Mais de mil marcham contra aumento da passagem de ônibus no Rio

07/06/2013 00:25 Atualizado: 13/11/2014 23:19
Manifestantes também reivindicam fim da dupla função motorista-cobrador e são reprimidos com bombas de efeito moral
Aproximadamente 7 mil protestam em quatro capitais
Marcha nacional contra o aumento da passagem de ônibus. Rio de Janeiro, 6 de maio de 2013 (Bruno Menezes/The Epoch Times)
Multidão fecha a Avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, para protestar contra o aumento do ônibus no Rio (Bruno Menezes / The Epoch Times)

RIO DE JANEIRO – Cerca de 1.100 pessoas se reuniram em frente à Igreja da Candelária, no centro do Rio,  na tarde desta quinta-feira (6) para protestar contra o aumento das tarifas de ônibus, que vigoram desde o dia 1º de junho na capital. Portando faixas e cartazes onde se liam “Mãos ao alto, esse aumento é um assalto” e “2,95: Tem open bar?”, tocando tambores e bradando palavras de ordem como  “Ô, motorista, ô, cobrador, me diz aí se o seu salário aumentou” e “Paes, cara de pau, o aumento é para a campanha eleitoral”, os manifestantes marcharam pela Avenida Presidente Vargas até a Central, onde foram dispersados pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar com armas não letais.

Após uma única e malsucedida tentativa de negociação, às 19h05, os soldados deram meia-volta e abrirtam fogo contra os manifestantes com balas de borracha e artefatos de gás lacrimogênio. Os oficiais também usaram spray de pimenta e estouraram uma bomba de efeito moral no posto de gasolina da Presidente Vargas, até o repórter do Epoch Times lacrimejou. Duas pessoas ficaram feridas e quatro foram presas.

“A manifestação foi pacífica, até o Choque se negar a dialogar e partir pra cima. Um dos policiais veio antes até nós mas me ignorou quando eu tentei conversar com ele. Ele simplesmente virou o rosto e se afastou. Em determinado momento, cerca de três manifestantes começaram a revidar com pedras. Mas isso só após muita bomba de efeito moral e gás lacrimogênio”, disse o balconista Flávius Moraes, 21 anos, que está procurando emprego para pagar um curso pré-vestibular.

O professor de história Danyel de Argolo, 24 anos, se feriu ao tomar um tiro de bala de borracha na mão e também disse que não houve diálogo. “O Choque sempre covarde. Tentaram conversar mas os soldados ignoraram e começaram a truculência gratuita, formação militar e porrada nos manifestantes. Não havia necessidade de truculência. Gás lacrimogênio e bala de borracha pra uma manifestação pacífica.”

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Para o estudante de ciências sociais da UERJ Gabriel Bragança, 24 anos, o aumento não se justifica. “O governo vem com a desculpa de que vai botar ar condicionado na frota, mas já é a terceira vez que aumenta as passagens com esse argumento e, desde a concessão, não se reverte em melhorias na qualidade do transporte, apenas em lucro para esse cartel de quatro empresas que dominam todos os ônibus da cidade.” Segundo Gabriel, o novo preço é abusivo. “A passagem no Rio já é uma das mais caras do país e, junto com o atual modelo, impede os trabalhadores de se locomoverem para seu local de trabalho e de lazer. O transporte na cidade do Rio de Janeiro devia ser público, controlado pelo estado e subsidiado para cobrir apenas os custos.”

O estudante de piloto Pedro de Marco, morador do Méier, também não acredita que o novo aumento trará melhorias. “É um grande absurdo, porque a gente tem um transporte público entregue na mão da máfia dos ônibus e cada vez pior. E a passagem só aumenta, algumas vezes acima da inflação. Qualquer ônibus que você pega está lotado e sem condição de rodar, quem não tem carro hoje está lascado porque no transporte público está impossível de andar, você tem que tentar pegar o ônibus no ponto final porque se não não dá. O 692 (Méier-Alvorada) por exemplo, o que é aquilo? Ônibus com ar-condicionado, ônibus novo? Isso eu não vejo lá no Méier, nem em lugares que frequento, como Engenho Novo. Na Zona Norte, só vejo poucas linhas com ônibus sobrecarregados de gente e extremamente sucateados, com motorista fazendo dupla função, que até pouco tempo era ilegal. Chegou a um ponto que não tem como aguentar, a gente paga imposto e passagem cara para não ter nada, a gente protesta e a polícia chega e bate na gente, que democracia é essa?”

