Novas preocupações surgem nos Estados da Primavera Árabe
Um cristão é espancado e torturado na Eritréia por se recusar a renunciar sua fé; um monge budista é preso na Birmânia por denunciar restrições sobre assembleia religiosa; no Irã, é negado emprego ou educação a um Bahai; na China, um praticante do Falun Gong é enviado à reeducação num campos de trabalhos forçados por sua crença.
Estas ocorrências diárias são uma ínfima porção das infrações incessantes sobre as liberdades religiosas em quase 200 países ao redor do mundo, violações dos direitos religiosos documentadas pelo 13º “Relatório Anual sobre Liberdade Religiosa Internacional” do Departamento de Estado dos EUA, publicado em setembro de 2011.
Entre os países citados no relatório estão os oito ofensores mais hediondos contra a liberdade religiosa, apelidados de “países de preocupação particular”, que incluem os quatro estados mencionados acima, além da Arábia Saudita, Coréia do Norte, Sudão e Uzbequistão.
Estes países são e têm sido “violadores severos e crônicos por longo tempo da liberdade religiosa”, disse Michael Posner, secretário-assistente de Estado dos EUA para democracia, direitos humanos e trabalho, numa conferência de imprensa, de acordo com uma transcrição de suas observações.
O grau de intolerância religiosa nos “países de preocupação particular” varia de proibições de proselitismo no Uzbequistão à proibição de todas as religiões exceto o islamismo na Arábia Saudita, a um controle totalitário sobre todas as atividades religiosas na Coreia do Norte.
Na China, o nível geral de tolerância a atividades religiosas tem piorado, como a repressão aos budistas tibetanos, uigures muçulmanos, adeptos do Falun Gong, e cristãos, conduzida pelo Estado autoritário e oficialmente ateu.
A repressão do regime comunista chinês sobre as atividades religiosas “permaneceu severa” durante o período de documentação do relatório entre julho e dezembro de 2010, especialmente no Tibete e na região autônoma de Xinjiang durante a Exposição Mundial de Shanghai e os Jogos Asiáticos realizados em Guangzhou.
A maior perseguição religiosa na China e no mundo é ao Falun Gong. No início de 1999, antes da perseguição começar, as autoridades chinesas indicaram que 100 milhões de pessoas na China haviam adotado a prática.
O relatório aponta vários aspectos da perseguição, embora os números que ele forneça sejam muito conservadores. Por exemplo, o relatório diz que, desde 1999, 100 mil praticantes do Falun Gong foram detidos em campos de trabalho na China para reeducação. O jornalista independente Ethan Gutmann, que estuda esta perseguição, afirma que entre 15 e 20% de todos os detidos em campos de trabalho da China sejam praticantes do Falun Gong, com um mínimo de 450 mil praticantes detidos em qualquer momento. O Relator Especial da ONU sobre Tortura, Manfed Nowak, relatou que dois terços de todos os casos de tortura na China registrados em seu escritório eram do Falun Gong.
A supressão ao Falun Gong tem se intensificado à medida que o regime comunista reforça sua campanha para “transformar” os adeptos, disse o relatório. A transformação envolve forçar os praticantes a renunciar a suas crenças, seja por lavagem cerebral ou tortura. Em outubro de 2010, o regime chinês lançou uma nova campanha com o objetivo de transformar três quartos de todos os adeptos do Falun Gong conhecidos.
O relatório não discute o abuso mais grave sofrido pelos praticantes do Falun Gong, a extração forçada de órgãos de praticantes vivos. David Kilgour e David Matas relatam em sua investigação, publicada num livro chamado “Colheita Sangrenta”, que praticantes do Falun Gong são a fonte mais provável dos órgãos de 41.500 operações de transplante feitas entre 2000 e 2007.
Embora o relatório concentre-se na lista dos “países de preocupação particular”, não é “de forma alguma a única medida de graves violações de liberdade religiosa”, disse Posner. Ao invés disso, muitos países são culpados de “repressão oficial de minorias religiosas ou de indiferença oficial a sua situação”.
No Paquistão e no Iraque, o relatório do Departamento de Estado norte-americano viu ligeiros ganhos de liberdade religiosa com a supervisão governamental e maior atenção à violência religiosa, mas alertou que uma parte caluniosa da legislação paquistanesa poderia ser usada para reprimir minorias religiosas, assim como continuar com a violência contra peregrinos e fiéis no Iraque, o que significa que “há mais trabalho a ser feito”, disse Posner.
Em todo o mundo árabe, grupos religiosos têm sido confrontados com nova hostilidade na sequência da onda de revoltas sociais popularmente conhecidas como a Primavera Árabe, alertou a secretária de Estado Hillary Clinton, numa entrevista coletiva prévia à publicação do relatório.
“No Oriente Médio e Norte da África, as transições para a democracia têm inspirado o mundo, mas também têm exposto as minorias étnicas e religiosas a novos perigos”, disse Clinton.
“As pessoas tem sido mortas por seus próprios vizinhos por causa de sua etnia ou crença. Em outros lugares, temos visto governos assistirem imóveis a violência sectária, inflamada por animosidades religiosas, destruir comunidades.”
O povo árabe, ao abraçar ou seguir extremismos religiosos e o fanatismo, não pode “trocar uma forma de repressão por outra”, alertou ela.