Morte cerebral: parâmetro questionável para o transplante de órgãos

10/09/2014 06:00 Atualizado: 07/09/2014 16:44

Você sabia que, para poder retirar os órgãos, o “morto” frequentemente deve estar… anestesiado? Pois é, essa é uma realidade que é raramente revelada aos doadores e a sua família. Isso não quer dizer que não se deve fazer a doação de órgãos, pelo contrário, mas é importante não faze-la cegamente.

Para poderem ser transplantados, os órgãos precisam estar frescos. O coração de uma pessoa morta depois de uns cinco minutos está inutilizável: ele nunca mais baterá, mesmo com um marcapasso (aparelho que dá estímulos elétricos para estimular as pulsações). E é o mesmo com outros órgãos vitais (rins, fígado, pâncreas, pulmões, etc).

Para que os órgãos estejam bem frescos, é preciso que eles estejam ainda funcionando no momento em que são retirados. Por isso, eles não podem ser retirados de um “morto” realmente morto, mas somente de uma pessoa em estado de “morte cerebral”, o que, como veremos, é bem diferente de se estar realmente morto.

De volta da morada dos mortos

O jornal inglês Daily Mail publicou a história de um jovem britânico que teve sua vida salva por seu pai que era contrário a ter seus próprios órgãos retirados para servirem de transplantes.

O caso ocorreu no Hospital Universitário de Coventry, no norte da Inglaterra: Stephen Thorpe, de 17 anos, foi ferido gravemente na cabeça em um acidente de carro, no qual resultou a morte de seu amigo, Matthieu, de 18 anos, que conduzia o veículo.

Os médicos o colocaram em coma artificial e, dois dias mais tarde, o declararam em estado de “morte cerebral”.  A “morte cerebral” permite o começo do procedimento de remoção de órgãos, mas os pais de Stephen, que estavam com ele, afirmaram que eles sentiam que seu filho ainda estava lá e “que ele reagia a certas palavras”.

Enquanto quatro médicos do hospital confirmaram a “morte cerebral” e desejavam o começo da remoção de órgãos, os pais de Stephen chamaram a Doutora Julia Piper, praticante de medicinas tradicionais e alternativas. Ela obteve a autorização dos médicos do hospital para que um neurocirurgião de sua confiança examinasse Stephen. Ele concluiu que o jovem com certeza não estava “cerebralmente morto”.

Solicitaram que o jovem fosse tirado de seu coma artificial o mais rápido possível. E, de fato, cinco semanas mais tarde, Stephen voltou para casa, totalmente reabilitado. Hoje Steven tem 21 anos e estuda contabilidade na Universidade de Leicester. “Minha impressão é que o hospital não era muito favorável ao fato de meu pai solicitar uma segunda opinião médica”, disse ele ao Daily Mail.

Não confundir “morto” e “morte cerebral”

O conceito de “morte cerebral” foi inventado em 1968. Até lá, nós só conhecíamos dois estados: vivo e morto.

Uma pessoa estava viva enquanto seu corpo ainda estivesse quente, seu coração batesse, enquanto respirasse e seu sangue continuasse a circular.

A morte, entretanto, era declarada quando a vida teria deixado o corpo. Um corpo morto, no sentido tradicional, torna-se frio e rígido. Ele não responde mais a nenhum estímulo. O coração não bate mais, a tensão arterial dispara. O paciente para de respirar. A pele, as unhas e mucosas assumem uma coloração azul. Colocar o cadáver sob respiração artificial não lhe dá oxigenação ao corpo. Estimular seu coração por impulsos elétricos (marcapasso) não o faz voltar a bater.

Uma pessoa morta simplesmente não pode mais se curar. Seus órgãos vitais, o coração, o fígado, os pulmões, os rins e o pâncreas não funcionam mais. Nós não podemos os transplantar em uma pessoa viva, pois eles começam a se decompor assim que a oxigenação e a circulação sanguínea para. Cinco minutos mais tarde, estão inutilizáveis.

