O Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, iniciou nesta segunda-feira (28) uma viagem pela América Latina, com primeira parada em Cuba. Depois segue para Nicarágua, Peru e Chile. Lavrov se encontrou com o presidente cubano Raúl Castro e com o Ministro das Relações Exteriores, Bruno Rodríguez Parrilla, segundo um correspondente da Telesur na Rússia. A visita termina hoje.
Segundo a informação, Lavrov também se reunirá com o presidente peruano Ollanta Humala e sua colega Eda Rivas, ministra das relações exteriores, para “celebrar os 45 anos de amizade entre os dois países e rever a agenda mútua sobre matérias de colaboração técnico-militar e assuntos relacionados a educação, saúde, ciência e tecnologia, entre outros”. O correspondente adianta que o encontro vai fomentar “a crescente relação econômica, estudando incontáveis iniciativas comerciais e de investimentos, incluindo o plano peruano para celebrar um Acordo de Livre Comércio”.
Em comunicado sobre a turnê, Moscou afirmou que a crescente colaboração bilateral com Cuba se baseia na coincidência de posições a respeito dos principais problemas internacionais e regionais. Além disso, acrescenta o comunicado, o ministro do Exterior “agradecerá pessoalmente” aos governos de Cuba e da Nicarágua por ter votado contra a resolução da ONU em março passado sobre a integridade territorial da Ucrânia, aprovada no dia 27 de março, após as ações de Moscou na Crimeia.
A resolução invalidou o chamado referendo da independência realizado em 16 de março na Crimeia como base para qualquer alteração do estatuto da República Autônoma ou da cidade de Sebastopol. A península foi anexada à Rússa em 18 de março apesar dos protestos de Kiev e do Ocidente. Os países latino-americanos que votaram favorável à resolução foram Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Panamá e Peru. Os contrários foram Bolívia, Cuba, Nicarágua e Venezuela. O Brasil se absteve.
Nos últimos anos, a Rússia tem mostrado um interesse crescente em expandir sua influência na América Latina, principalmente nos países pertencentes à Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC). A CELAC foi fundada em 2010 como uma “alternativa” à Organização dos Estados Americanos (OEA), administrado desde Washington. Neste sentido, uma viagem do ministro das Relações Exteriores da Rússia para a região não deveria surpreender ninguém. O que é surpreendente para analistas é que, segundo eles, o momento é inoportuno para que Moscou agradeça presencialmente a seus aliados latino-americanos pelo apoio e colaboração.
Guerra da Ucrânia
“É notório que se trata de um recado para os Estados Unidos com uma alusão clara ao que acontece atualmente com a Ucrânia”, escreveu o jornalista Famil Ismailov, correspondente da BBC na Rússia. “A mensagem para Washington é: ‘Você vem até minhas fronteiras, eu também posso me aproximar de suas fronteiras.” De acordo com o jornalista, a Rússia jamais acolheu positivamente os planos da OTAN de expandir-se para o leste, até a Ucrânia e Geórgia. Em 2008, o então presidente da Rússia, Dmitry Medvedev, disse: “Nenhum país ficaria contente se um destacamento militar estranho se aproximasse de suas fronteiras.”
“Moscou sempre disse que as ações na Ucrânia foram causadas porque a OTAN se aproximou demais das fronteiras com a Rússia, algo considerado pelo país como inaceitável”, lembrou Ismailov. “Agora, a Rússia está fazendo o mesmo com Washington. Está mostrando que também tem a capacidade de se aproximar das fronteiras dos Estados Unidos. E talvez até queira lembrá-lo do que aconteceu em 1960, quando houve a chamada Crise dos Mísseis de Cuba (quando os EUA encontraram bases de mísseis nucleares soviéticos em território cubano)”, acrescentou.
A viagem de Lavrov teve início no mesmo dia em que os EUA e a União Europeia lançam outra lista de sanções contra Moscou pelo que eles chamam de “sua incapacidade de acabar com o tumulto no leste da Ucrânia.”
Simbólica ou não, é provável que Washington esteja seguindo muito de perto os passos da Rússia na América Latina, diz o analista Carl Meacham, diretor para as Américas do Centro de Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS), ouvido pela BBC. “Os acontecimentos podem representar represálias simbólicas e temporárias contra o envolvimento dos EUA na Ucrânia, ou podem ser medidas reais no sentido de uma mudança estratégica global”, afirma Meacham.
“Mas de qualquer forma, é imperativo reconhecer o contexto em que esses eventos estão ocorrendo, em especial a natureza das relações russo-latino-americanas desde o fim da Guerra Fria, para que possamos compreender melhor as implicações potenciais para os interesses dos Estados Unidos na região”, diz o especialista.