RIO DE JANEIRO — O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Wadih Damous, publicou hoje uma nota condenando a violência nas manifestações, após o episódio que feriu gravemente um cinegrafista da Band na Central do Brasil na semana passada. Abaixo, a íntegra da nota da comissão.
“A utilização de rojões que vitimou o jornalista Santiago Ilídio Andrade foi de uma irresponsabilidade criminosa. O uso da violência em manifestações públicas merece repúdio, parta de onde partir: da polícia ou de manifestantes. De qualquer forma, o Estado tem que entender que tratar como guerra a segurança pública e as manifestações só contribui com essa violência. O trágico episódio, no entanto, não deve servir de pretexto para criminalizar os atos públicos, que são um direito constitucionalmente assegurado.”
Na quinta-feira (6) à noite, o cinegrafista da Band Santiago Andrade, de 49 anos, foi atingido na cabeça por um rojão enquanto filmava o protesto contra o aumento das passagens de ônibus no centro do Rio de Janeiro. Ele está em coma, informou a Secretaria Municipal de Saúde. Santiago foi submetido a uma cirurgia no Hospital Municipal Souza Aguiar, também no Centro, onde estava internado. A vítima sofreu um afundamento no crânio e perdeu parte da orelha. Segundo a Polícia Civil, mais seis pessoas terminaram feridas e 28 manifestantes presos.
O presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, em entrevista na sexta-feira (7) ao Jornal Nacional, da Rede Globo, alertou que a agressão ao cinegrafista representa uma ameaça à liberdade de imprensa e a toda a sociedade. “Esta bomba atingiu um jornalista, mas agrediu em verdade a sociedade brasileira. O Estado democrático brasileiro é que perde com esse tipo de agressão. A liberdade de imprensa deve ser protegida e depende fundamentalmente do livre exercício da profissão de jornalista. Esse tipo de agressão em nada colabora para um país livre, democrático e justo que todos queremos”, comentou Marcus Vinicius.
Em nota, a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) também repudiou, na quinta-feira (6), a violência contra o cinegrafista. “Se faz necessária uma apuração célere do ocorrido para que procedimentos sejam revistos e para que o Estado proteja a liberdade de expressão, a liberdade de informação e o jornalista.” O texto também destaca se tratar do terceiro caso de agressão a jornalistas este ano e lembra os 114 profissionais da imprensa feridos em 2013 durante a cobertura dos protestos em todo o país.
O episódio gerou mais repercussão, nacional e internacional, que a própria causa do protesto, gerando ainda mais apreensão para quem planeja desfrutar da Copa do Mundo, em junho. Diante da falta de provas, especulações sobre a autoria do crime agitaram as redes sociais. Desta vez, novamente de forma precipitada, a Globo News e parte dos manifestantes atribuíram a responsabilidade à polícia. A correção somente foi feita após imagens feitas por um fotojornalista de um veículo russo virem a conhecimento.
O tatuador e estudante universitário Fábio Raposo, 22 anos, morador do Méier, foi indiciado ontem pela Polícia Civil do Rio como coautor da explosão que feriu o cinegrafista. Ele se entregou na madrugada deste sábado (8) afirmando que passou o artefato para o autor do crime, que está sendo procurado, mas dizendo não conhecê-lo. Ele ainda responde por dano ao patrimônio público e associação criminosa em manifestações anteriores.
Raposo, que diz não ter tido a intenção de machucar o jornalista, foi indiciado por tentativa de homicídio qualificado pelo uso de artefato explosivo e pelo crime de explosão. Segundo o delegado responsável pelo caso, Maurício Luciano, da 17ª DP (São Cristóvão), se condenado, ele pode pegar até 35 anos de prisão.
O vendedor ambulante Tasman Amaral Accioly morreu na noite desta sexta-feira (7) no Hospital Municipal Souza Aguiar após, fugindo da confusão, ser atropelado por um ônibus na Avenida Presidente Vargas. Também foram relatados abusos policiais.
Mote das manifestações que sacudiram o país no ano passado, que atingiram o auge em junho abarcando também uma gama de outras demandas, a passagem de ônibus na capital fluminense aumentou de R$ 2,75 para R$ 3 neste sábado (8). Na época, tal Porto Alegre em abril, Rio e São Paulo chegaram a recuar, anulando o aumento da tarifa.