Morte de um poeta no Irã, direitos na forca

18/02/2014 16:27 Atualizado: 18/02/2014 16:30

“Tentei defender o direito legítimo que cada povo neste mundo deve ter, o direito de viver livremente com plenos direitos civis. Com todas estas misérias e tragédias, eu nunca usei uma arma para combater estes crimes atrozes exceto a caneta”, escreveu Hashem Shaabani, um jovem poeta árabe ahwazi iraniano de uma prisão no Irã. Em 27 de janeiro de 2014, ele foi enforcado juntamente com outros 14 presos, acusados de “travar guerra contra Deus”.

A Radio Free Europe (RFE) informou que ele foi condenado por um Tribunal Revolucionário Islâmico. O destino de Shaabani foi compartilhado por dezenas de assassinatos de ahwazis, muitos deles sob acusações forjadas. Houve manifestações no Irã contra a discriminação do governo iraniano contra sua minoria árabe, particularmente em matéria de emprego, habitação e direitos civis e políticos básicos.

A repressão contra ahwazis tem sido brutal. Este fato tem sido denunciado repetidamente pela Human Rights Watch, que pediu às autoridades iranianas que permita à mídia internacional independente e organizações de direitos humanos o acesso para investigar as alegações de graves violações dos direitos na província de Cuzistão. O Cuzistão, onde a maioria dos árabes ahwazi vive no Irã, está localizado no Sudoeste do país e é rico em petróleo e gás.

O governo iraniano discrimina quem não é persa, disse Taha Amjad, um porta-voz da Organização Europeia-Ahwazi de Direitos Humanos (EAHRO), sediada em Londres. Ele diz que, embora o Cuzistão seja rico em petróleo e gás, seu povo está entre os mais pobres do país, e têm baixíssimos níveis de alfabetização.

Joe Stork, vice-diretor para Oriente Médio da Human Rights Watch, afirma: “O alto número de detenções e assassinatos relatados na província de Cuzistão nos últimos anos, combinado com o blecaute de informações, sugere que o governo tem coisas terríveis que ele quer esconder. A simples justiça exige que as autoridades permitam investigações independentes e transparentes sobre o destino dos detidos e as alegações de tortura.” No dia 5 de fevereiro, a Freedom House, uma organização de direitos humanos, informou que Shaabani foi submetido à tortura intensa e interrogatório na prisão.

O presidente iraniano, Hassan Rouhani não foi capaz de impedir as execuções desde que assumiu o cargo. Ahmed Shaheed, relator-especial das Nações Unidas sobre a situação dos direitos humanos no Irã, e Christof Heyns, o relator-especial da ONU sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, pediu ao governo iraniano em janeiro para parar o aumento do número de enforcamentos no país.

Ambos os especialistas afirmam que pelo menos 40 pessoas foram enforcadas nas duas primeiras semanas de janeiro. Em 2013, 625 pessoas foram executadas no Irã, incluindo 29 mulheres e vários presos políticos. Eles foram acusados de ‘moharebeh’, ou “travar guerra contra Deus”, o que muitos consideram uma acusação política travestida de ofensa religiosa.

Este é o argumento que a República Islâmica do Irã usa para purgar os dissidentes políticos, minorias étnicas e religiosas, e todos aqueles que são identificados como opositores do regime. A este respeito, Heyns declarou: “É profundamente preocupante que o governo prossiga com as execuções por crimes que não atendem os critérios de ‘crimes mais graves’, como exigido pelo direito internacional, e que sérias preocupações subsistam sobre os direitos ao devido processo legal.”

Amir Taheri, um jornalista iraniano famoso, foi o primeiro a informar sobre a execução de Shaabani. De acordo com Taheri, ele não é o primeiro poeta a ser assassinado pelos mulás do Irã. Ele escreveu que o ex-presidente Hashemi Rafsanjani tinha eliminado mais de uma dúzia de escritores e poetas.

Ele também afirmou que a pior onda de assassinatos ocorreu sob o ex-presidente iraniano Mohammad Khatami, que ordenou a execução de mais de 80 intelectuais iranianos, incluindo os poetas Mohammad Mokhtari e Muhammad- Ja’far Pouyandeh. Esses poetas provavelmente estavam na mente de Shaabani quando ele escreveu ensaios críticos sobre o tratamento das minorias no Irã, incluindo os “crimes hediondos contra ahwazis perpetrados pelas autoridades iranianas”.

Que o governo iraniano tenha sido incapaz de aceitar as críticas de Shaabani diz muito sobre o estado dos direitos humanos no Irã. É um momento triste quando o Irã, berço de grandes e respeitados escritores e intelectuais da humanidade, decide matar seus próprios poetas.

O Dr. César Chelala é vencedor de prêmio “Overseas Press Club of America” e especialista e conselheiro de políticas públicas