O marco civil da internet é um retrocesso à liberdade dos indivíduos na internet brasileira e um perigo a todo cidadão ordeiro. Explico. O Projeto de Lei 2.126/2011, também conhecido como marco civil da internet, provavelmente será votado hoje, 25 de março de 2014, e consiste em uma afronta à liberdade de expressão e ao livre mercado.
A “neutralidade da rede” não tem qualquer serventia senão controlar ainda mais as relações entre consumidores e empresas. Justifica-se por um suposto perigo de “discriminação de conteúdo pelas empresas prestadoras de serviços de internet e provedores de acesso”. O que isso significa? Que se fomenta um medo fictício de que as operadoras de internet e os provedores comecem a discriminar o conteúdo que o usuário pode acessar com seu pacote contra a vontade desse e o exclua do “convívio virtual” e o acesso a tal conteúdo.
Na prática, não passa de besteira estatal para convencer os cidadãos a permitirem mais este golpe contra eles mesmos. Hoje não há qualquer lei que preveja a tal “neutralidade da rede” e, no entanto, as operadoras de internet e os provedores oferecem diversos pacotes com velocidades diferenciadas e acesso a todo conteúdo, bem como pacotes com acesso restrito. Tudo para ser escolhido pelo consumidor.
Com a neutralidade da rede tudo que se consegue é impedir as empresas de oferecerem também pacotes para acesso apenas a determinado conteúdo e impede-se os consumidores que desejarem adquirir esses pacotes de fazê-lo, sendo estes obrigados a adquirir pacotes mais caros e com acesso a conteúdo além do desejado. Por exemplo, se o indivíduo X quiser adquirir um pacote de internet que lhe dê acesso apenas a e-mail e ferramentas do Google, não poderá fazê-lo, sendo obrigado a adquirir o pacote completo e contratar um técnico ou estudar e ele mesmo configurar seu(s) computador(es) para bloquear tal acesso. No entanto, ao fazer isso, continuará pagando o preço de quem possui tal acesso. Um pacote que seria mais barato, podendo oferecer outros diferenciais como velocidade maior e melhor conexão, será mais caro e sem diferencial nenhum, para atender às regulamentações.
Isso causa danos às empresas também, que poderiam contratar pacotes com acesso somente aos e-mails, bloqueando o acesso dos funcionários a sites como Facebook e outros durante o expediente. Agora, elas terão que investir em meios de bloquear o conteúdo, com indivíduos contratados para efetuar um serviço que seria mais barato e dispensaria tal custo, que poderia ser investido na melhoria dos produtos e/ou serviços da própria empresa. Esse “emprego” gerado afeta a geração de outros empregos com o aumento do lucro advindo das consequências positivas de investir tais recursos em produtos/serviços melhores e mais baratos.
O marco civil da internet também acaba com a solução não litigiosa de problemas de usuários com crimes virtuais. Por exemplo, se hoje podemos pedir a retirada de um conteúdo que inicia agressão contra nós no Facebook através de denúncia à rede social, podendo ser implicada legalmente em um segundo momento caso o conteúdo criminoso não seja retirado, amanhã teremos que entrar com ação judicial solicitando a retirada do conteúdo e o Facebook só será implicado se não retirá-lo após ordem judicial. Algo que era solucionado pelo mercado, agora entupirá ainda mais nosso judiciário já moroso e implicará em danos aos cidadãos honestos em benefício dos criminosos.
O outro lado é válido também. Um político com influência minimamente considerável, mesmo que não conte com afeição de juízes, poderá facilmente manter conteúdo difamatório contra adversários “menos influentes” e críticos e retirar o conteúdo que lhe seja “prejudicial”, sem que seja criminoso. Vejo censura no horizonte.
Além do engessamento das relações entre consumidores e empresas, os serviços tendem a piorar e/ou ficarem mais caros devido aos custos extras e desnecessários (além de exigências absurdas) causados pelas regulamentações, como a exigência de manter os dados de conexão dos usuários e acesso a aplicações de internet (mesmo que de forma sigilosa para garantir a “privacidade” e a “intimidade” desses usuários) nos provedores de acesso, por um ano. São milhões de usuários e bilhões de conexões e acessos a aplicações diariamente. Dizer que os dados só podem ser fornecidos mediante ordem judicial, não muda o fato de que essa ordem pode partir a pedido de qualquer “interessado”, nem muda o custo surreal para este armazenamento extra, o que afastará investimentos no setor.
Por fim, com o fantasma do caso de espionagem dos EUA, há a exigência de que haja instalação dos servidores das empresas estrangeiras de conteúdo no Brasil, para “garantir a segurança dos dados dos usuários brasileiros”. Nesse caso, empresas como Google e Facebook, por exemplo, precisariam ter servidores no Brasil, algo totalmente inviável, dado o custo gerado pelo governo com regulamentações e impostos e o tamanho que precisariam ter tais servidores, necessitando de uma estrutura que o país não proporciona. Ora, essas empresas instalam seus servidores em países e regiões com temperaturas abaixo de zero por causa do calor gerado por tais servidores, sendo mais fácil resfriá-los nesses ambientes. Como fariam no Brasil?
O marco civil da internet é um projeto de lei disfarçado por boas intenções, que não passam de desculpas bem elaboradas que têm por trás as piores intenções possíveis, como controlar o último reduto de liberdade a que temos acesso e interferir ao máximo na vida de cada cidadão, conferindo poderes ditatoriais ao Estado sobre a internet e os usuários.
Roberto Barricelli é jornalista e assessor de imprensa do Instituto Liberal
Esse artigo foi originalmente publicado no Blog do Roberto Lacerda