No Oriente Médio, eleições prematuras atraem instabilidade

16/07/2012 03:00 Atualizado: 16/07/2012 03:00

Trabalhadores eleitorais líbios iniciam o processo de contagem num posto de votação na cidade ocidental de Misrata durante a eleição do Congresso Nacional Geral da Líbia em 7 de julho. (Giovanni Diffidenti/AFP/Getty Images)Embora as eleições e as reformas políticas sejam necessárias na sequência da Primavera Árabe, eleições prematuras poderiam inaugurar um período de contínua instabilidade política pontuado pela violência ou acabar introduzindo novos regimes totalitários que assumam o poder sob o pretexto de manter a ordem e a estabilidade.

De fundamental importância é a formação de governos de transição proporcionalmente representativos de todos os segmentos das populações por um período mínimo de cinco anos.

Tal governo seria encarregado de escrever uma nova Constituição e instituir reformas políticas graduais, enquanto promove os direitos humanos e programas de desenvolvimento econômico. Caso contrário, as eleições deixarão de produzir o resultado desejado de uma nova ordem política e social livre e vibrante.

Na verdade, nenhum país árabe está pronto para profundas reformas políticas sem primeiro desenvolver uma cultura democrática, criar um ambiente que encoraja a formação de partidos políticos e desenvolver uma plataforma política clara, que seja livremente promovida para o público.

Aqui, Egito, Líbia, Iêmen, Iraque e até mesmo a Tunísia oferecem bons exemplos de onde condições internas socioeconômicas e políticas destacam as dificuldades envolvidas.

Para esse efeito, a situação nesses Estados árabe sugere fortemente que a menos que os sete impedimentos seguintes sejam abordados de forma integral, a Primavera Árabe passará a ser o mais cruel inverno, quebrando todas as esperanças prometidas pelos levantes.

1. A corrida por eleições parlamentares

A pressa em realizar eleições invariavelmente favorece os grupos sociais e/ou políticos existentes que são mais organizados, disciplinados e enraizados na sociedade.

No Egito e na Tunísia, a Irmandade Muçulmana islâmica dominou a cena política. No entanto, na Líbia, embora houvesse uma forte possibilidade de que o Grupo Combatente Islâmico da Líbia ganharia, a onda islâmica foi quebrada e a contínua instabilidade política dominará a imatura paisagem política no país.

Generally, the inability of secular and independent parties and those who share similar political orientations to coalesce around a single platform has generally boosted the performance of the Islamists, as the former had neither the time nor the means to organize politically and offer political platforms that are alternatives to the Islamists.

Geralmente, a incapacidade dos partidos seculares e independentes e dos que partilham orientações políticas semelhantes de se aglutinarem em torno de uma única plataforma tem geralmente impulsionado o desempenho dos islamistas, uma vez que o anterior não teve o tempo nem os meios para se organizar politicamente e oferecer plataformas políticas que são alternativas para os islamitas.

2. Proliferação de partidos

Sistemas democráticos fragmentados que usam representação proporcional, que traduzem votos em poder legislativo, costumam ver uma proliferação notável de partidos políticos, o que leva à ruptura inevitável do eleitorado.

Como consequência dos efeitos radicais transformadores da Primavera Árabe, países como Egito, Líbia e Tunísia foram empurrados tanto internamente como de fora para realizar eleições prematuras, independente dos ambientes políticos prevalecentes que existiam antes das revoluções.

Como resultado, dezenas de partidos políticos foram abruptamente formados (81 partidos contestaram nas eleições da Tunísia; mais de 40 estavam ativos nas eleições parlamentares do Egito; e na Líbia, tendo apenas participado em sua primeira e mais recente eleição, havia o exorbitante número de 130 partidos). Esta proliferação de partidos políticos, não só confunde o público, mas também impede um consenso nacional sobre todas as questões importantes estrangeiras e nacionais ou programas.

3. Incapacidade de estabelecer coesão política

Quando a pressa determina a escala e o escopo das campanhas políticas, simplesmente não é possível para plataformas detalhadas se desenvolverem a tempo de lidar com a ladainha dos males sociais que afetam a maior parte, se não toda, a região do Oriente Médio.

Além dos inúmeros partidos políticos que enchem o nascente vácuo político formado pela Primavera Árabe, milhares de candidatos independentes jogaram seus chapéus no ringue eleitoral. O surto de candidatos independentes agravou o nível de fragmentação política e reforçou a natureza desconcertante das sociedades pós-ditadura do Oriente Médio.

