Facção linha-dura perde terreno após a queda de Bo Xilai
A corrupção endêmica na China pode ser denunciada por todas as facções rivais dentro do Partido Comunista Chinês (PCC), mas como essas facções decidem lidar com isso é muito diferente. Agora, o impasse virtual dentro do Partido que impedia qualquer ação substancial foi desfeito por acontecimentos dramáticos em Chongqing, e os reformistas parecem preparados para avançar.
Recentemente, três membros veteranos aposentados do PCC expressaram seu apoio a uma iniciativa um tanto ousada que o secretário Wang Yang do PCC em Guangdong já discutiu para implementar em sua província: a divulgação dos bens dos oficiais públicos e membros do Partido.
Os militares aposentados fizeram sua primeira sugestão numa carta enviada ao Partido Central em meados de fevereiro. Porque os líderes do Partido não responderam, os três decidiram tornar sua carta pública em 17 de maio, mediante publicação na internet.
Divulgar os bens atinge a raiz da corrupção financeira que vê oficiais e membros do PCC usarem seus cargos para construir impérios pessoais enquanto enviam fortunas ao exterior no caso de problemas irromperem em casa.
Os militares aposentados insistiram que a divulgação deve ocorrer antes do 18º Congresso do Partido, previsto para ocorrer em outubro. Nessa reunião, sete dos nove membros do Comitê Permanente do Politburo, o pequeno grupo de nove membros que governa o PCC e muitos dos outros 350 ou mais membros do Comitê Central serão substituídos.
Reformistas veteranos pedem transparência
Os três veteranos, Ma Xiaoli, Ren Xiaobin e Cui Wunian, são conhecidos como reformistas liberais. Dois deles foram expulsos na sequência do Massacre da Praça da Paz Celestial (Tiananmen). Todos ocuparam altos cargos no PCC, com Ma tendo sido secretário do PCC na província de Shaanxi.
A carta sugere que os candidatos à liderança devem divulgar seus dados pessoais e os bens de família para entidades diversas do Partido, incluindo a Comissão Central de Inspeção Disciplinar (CCID).
Junto com a carta exigindo transparência, os veteranos publicaram um comentário sobre o escândalo que virou o Partido de cabeça para baixo: A tentativa de deserção do ex-chefe de polícia de Chongqing, Wang Lijun; a queda subsequente do ex-secretário do Partido em Chongqing, Bo Xilai; e a posterior investigação do czar da segurança doméstica chinesa Zhou Yongkang.
“Este incidente chocou particularmente um vasto número de membros comuns do Partido”, dizia a carta, referindo-se ao que veio a ser conhecido como o incidente de Chongqing. “Acabar completamente com a corrupção, e começar pela erradicação da corrupção na liderança do Partido, tornou-se uma tarefa urgente que não pode ser adiada. Dezenas de milhões de olhos estão fixos no 18º Congresso do Partido”, continuou a carta.
Veteranos conservadores perdem terreno
Enquanto reformistas veteranos como Ma veem a transparência como fundamental para enfrentar a corrupção, veteranos linha-dura, uma vez leais ao Bo, viram seu esforço de renovar o zelo maoísta em Chongqing como outra solução. Para eles, a corrupção é um retorno à opulência que o PCC supostamente purgou ao chegar ao poder na China há 60 anos.
“Trinta anos de abertura e reforma conseguiram notáveis realizações econômicas, mas essas conquistas brilhantes foram seguidas pela polarização de classes, corrupção desenfreada, um vácuo espiritual público, pensamento caótico, declínio moral, prostituição, drogas, tríades, e assim por diante”, disse Hu Muying, o presidente da Sociedade dos Filhos de Yan’an, num discurso em fevereiro, pouco antes de Wang Lijun fazer sua tentativa de deserção. “Esses males que foram exterminados na fundação da Nova China têm retornado e podem até ter piorado”, disse ela.
Yan’an era a fortaleza do PCC no oeste da China antes dele ganhar o poder ao derrotar o Partido Nacionalista, e a maioria dos Filhos da Sociedade de Yan’an nasceram lá. O pai de Hu Muying foi um redator de discursos para Mao Tsé-tung e Deng Xiaoping. Um ano antes, o grupo de Hu Muying divulgava os esforços de Bo contra a corrupção em Chongqing como um caminho a seguir.
Além de tentar reviver o fervor de massa no estilo da Revolução Cultural pela ideologia do PCC, Bo também liderou uma sangrenta repressão contra a corrupção e a máfia, que os críticos dizem ter sido na verdade uma forma de corrupção, a campanha visava igualmente adversários políticos e empresas legítimas com bens invejáveis.
