O enigma das reservas cambiais da China

28/04/2011 00:00 Atualizado: 28/04/2011 00:00

Um funcionário conta dinheiro numa filial do Banco Comercial e Industrial da China Ltda (ICBC) em 18 de abril em Huaibei, província de Anhui, China. O Banco Popular da China (PBOC), o banco central, elevou em 21 de abril pela quarta vez este ano a taxa de reservas exigidas aos credores em 50 pontos para frear a persistente e crescente inflação. (ChinaFotoPress/Getty Images)

O regime chinês enfrenta enorme desafio quanto às suas grandes reservas de moeda estrangeira.

As autoridades não querem aumentar as reservas cambiais. A ideia é manter o crescimento econômico, afirmou um economista chinês. Crescimento econômico significa mais empregos e isto ajuda o regime a se manter no poder. Esta é a única forma que podem manter o yuan desvalorizado. Mas agora a inflação está se tornando uma ameaça que pode arruinar este plano.

As reservas cambiais da China cresceram além do razoável e este rápido crescimento pode levar a uma excessiva taxa de liquidez e criar uma “significativa pressão de esterilização monetária”, declarou Zhou Xiaochuan, Presidente do Banco Central, em 18 de abril após discursar na Universidade de Tsinghua em Pequim.

Segundo a Investopedia.com, esterilização monetária se refere às ações nas quais o banco ou a reserva federal procuram isolar-se do mercado de divisas para compensar os efeitos da instabilidade da moeda. O processo de esterilização é utilizado para manipular o valor da moeda nacional em relação a outra moeda, e tem início no mercado estrangeiro.

As reservas cambiais da China aumentaram de 197 bilhões para 3 trilhões de dólares americanos durante o primeiro trimestre de 2011, tornando-se a maior reserva cambial do mundo.

Enquanto isto, a inflação no país se agravou. Em março, o índice de preços ao consumidor na China subiu 5,4% a mais em relação ao mesmo período do ano passado.

Economista e ex-funcionário do Banco Central da China, o Dr. Jian conversou com A Grande Época sobre as causas e consequências do crescimento histórico das reservas cambiais da China. Ele disse que as reservas cambiais e a inflação estão relacionadas, e a causa foi a política incorreta das autoridades chinesas.

O principal objetivo de acumular divisas é minimizar o impacto que o desequilíbrio dos pagamentos do comércio internacional e a crise financeira mundial exercem sobre a moeda local. “Todo país precisa ter reservas cambiais, mas 3 trilhões de dólares já é exagero”, disse o Dr. Jian.

Grande quantidade de reservas foi utilizada para comprar títulos estrangeiros, principalmente títulos do Tesouro Norte-americano. A China possui pelo menos 2 trilhões de dólares em títulos norte-americanos, declarou Ben Bernanke em fevereiro de 2011.

No entanto, desde o ano passado, muitos países relaxaram suas políticas monetárias a fim de estimular a economia e com isto as principais moedas do mundo têm se depreciado a uma velocidade mais rápida, com 11% para o iene e 6% para a libra esterlina.

Isto fez com que as reservas estrangeiras da China se depreciassem.

“Por exemplo, 5% de depreciação desvalorizariam as reservas chinesas em 500 bilhões de dólares americanos. Os números reais devem ser maiores que estes”, disse o Dr. Jian. “Outros países, na verdade, se beneficiaram disto”, acrescentou.

O Dr. Jian afirmou que a grande quantidade de reservas estrangeiras não traz nenhum benefício para os chineses, apenas inflação.

O aumento da proporção entre reservas e o PIB resultou no aumento contínuo da oferta de moeda. “O crescimento da inflação nos últimos meses está relacionado com o aumento das reservas. Existem outros fatores, porém de menor impacto”, disse o Dr. Jian.

Disse também que há várias formas de reduzir o superávit comercial. Pode-se valorizar o yuan ou pode-se aumentar o preço de exportação das mercadorias, seja através do aumento dos salários seja através da inflação.

Outra forma de resolver o problema do excesso de reservas é aumentar significativamente as importações. Mas a solução fundamental, de acordo com o Dr. Jian, é melhorar a taxa de câmbio. “As autoridades utilizam a inflação interna para reduzir as reservas. Querem resolver o problema às custas do povo chinês”, disse o Dr. Jian.

Prevenindo o desemprego e os protestos

O Dr. Jian acredita que as autoridades chinesas não queriam que as reservas aumentassem. Sua intenção é manter o crescimento da economia, o que permite ter mais empregos e ajuda o regime comunista a manter-se agarrado ao poder, disse ele.

O crescimento econômico da China durante os últimos 20 a 30 anos pode ser atribuído principalmente à desvalorização do Yuan e ao crescimento dos investimentos em ativos fixos. O desvalorizado Yuan levou a 30% de crescimento anual nas exportações.

“Se a taxa de desemprego disparar, causará agitação social e o regime comunista não conseguirá manter a estabilidade social sob controle. É por isto que as autoridades não tomaram nenhuma providência para reduzir o excesso das reservas”, disse o Dr. Jian.
As autoridades ainda relutam em melhorar as taxas de câmbio, embora a inflação continue aumentando todos os meses. Elas temem o que o lento crescimento econômico pode implicar. Apertam a política monetária para reprimir a inflação, aumentando a taxa de juros e o índice de reserva dos bancos, declarou o Dr. Jian.

O autor e governador da Faculdade de Economia de Londres, Will Hutton, disse ao Sydney Morning Herald que a China é um “barril de pólvora” e que “a revolta na China é só uma questão de tempo”, em artigo datado de 19 de abril.

O artigo cita o Sr. Hutton dizendo que, embora não seja claro quando a China seria afetada por uma revolta popular, o país agora possui um frágil sistema financeiro que poderia levar a tal revolta.

“Você sabe, existe uma regra de ouro para os economistas, o que é insustentável, não se pode alimentar”, declarou o Sr. Hutton sobre o recente aumento de 3 trilhões de dólares das reservas de moeda estrangeira na China.

“Os chineses não podem continuar aumentando as reservas cambiais desta maneira. É uma distorção enorme. Isto está prestes a explodir.”

“O sistema financeiro chinês é várias vezes mais fraco que o americano e o britânico ou como era o sistema bancário do Ocidente antes da queda de 2008. Quer dizer, empresta muitas vezes mais que seu PIB. Em muitos destes empréstimos, os juros não são pagos e não há reposição do capital. Ou seja, é um desastre prestes a acontecer”, citou o artigo do Sydney Morning Herald em que o Sr. Hutton falava com o canal ABC da Austrália.