O governo da Colômbia tem registradas, de 1990 até agosto de 2013, 10.445 vítimas de minas terrestres enterradas pelas guerrilhas e grupos criminosos. Os artefatos são usados como arma de guerra, para proteger acampamentos, e também para impedir o acesso às áreas de cultivo de coca e de maconha. A cidade de San Carlos foi a primeira na Colômbia a ser declarada livre de suspeita de minas.
A Colômbia é considerada o segundo país com maior número de minas terrestres do mundo, atrás do Afeganistão. O programa Caminhos da Reportagem da TV Brasil conferiu o impacto da retirada das minas da cidade. O trabalho foi desenvolvido ao longo de quatro anos – entre 2008 e 2012 -, pelo Batalhão de Desminagem Humanitária do Exército do país e um grupo de monitoramento da Organização dos Estados Americanos (OEA), composto por militares brasileiros.
A desminagem é executada por um batalhão especial do Exército colombiano. O ex-prefeito da cidade, Francisco Xavier, explicou que a população recuperou a confiança e pode regressar a suas terras na zona rural. “A vida das pessoas voltou à normalidade. As escolas, que antes eram mantidas fechadas sob o risco de contaminação ( nome usado para a presença das minas em território) por minas, foram reabertas e as comunidades puderam regressar ao seu lugar de origem”, disse Xavier.
O agricultor Rogério Antônio, 54 anos, aproveita o domingo com os filhos no pátio da escola municipal da Vereda Chocó, na zona rural de San Carlos. Ele teve que abandonar a região por causa da presença de paramilitares, entre 2003 e 2008. Regressou, mas no início, os filhos não saiam de casa e não iam à escola.
“Hoje é tudo diferente. Agora, os meninos estão jogando basquete na quadra, mas antes não era assim. Havia muito medo de que alguém pisasse em uma mina”, conta enquanto observa as crianças na quadra de esporte.
Perto dali, o agricultor César Fabian, 33, não teve sorte, e pisou em uma mina, em 2008, quando ia visitar uma fazenda para comprar gado. “Eu sabia que tinha mina no chão e sempre olhava, mas nunca pensava que ia acontecer comigo”, disse.
Amputado da perna direita, ele usa uma prótese. César leva uma vida normal. Ele dirige moto e caminhão e trabalha do mesmo modo que antes. “Quando fico sem a prótese me sinto mal. Ela estragou faz uns meses e me senti inútil. É difícil se acostumar a não ter uma parte do corpo, mas temos recursos.”, comenta.
O trabalho de retirar as minas é tão demorado e delicado quanto a adaptação à realidade de ser mutilado. Perto de San Carlos, o Exército trabalha na desminagem do município de Granada. Em 15 dias de trabalho na região, o Exército desativou dez minas.
A população da zona rural mantém uma rotina alterada enquanto não há segurança. Algumas comunidades precisam caminhar três horas a mais para sair de suas terras e ir à cidade, por exemplo.
Os soldados trabalham em grupos de quatro e a área é isolada. Um detector de metais é usado para encontrar artefatos. Quando alguma mina é detectada, os militares acionam explosivos a distância para desativá-la. O monitor do grupo interamericano da OEA, o capitão brasileiro Denivaldo Sousa, acompanha a missão.
O trabalho do Brasil na desminagem humanitária da Colômbia começou em 2005, quando militares brasileiros treinaram o primeiro batalhão para a tarefa no país. Agora, a equipe brasileira supervisiona a ação dos batalhões em atividade. O Brasil adquiriu experiência na desminagem após atuar na América Central e na África. “Essas missões deram ao nosso país capacidade de treinamento, de desenvolvimento e de doutrina nessa área”, explica o capitão.
O coordenador do Programa de Ação Integral contra Minas Antipessoais (Paicma), Daniel Ávila, diz que desminar o país com o conflito ainda em vigor, com o artefato utilizado pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e pelo Exército da Libertação Nacional (ELN), aumenta a complexidade da tarefa.
“A contaminação é alta e, enquanto se desmina em uma parte, os grupos armados continuam minando outras partes”, ressaltou Ávila. Ele acrescenta que o Exército colombiano não usa minas terrestres desde 1997, quando assinou a Convenção de Ottawa (Canadá), que proibiu este tipo de arma em combates. Mas as guerrilhas e também os grupos criminosos comuns – as chamadas bandas criminais ou bacrims – usam minas.
O trabalho é de longo prazo e deve ser feito em regiões em que exista segurança e em que as guerrilhas não estejam atuantes. “A desminagem só pode ser realizada em zonas seguras, para não causar danos adicionais às comunidades que habitam estes lugares”, diz.
Ávila tem expectativa de que um acordo de paz entre as Farc e o governo possa acelerar o trabalho de desminagem, mas ainda a tarefa exigirá tempo. “Se temos apoio de ex-guerrilheiros desmobilizados para sinalizarem lugares possivelmente minados, poderíamos levar 30 anos para desminar o país, caso o conflito termine nos próximos meses”, destacou.
Esta matéria foi originalmente publicada pela Agência Brasil
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