Numa recente reunião de altos oficiais, incluindo o líder do PCC, Hu Jintao, e o primeiro-ministro Wen Jiabao, uma série de acusações foi levantada contra Bo, incluindo assassinato e o planejamento de um golpe contra Xi Jinping, o suposto sucessor de Hu Jintao.
Na mesma reunião, Hu apoiou o pedido de Wen de fazer a CCID investigar Zhou, que já foi destituído de seu controle sobre a segurança pública do regime chinês e os aparatos da vigilância doméstica.
Com Bo e suas ações anteriores agora sob intenso escrutínio, a solução escolhida da facção linha-dura pela corrupção parece ter sido interrompida antes que pudesse se espalhar para além de Chongqing.
Isso faz as reformas, como a divulgação dos bens apoiada por Wang Yang e pelos três veteranos, terem maior chance.
Wang Yang também parece um provável candidato a integrar o Comitê Permanente do Politburo, possivelmente assumindo o manto de Wen como o principal defensor das reformas. Antes de sua queda, Bo também era um candidato ao Comitê Permanente, previsto para ocupar o manto de Zhou como o proponente líder dos comunistas ferrenhos.
Ambos de Bo e Zhou serem figuras líderes da facção das mãos sangrentas, eles foram oficiais do PCC promovidos pelo ex-líder Jiang Zemin, a fim de implementar a perseguição ao Falun Gong. Sua perda de poder significa que o obstáculo mais importante para a reforma na China, a campanha em curso contra a prática espiritual do Falun Gong, está perdendo seu apoio dentro do Partido.
O Diário do Povo pede por reforma
A carta dos três veteranos do PCC clamando pelo fim da corrupção não chega a pedir a reforma política. O jornal porta-voz do PCC, o Diário do Povo, tem se manifestado recentemente em favor da reforma.
Ele publicou um artigo de página inteira em 17 de maio com o título, “Membros dirigentes devem ‘pavimentar a estrada’ para os sucessores antes de deixar o cargo”. “Se eles pensam que, uma vez que estão prestes a completar seus mandatos, devem apenas deixar que as coisas sigam seu curso natural, colocar seus ideais de lado, e tornar-se passivos e inativos […] então eles não estão apenas colocando seus ideais de lado, eles também estão colocando os assuntos do Partido e do povo de lado”, diz o artigo.
O artigo disse que os líderes atuais devem compartilhar suas experiências com os sucessores para prepará-los para lidar com questões fundamentais relacionadas com tarefas incompletas e difíceis.
Um artigo de 14 de maio no mesmo jornal declarou que isso já estava acontecendo com uma manchete que dizia, “Reestruturação do governo avança de forma regular”.
Em 18 de maio, o jornal publicou uma série de artigos pedindo que as mudanças fossem intensificadas. Na história do PCC, tem sido raro para uma reforma política ser amplamente reportada duas vezes numa semana. Especialistas dizem que o Partido está pedindo a Hu e Wen para realizarem reformas intensas no governo antes de saírem.
Shi Zangshan, um especialista em China baseado em Washington DC, diz que os artigos refletem uma chamada para a mudança de dentro do Partido. “Pela aparência do Diário do Povo no dia 17, podemos ver claramente que alguns indivíduos da liderança do Partido estão exigindo que Hu e Wen realizem oficialmente reformas no governo antes de saírem”, disse ele. “Parece que a demanda por reforma do governo hoje é extremamente forte.”
Shi observou que um documento vazado indica que os líderes principais do Partido estão preparados para fazer quatro mudanças sísmicas na China, incluindo a formação de um comitê que escreverá uma nova Constituição, a reparação do Massacre da Praça Tiananmen e da perseguição ao Falun Gong, o fim do PCC como o Partido dominante, e a nacionalização dos militares, significando que o governo e não o Partido controlaria as forças armadas.
“Muitos fenômenos atuais podem ser uma preparação para estas ações”, disse Shi.
Quando o ex-chefe de polícia de Chongqing, Wang Lijun, fugiu para o consulado dos EUA em Chengdu em 6 de fevereiro, ele colocou em movimento uma tempestade política que não tem amenizado. A batalha nos bastidores gira em torno da postura tomada pelos oficiais em relação à perseguição ao Falun Gong. A facção das mãos ensanguentadas, composta pelos oficiais que o ex-líder chinês Jiang Zemin promoveu para realizarem a perseguição ao Falun Gong, tenta evitar ser responsabilizada por seus crimes e continuar a campanha genocida. Outros oficiais têm se recusado a continuar a participar da perseguição. Esses eventos apresentam uma escolha clara para os oficiais e cidadãos chineses, bem como para as pessoas em todo o mundo: apoiar ou opor-se à perseguição ao Falun Gong. A história registrará a escolha de cada pessoa.