Para poder retirar órgãos ainda vivos, capazes então de serem transplantados em uma nova pessoa, os médicos criaram em 1968 o conceito de “morte cerebral”. Uma pessoa cujo coração funciona, o sangue circula e a respiração é regular pode então hoje ser declarada como estando em “morte cerebral”. Nós sabemos, no entanto, que, nesse caso, a maior parte das funções cerebrais continuam, incluindo a digestão, a excreção (eliminação de resíduos) e o balanço hídrico.

Se há lesões, descobriremos que a “morte cerebral” cicatriza, e se é uma criança, que ela continua a crescer. Podemos até mesmo atravessar a puberdade. Uma mulher grávida em estado de “morte cerebral” pode continuar a carregar seu filho: o mais longo período registrado foi de 107 dias até o parto. No entanto, uma vez que seus órgãos vitais forem retirados para serem transplantados a uma outra pessoa, o “doador” de órgãos morre para sempre.

Para retirar os órgãos, o “morto” primeiro deve ser anestesiado

Frequentemente a pessoa em estado de “morte cerebral” é sensível às operações cirúrgicas. Isto é o que os médicos chamam de efeito Lázaro, o nome do homem que, nos Evangelhos, saiu de sua tumba.

Para poder retirar os órgãos vitais, os médicos devem então praticar a anestesia ou injetar substâncias paralisantes para evitar espasmos musculares ou mudanças brutais de pressão sanguínea, de ritmo cardíaco e outros reflexos protetores.

Na prática médica normal, tais reações na pessoa operada indicam ao anestesista que a anestesia está leve demais ou que o paciente sofre.

Essas informações, como qualquer médico poderá lhe confirmar, são infelizmente pouco conhecidas pelo grande público. Parece também que as famílias às quais se solicita a autorização para remoção de órgãos infelizmente não são sempre informadas objetivamente.

Stephen não é um caso isolado

Existem dezenas de casos similares ao de Stephen, nos quais uma pessoa em coma ou inconsciente é declarada em estado de “morte cerebral” ou “sem esperança de cura”. Frequentemente as famílias são submetidas a pressões para autorizar a remoção de órgãos. Em 2011, o Hospital Sainte-Croix de Drummondville (no Quebec) solicitou a autorização para extrair os olhos de uma paciente que tinha sido estrangulada durante sua refeição no hospital na ausência de médicos, afirmando que ela estava em estado de “morte cerebral”. Depois que a família pediu provas para o médico, a paciente acordou e recuperou a maior parte de suas faculdades.

Em 2008, um francês de 45 anos acordou na mesa de operação enquanto os médicos o preparavam para a remoção de órgãos, após uma parada cardíaca. Durante a investigação conduzida pelo “comitê de ética”, vários médicos reconheceram que esse tipo de caso, embora raro, lhes era perfeitamente conhecido.

No mesmo ano, Sack Dunlap, um americano de 21 anos, “cerebralmente morto”, estava prestes a ter seus órgãos retirados quando suas duas irmãs, duas enfermeiras, decidiram verificar se ele estava de fato “cerebralmente morto”. Discretamente, elas forçaram um ponto sob sua unha do pé, o que provocou uma forte reação de Dunlap, provando que ele ainda estava consciente. Ele se recuperou e declarou mais tarde que estava consciente e que escutava os médicos ao seu redor discutir sobre os órgãos que iriam remover!

Então, tanto nesse setor como em outros, caro leitor, lembre-se de que se trata de sua vida, de sua saúde, e nunca da vida dos médicos, nem das pessoas que lhe aconselham, apesar da melhor das intenções.

Epoch Times

1 The Daily Mail, 24 de Abril de 2012 : http://www.dailymail.co.uk/health/article-2134346/Steven-Thorpe-Teenager-declared-brain-dead-FOUR-doctors-makes-miracle-recovery.html?printingPage=true
2 http://www.journalexpress.ca/Société/Santé/2011-06-30/article-2624757/Un-mal-de-dent-qui-a-failli-virer-en-don-dorganes/1
3 Artigo publicado em Le Monde http://actuagencebiomed.blogspot.fr/2008/06/le-donneur-dorganes-ntait-pas-mort.html