A corrida às eleições, por exemplo, deu aos candidatos líbios menos de três semanas para formularem suas plataformas políticas, o que torna extremamente difícil para o público julgar ou compreender plenamente. Consequentemente, os candidatos dificilmente representarão qualquer tipo de eleitorado de modo que cumpra com as aspirações políticas dos jovens e das partes mais seculares do eleitorado.

4. Sem cultura pela democracia e reforma

Independente do momento das eleições, o discurso por aspirações democráticas é totalmente prematuro em sociedades que nunca experimentaram uma cultura de democracia e de reforma.

Desde sua criação, na sequência da 1ª e da 2ª Guerras Mundiais no início do século 20, todos os Estados árabes foram conduzidos por regimes autoritários que têm inibido a expressão democrática e atrofiado o desenvolvimento econômico para a maioria de suas populações.

A Primavera Árabe repudiou a velha ordem numa velocidade e escala impressionante, mas isso não significa que as reformas políticas podem ou devem ser estabelecidas na mesma velocidade. Uma vez que muitos desses países nunca tiveram qualquer experiência com a democracia verdadeira, realizar eleições imediatas já prejudicou o processo democrático e impediu as aspirações dos que desejavam desempenhar um papel na renovação política do seu país.

5. Papel dos militares

Nos países que têm um aparato de segurança enraizado (o “Estado profundo”, como é conhecido no Egito), os resultados das eleições serão inúteis a menos que sejam feitos esforços para subordinar à autoridade civil várias agências governamentais críticas, incluindo os serviços militares, a inteligência, os Ministérios do Interior e da polícia secreta.

Independente dos resultados eleitorais, os militares em países como o Egito (e talvez em breve na Síria) manterão o controle crucial sobre o novo sistema político, a fim de evitarem renunciar seu desmedido poder.

A preocupação fundamental para figuras militares é manter a palavra final sobre a segurança nacional e as principais questões de política externa e, no caso do Egito, para também garantir seu império econômico.

6. Resistência violenta contínua

Muitos dos diversos partidos e atores que surgiram nas florescentes democracias do Oriente Médio continuam a recorrer à resistência militante diante da intransigência das autoridades centrais, militares ou não.

A Praça Tahrir continua a ser preenchida com os amigos e inimigos da Irmandade Muçulmana, além das autoridades militares governantes.

Apesar das recentes eleições, milícias armadas continuam a correr desenfreadas na Líbia, exercendo controle sobre muitas partes do território nacional.

A Síria está enfrentando o cenário oposto enquanto a autoridade central continua a empregar meios brutais para manter o poder. Uma vez que a remoção de Assad se tornou central para o surgimento de uma nova ordem política, pode se esperar que a carnificina na Síria se espalhe ainda mais enquanto o regime luta por sua sobrevivência.

7. Falta de consenso em torno da natureza da reforma

Na realização de eleições imediatamente após uma revolução social, parece não haver consenso sobre uma nova Constituição e as reformas democráticas que devem ser promulgadas.

Isso transformou os processos eleitorais no Egito, Tunísia e Líbia em corridas de cavalos dos conselhos nacionais, das autoridades de transição e dos comandantes militares. Os vários tipos de regime democrático que podem ser implantados devem rejeitar eleições rápidas e as diversas sociedades sectárias encontradas no Oriente Médio devem ser reconciliadas com as premissas elementares de liberdades políticas e humanas.

Na verdade, a natureza tribal da Líbia, por exemplo, engendrou um debate entre adotar o federalismo sobre a descentralização, este último claramente favorece comunidades tribais e a preferência na Líbia pelo sistema federalista poderia exacerbar tensos conflitos étnicos e tribais pré-existentes.

Independente de quão bem-tratadas estas reformas sejam e quanto tempo eles possam levar, as reformas políticas, em si, são insuficientes, a menos que acompanhadas de programas sustentáveis de desenvolvimento econômico, que eu abordarei num artigo posterior.

O público não quer apenas liberdade, eles querem comida, emprego, saúde, educação e um futuro promissor. Reformas democráticas genuínas levarão décadas para evoluir. Cedo ou tarde, nenhum Estado árabe escapará de uma mudança política significativa. No entanto, a corrida às eleições, não apoia uma mudança permanente e faz uma paródia dos ideais democráticos pelos quais muitos morreram.

Alon Ben-Meir é um professor de relações internacionais do Centro para Assuntos Globais na NYU. Ele leciona cursos de negociação internacional e estudos do Oriente Médio. alon@alonben-meir.com