Victor Mus, 21 anos, estudante de letras da UERJ, músico e tradutor, explica que uma das principais reivindicações, além da redução do preço das passagens e do passe-livre para estudantes, é também a extinção da dupla função motorista-trocador. “Se a gente não pode andar de carro falando ao telefone, o motorista também não pode dirigir e dar troco. As empresas de ônibus têm subsídios fiscais absurdos e lucros abusivos em cima da gente e ainda diminui seus custos dessa forma, tirando a vaga do cobrador, sobrecarregando o motorista e colocando em risco a vida do trabalhador. É até mais perigoso, porque quando alguém fala no telefone ao volante não tem uma pessoa do lado desviando sua atenção, pedindo troco ou para passar na roleta. É muito mais desumano um ônibus carregando 40 vidas sendo guiado por um condutor que tem dupla função. E se o motorista bater por causa disso a culpa, ainda por cima, é dele.” Mus também critica a nova tarifa. “Por 2,95 o ônibus tinha que vir com massagem, ar condicionado e com cafezinho, porque a estrutura dos ônibus que a gente tem hoje é precária.”

Segundo o estudante técnico de informática Guilherme Gomes, que mora em Brás de Pina, o novo valor da passagem não vale o serviço que é oferecido. “Saí do colégio e vim aqui hoje para chamar atenção para o estado dos ônibus, com banco quebrado, pichado, sujo. Um exemplo é o 910 (Madureira-Bananal), você viaja com baratas do seu lado. É uma linha bem precária, embora haja uns que estão em boas condições. Para quem depende do transporte público, é muito ruim. Para ir para o colégio, posso pegar trem, que, todo muito conhece, é horrível: dos 20 que passam pela estação, um é o novo, com ar condicionado e em boas condições, os outros estão ruins, fedendo, sujo, quebrado e ocorrem acidentes.”

Para vir para a escola, Guilherme pega um ônibus no município de Caxias, vizinho ao Rio, e o metrô em Irajá. “Essa frota de Caxias, por exemplo, está em boas condições, lá teve um aumento de 2,60 para 2,80, mas é rápida, raramente quebra e só na hora de voltar que é um pouco cheio. Se o aumento aqui no Rio fosse pra melhorar as condições dos ônibus, até seria uma boa, mas a gente sabe que isso não acontece porque já ocorreram vários aumentos e até hoje não mudou nada,  creio que não vai melhorar tão cedo e 2,95 não dá pra pagar.”

“O serviço do metrô também é relativo, porque às vezes vem a composição nova, em boas condições, mas quando vem a antiga, vem muito cheia, não ligam o ar-condicionado, fica muito calor. Como também teve aumento, espero que melhore realmente, com a nova frota de trens que prometeram, porque os que chegaram não estão suprindo a demanda”, completa Gomes.

A estudante de design da UFRJ Adriana Buzzacchi, 21 anos, denuncia também a proibição das vans e a diminuicão da rede do bilhete único. “Eu vim aqui porque a gente paga caro para andar em caçambas de caminhão, falam que é para pôr ar-condicionado, mas todo mundo sabe que as companhias de ônibus e Eduardo Paes estão de mãos dadas. Estimulam a gente a comprar carro, mas não melhoram o serviço público e assim também não melhora o trânsito, então é de certa forma uma coerção do direito de ir e vir, é um desrespeito com o trabalhador. Também já há linhas que o bilhete único não vai mais cobrir. Fica difícil para o estudante, ainda mais agora que eles acabaram de proibir a van, os ônibus ficam ainda mais superlotados.  A van era uma alternativa para quem não tem transporte particular, até isso eles tiraram da gente e agora aumentaram ainda mais a passagem. Tudo bem que eles diminuiram os de ar-condicionado, mas esses são muito minoria e a integração do ônibus-metrô também aumentou, para 4,50.”

