Nos últimos dias, o líder chinês Xi Jinping foi à Rússia, aproveitando a fanfarra da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi para fortalecer os laços com as autoridades russas e expressar solidariedade política com o regime do homem forte da Rússia, Vladimir Putin.
“A razão pela qual eu vim à cerimônia de abertura das Olimpíadas de Inverno em Sochi foi demonstrar nosso apoio ao compromisso político do seu país”, disse Xi Jinping, no discurso de abertura numa rara entrevista cara-a-cara com uma estação de TV russa.
A viagem e seus sentimentos surgem enquanto o regime chinês continua a reforçar suas reivindicações territoriais nos mares do Leste e do Sul da China e a trocar palavras duras com os Estados Unidos sobre suas ambições estratégicas no Pacífico Ocidental.
“Entre vizinhos e amigos, quanto mais tempo eles passam juntos, mais íntimos eles se tornam, e quanto mais eles andam juntos, mais íntimos ficam. Quando um vizinho tem uma celebração, é preciso ir e cumprimentá-lo”, disse Xi.
Portais chineses, onde a maioria das pessoas recebe suas notícias na China, colocaram a notícia no topo de suas páginas. As mídias estatais chinesas porta-vozes do regime, a Xinhua e o Diário do Povo, também deram destaque à viagem e aos comentários de Xi.
O Diário do Povo afirmou que a visita de Xi a Moscou – sua primeira viagem ao exterior em dois anos consecutivos – era “prova potente do vínculo especial entre as duas nações”. Tais observações não foram feitas pelos líderes chineses no contexto da relação EUA-China.
Amigos do terceiro mundo
Uma importante declaração de política externa do regime Xi Jinping – ou, pelo menos, um documento que foi oficialmente identificado como tal – foi publicado em 25 de janeiro. Ele enfatizou que a China busca o desenvolvimento pacífico, desde que todos os países respeitem os interesses centrais da China.
O texto também fez uma menção especial ao fato de que “a China sempre será amiga de países em desenvolvimento”. Não houve semelhante menção especial de amizade da China com os países desenvolvidos. A retórica lembra, embora difira em substância, o apoio maoísta para a revolução nos países do terceiro mundo nos anos 1960 e 1970.
Guardando-se contra os EUA
Esta inflexão ideológica à política externa – de nenhuma maneira exclusiva de considerações comerciais pragmáticas ou perseguida em detrimento das relações com os Estados Unidos e outros países – está em harmonia com murmúrios recentes do establishment ideológico comunista chinês sobre os perigos da ocidentalização.
No último ano, a liderança comunista chinesa deu atenção especial ao colapso da União Soviética, incluindo o lançamento de uma série de palestras intensamente ideológicas sobre como a China deve evitar o mesmo destino.
“Por que a União Soviética se desintegrou?”, perguntou Xi, num discurso em 2012. “Uma razão importante foi que seus ideais e crenças foram abalados.” Xi continuou: “Descartar a história da União Soviética e do Partido Comunista Soviético, descartar Lênin e Stalin, e descartar tudo o mais é se engajar em niilismo histórico.”
“Algumas pessoas definem reforma como voltar-se para os ‘valores universais’ ocidentais… isso é furtivamente mudar as ideias e distorcer nosso conceito de reforma.” Uma das características destas discussões é o posicionamento do “Ocidente” (ou seja, de forma eficaz, os Estados Unidos) como um inimigo que está incessantemente envolvido na tentativa de subverter o sistema político chinês.
Competição política
Estes receios foram expressos mais pungentemente no documentário “Competição Silenciosa”, produzido pela Universidade de Defesa Nacional da China, a maior instituição oficial de estudo militar do país. Neste relato, a América é um inimigo sorrateiro e problemático que tenta minar a pureza ideológica do Partido Comunista por meio do comércio, diplomacia e intercâmbio militar.
De fato, racionalizações americanas anteriores que fundamentassem uma extensa relação econômica com a República Popular da China (RPC) giravam em torno do que ficou conhecido como a teoria da “evolução pacífica”. Nesse modelo, argumentou-se que o desenvolvimento econômico, inevitavelmente, resultaria em mudança política.
Essa teoria tem sido amplamente desacreditada e a base ostensiva do engajamento econômico dos EUA com a China já não se funda nisso. No entanto, os planejadores militares chineses parecem ainda perturbados pela ideia, segundo o conteúdo da “Competição Silenciosa”.
Eles também parecem estar em oposição ao intercâmbio e à cooperação entre as duas forças armadas. Estrategistas militares norte-americanos em geral acreditam que tais relações, quando conduzida de tal forma a impedir a China de obter informações militares confidenciais dos EUA, pode ser extremamente importante para o estabelecimento de protocolos e linhas de comunicação no caso de uma crise.
Esta atitude marca um forte contraste com os laços militares que a China mantém com a Rússia. Os dois países realizaram exercícios militares bilaterais em julho e agosto do ano passado, exemplificando seus “fortes laços militares”, segundo a mídia estatal russa RIA Novosti.
Pequim repetiu o sentimento em novembro do ano passado. “Os abrangentes, estratégicos e cooperativos laços China-Rússia mantiveram um impulso positivo em direção ao desenvolvimento”, disse a Xinhua, uma porta-voz do PCC. “A parceria política de alto nível criou condições favoráveis para os intercâmbios militares.”