transplantes na China;
• Um senador belga Patrik Vankrunkelsven e um membro canadense do Parlamento Borys Wrzesnewskyj introduziram no Parlamento de seus respectivos países, uma legislação extraterritorial proibindo o turismo de transplante. A legislação proposta iria, quando promulgada, punir qualquer paciente de transplante que recebesse um órgão sem o consentimento do doador, quer o paciente saiba ou não da ausência de consentimento;
• A Associação Médica Mundial entrou em acordo com a Associação Médica Chinesa que órgãos de prisioneiros e de pessoas em custódia não devem ser utilizados para transplante, exceto para os membros da família imediata;
• A Sociedade de Transplante se opôs ao transplante de órgãos de prisioneiros e a apresentação de estudos envolvendo dados de pacientes ou amostras de receptores de órgãos ou tecidos de prisioneiros.
Estas mudanças não são suficientes para resolver o abuso que temos relatado. Pelo contrário, para os praticantes do Falun Gong, a questão tem piorado, e não o contrário. Desde que começamos nosso trabalho, o número de prisioneiros condenados à morte e então executados diminuiu drasticamente, mas o número de transplantes, num primeiro momento caiu um pouco, mas depois voltou aos níveis anteriores. Uma vez que a única outra fonte significativa de órgãos para transplantes na China, além de praticantes do Falun Gong, são prisioneiros condenados à morte, um decréscimo de abastecimento de prisioneiros condenados à morte significa um aumento de abastecimento de praticantes do Falun Gong. Embora as violações contra os praticantes do Falun Gong tenham se tornado mais agudas desde que nosso trabalho começou, o movimento substancial nas políticas e práticas, tanto dentro como fora da China, nos encoraja. A vontade de mudança está aí. Todos nós precisamos continuar a pressionar por mudanças até o abuso acabar.
Exportações de trabalho forçado
A última questão que vou tratar por razões de tempo é o trabalho forçado dos praticantes do Falun Gong e de outros em toda a China e as implicações para a indústria em Quebec, no resto do Canadá e em outros países. A rede de campos de trabalho forçado atual na China já existe desde a década de 1950, quando Mao reformou-as a semelhança das que foram criadas na Rússia de Stalin e no Terceiro Reich de Hitler. Na China, até hoje, exige-se apenas a assinatura de um policial para mandar alguém a um campo de trabalho por até quatro anos. Não há audiências ou recursos, na melhor tradição totalitária.
Na pesquisa para o nosso relatório sobre as alegações de que os praticantes do Falun Gong foram mortos por seus órgãos na China, David Matas e eu visitamos cerca de uma dúzia de países para entrevistar os praticantes que haviam sido enviados a campos de trabalho forçado, mas que depois conseguiram sair dos campos e do próprio país.
Eles nos disseram que trabalhavam em péssimas condições por até 16 horas por dia, sem pagamento, pouco alimento, dormindo apertados e juntos no chão, e sendo torturados frequentemente. Seu trabalho envolveu produzir mercadorias de exportação, abrangendo desde roupas, a pauzinhos, até decorações de Natal, sem dúvida, para contratantes não identificados e para exportação.
Uma estimativa do número destes chamados campos de “reeducação pelo trabalho” em toda a China a partir de 2005 foi de 340, com uma capacidade de cerca de 300 mil trabalhadores. Outros estimam que o número de presos seja muito maior. Em 2007, um relatório do governo dos EUA estima que pelo menos metade dos presos nos campos eram praticantes do Falun Gong.
É claro, isto é o resultado da combinação de um governo totalitário e uma economia onde ‘tudo é permitido’, o que possibilita a continuação de uma produção de exportação desumana.
Devo ressaltar que um amigo de Montreal disse há algum tempo que ele estima que existam, apenas nesta província, até cinquenta fabricantes que foram assistidos por agências do governo federal para mover a produção de Quebec para a China. Meu telefonema em Ottawa para a Export Development Corporation não produziu confirmação; nem provocou uma negação.
Um exemplo bem conhecido deste padrão é a Goodyear Tire, que encerrou mais de 800 empregos em Quebec há alguns anos, a fim de se beneficiar das vantagens de uma fábrica na China. Pouco tempo depois da área de sua fábrica em Montreal ter fechado, o governo dos EUA declarou que os pneus fabricados na China eram um perigo à segurança. Nenhum dinheiro do contribuinte deve ser utilizado para enviar trabalhos canadenses para a China ou a qualquer lugar fora do nosso país.
Passo agora a palavra ao meu amigo e colega David Matas, que foi ontem admitido na Ordem do Canadá pelo Governador Geral no Rideau Hall.