Moradora da Tijuca, Adriana gasta cerca de R$ 15 por dia com transportes para ir e vir para o Campus do Fundão. “Eu tenho sempre que pegar dois ônibus para ir. O pessoal dependia de van porque o 485 só passa de meia em meia hora, quando passa. Ele tem vindo abarrotado, com as pessoas penduradas na porta ou atrás do motorista, eu já fui atrás do motorista uma vez.” Buzzacchi não está satisfeita com o sistema público de ônibus. “É muito demorado, muito lotado, a gente vai de pé e espremido, é muito chato. A modernização dos ônibus está restrita à Zona Sul e as latas velhas eles jogam para a Zona Norte. Poderia ter mais ônibus, um serviço melhor, o que tem hoje não justifica essa passagem tão cara. Há linhas que nem existem, aí tem que ir a pé. Por exemplo, lá na Vila Valqueire cortaram uma linha de ônibus e o meu amigo agora tem que andar quatro quarteirões antes de pegar o primeiro ônibus.”

Na segunda-feira (3), manifestantes também protestaram contra o aumento das passagens de ônibus no Rio de Janeiro. Eles marcharam pela Avenida Rio Branco, no centro da cidade. As tarifas foram ajustadas de R$ 2,75 para R$ 2,95 no sábado, um o aumento foi de 7,2%. O valor da viagem de metrô também subiu, de R$ 3,20 para R$ 3,50.

Protestos também em São Paulo, Goiânia e Natal

Em São Paulo, segundo o Movimento Passe Livre (MPL), cerca de 5 mil manifestantes marcharam pela Avenida Paulista, indo do Theatro Municipal, no centro da cidade, ao bairro Paraíso, passando pela sede da prefeitura e pelo Masp. Também houve repressão a balas de borracha, spray de pimenta e bombas de efeito moral. Protestantes fizeram uma fogueria com  lixo e cones da companhia de trânsito, depredaram a Estação Brigadeiro do metrô, a vidraça do Shopping Paulista e picharam ônibus. Segundo a polícia, houve 15 detenções. De acordo com o MPL, 30 pessoas ficaram feridas. Na capital paulista, as tarifas de ônibus, metrô e trem aumentaram no domingo (2), de R$ 3 para R$ 3,20.

Em Natal, capital do Rio Grande do Norte, de acordo com a Polícia Militar, cerca de 400 marcharam contra o aumento das passagens. Os manifestantes foram do conjunto Mirassol, próximo ao viaduto da BR-101, até o Shopping Midway Mall e atearam fogo em lixo e pneus pelo caminho. Segundo a Polícia Rodoviária Federal do estado, um manifestante se feriu após cair do Viaduto Quarto Centenário, mas passa bem. A tarifa de ônibus na Grande Natal passou de R$ 2,20, para R$ 2,40, tendo ficado em R$ 2,30 após redução de impostos pelo governo federal. Desta vez, não houve confronto com a polícia.

Em Goiânia, onde a passagem de ônibus subiu de R$ 2,75 para R$ 3 no último dia 22 de maio, a marcha foi do Teatro Goiânia, pela Avenida Anhanguera, no Centro, até a Avenida Independência, também na tarde desta quinta-feira (6). Com batucada, encenações, cartazes e narizes de palhaço, cerca de 800 manifestantes, segundo os manifestantes, repudiaram o aumento da tarifa e denunciaram a má qualidade do transporte coletivo na capital de Goiás. Também atearam fogo a uma barricada de pneus, jogaram uma bomba caseira em frente à Câmara Municipal e estilhaçaram o vidro de uma viatura da Polícia Militar.

O reajuste tarifário do transporte público, que geralmente ocorre no início do ano, foi prorrogado após articulação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, para tentar conter a alta da inflação. A isenção das taxas de PIS/Cofins para as empresas de transporte coletivo anuncada pelo Ministério da Fazenda no fim de maio impediu aumentos ainda maiores no preço das passagens.

Continua…

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