‘Mulher mais perigosa da China’ sabe como a banda toca

29/10/2013 15:00 Atualizado: 05/11/2013 22:12

Uma das mulheres mais poderosas da China, a empresária da mídia Hu Shuli, tem desempenhado um papel de apoio fundamental na campanha anticorrupção do líder chinês Xi Jinping desde o início deste ano.

A revista liberal que ela fundou, a Caixin, tem atuado como um cata-vento da direção política imprimida pela atual liderança do Partido Comunista Chinês (PCC), com reportagens investigativas longas e detalhadas que pressagiam regularmente as ações vigorosas das autoridades comunistas contra oficiais e facções centralizados na alça de mira da nova campanha. De ainda maior destaque têm sido as reportagens da Caixin sobre a limpeza completa de funcionários da indústria do petróleo, especialmente, na gigante estatal Corporação Nacional de Petróleo da China (CNPC).

Laços com a liderança

Hu Shuli foi apelidada de “a mulher mais perigosa na China” pelo BusinessWeek; na época ela era editora-chefe da revista Caijing, que ela fundou em 1998. Depois de 11 anos e, em meio a polêmicas, ela deixou o cargo para fundar a Caixin Media Company em 2009.

Hu foi listada entre as 100 pessoas mais influentes de 2011 pela revista Time e foi chamada de a comentarista mais poderosa da China pelo Financial Times em 2006.

Ela também tem laços estreitos com o líder chinês Xi Jinping e com Wang Qishan, o chefe do Comitê Central de Inspeção Disciplinar, a agência do PCC que investiga e pune funcionários corruptos, segundo um artigo da revista ‘New Way Monthly’ de Hong Kong.

Os laços de Hu com Xi podem ser datados de 1985, quando Xi foi vice-prefeito de Xiamen, na província de Fujian, e Hu era uma repórter estacionada na mesma cidade, disse o artigo.

Depois que Hu deixou a Caijing, ela rapidamente começou uma nova empresa para publicar uma revista quinzenal de notícias, que recebeu o apoio do então secretário do PCC em Zhejiang, Xi Jinping, e do jornal provincial do PCC, o Diário de Zhejiang, segundo o artigo.

Hu conhece Wang Qishan desde 1988, quando Wang era chefe da ‘China International Trust & Investment Corporation’, disse o artigo.

De acordo com uma reportagem da Asia Weekly em 2009, Wang entrou em cena como mediador quando Hu decidiu deixar a Caijing e, posteriormente, com o apoio de Wang, a revista ‘China Reform’ se tornou uma nova adição à recém-formada Caixin Media Company de Hu.

Capturando ‘tigres’ corruptos

A reportagem de capa da revista Caixin em 9 de setembro era intitulada “Reprimindo a corrupção e capturando tigres corruptos” e dava ampla cobertura à prisão de quatro executivos da CNPC e de seu ex-chefe Jiang Jiemin.

A maioria dos analistas concordou que um ex-membro do Politburo, Zhou Yongkang, que foi chefe da CNPC entre 1996-1998, é o “tigre” à solta. O termo é usado para se referir a poderosos oficiais corruptos. Um informe do WikiLeaks em 2009 disse que o setor de petróleo da China era controlado por Zhou e seus associados.

Em 25 de setembro, a Caixin publicou outro artigo, que foi logo censurado. Ele expunha os movimentos da esposa e dos sogros de Zhou Bin, o filho de Zhou Yongkang, nos Estados Unidos. E também dizia que Zhou Bin tinha sido presidente da ‘Zhongxu Yangguang Energy & Technology Ltd. Corp’, uma empresa baseada em Pequim cuja maior cliente era a CNPC.

Várias mídias chinesas no estrangeiro disseram que as autoridades chinesas já tinham posto Zhou Bin sob custódia. O artigo da Caixin disse que Zhou Bin voltou a Pequim do estrangeiro, implicando que ele está em prisão domiciliar.

Hu, o cata-vento

Por causa dos laços de Hu Shuli com líderes de alto escalão do PCC, a maioria dos analistas acredita que os movimentos da Caixin foram coordenados com outros desenvolvimentos na campanha anticorrupção.

O artigo da New Way Monthly disse que artigos como os de Hu são publicados com a autorização tácita da liderança do PCC e com a aprovação do Departamento Central de Propaganda, que mantém a mídia chinesa numa coleira apertada. Os artigos também sugerem um padrão do regime chinês, a manipulação da opinião pública antes de derrubar um alto oficial.

Avanços e recuos

No final de janeiro deste ano, Xi Jinping disse que o PCC precisa combater os “tigres” da corrupção, bem como as “moscas”. Pouco depois, Wang Qishan apresentou quatro grandes casos ao Comitê Central, incluindo casos contra dois membros da última formação do Politburo chinês, segundo um artigo de Gao Yu, um repórter sênior e comentarista em Pequim.

Mas os quatro casos encontraram forte resistência de seniores do PCC, incluindo o ex-membro do Politburo, Zeng Qinghong, e o ex-líder chinês Jiang Zemin. Xi Jinping e Wang Qishan, portanto, tiveram de engavetar o plano de “combater os tigres”, disse Gao Yu.

Fontes disseram a Gao que nas reuniões de Beidaihe em agosto, Xi Jinping focou-se na anticorrupção e em casos específicos que o Comitê Central estava preparando. Após retornar a Pequim, Xi Jinping disse que, devido a circunstâncias especiais, Wang Qishan precisaria da “espada shangfang”, referindo-se a uma espada imperial usada para executar malfeitores. “Temos que ter coragem quando se trata da anticorrupção e devemos chegar ao fundo da questão, independentemente de quem estamos investigando”, acrescentou Xi Jinping.

Fontes também disseram a Gao Yu que a proposta de Xi Jinping já foi adotada numa resolução do Comitê Permanente do Politburo. Em 28 de agosto, o Politburo aprovou um plano de cinco anos para o combate à corrupção, disse um artigo do Caixin.

Corrupção e purgação

No Partido Comunista, no entanto, o combate à corrupção é frequentemente o nome dado ao que na realidade são expurgos políticos que visam eliminar inimigos e instalar partidários em posições-chave no poder.

Sob este ponto de vista, Zhou Yongkang seria um alvo adequado por sua aliança com o ex-líder Jiang Zemin e por suas relações com Bo Xilai, um ex-membro do Politburo que foi deposto e está atualmente cumprindo pena por corrupção.

Segundo a mídia chinesa no estrangeiro Mingjing News, Zhou Yongkang agora tem liberdade limitada, porque está sob investigação do Comitê Central de Inspeção Disciplinar. Xi Jinping ainda está estudando o assunto e não assinou o documento que colocaria Zhou em “shuanggui”, um tipo de detenção e interrogatório no estilo soviético para oficiais do Partido Comunista, informou a Mingjing.

A purgação dos interesses de Zhou no setor de petróleo, enquanto parece eliminar essa malversação de renda, pode ser apenas um ardil para instalar os próprios partidários de Xi Jinping, segundo He Qinglian, um economista chinês e analista político. “O máximo que eles podem fazer é nomear e destituir os principais executivos das empresas estatais. Mas isso não mudará o padrão de interesses que mantem o país como refém.”