Uma nova lei argentina, aprovada por unanimidade parlamentar na semana passada, determinou que todos os meios de transporte coletivo do país (ônibus, trens, metrô e aviões) devem carregar em local visível um cartaz com a mensagem “Las Malvinas son Argentinas”. Estações de partida e chegada desses meios de transporte também estão obrigadas a mostrar a mensagem.
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Para a autora do projeto, a senadora Teresita Luna, “com essa forma de comunicar, colaboramos para reforçar entre nossos cidadãos o sentimento de pertencimento das Ilhas Malvinas, e reforçamos a afirmação de soberania ante o turismo estrangeiro”. Certamente a medida trará importantes avanços ao transporte público argentino, já conhecido mundialmente por sua eficiência e segurança.
Os cartazes são apenas mais um capítulo na infindável disputa entre Reino Unido e Argentina pela soberania sobre as Ilhas Falkland, território de 12.200 km² localizado no Atlântico Sul e habitado por 3.000 pessoas (concentradas principalmente na capital, Stanley), 700.000 ovelhas e mais de 1.000.000 de pinguins. A controvérsia remonta ao século XIX e culminou em 1982 com uma guerra iniciada pela Argentina, na qual morreram 258 britânicos e 649 argentinos. Enquanto os portenhos apoiam sua pretensão às ilhas na colonização espanhola do arquipélago, o Reino Unido invoca principalmente o direito à autodeterminação política de seus habitantes, também conhecidos como kelpers.
Trinta anos após a vitória militar britânica, os argentinos ainda não se conformam com o resultado da guerra: o claim pelas ilhas está contido até mesmo na Constituição de 1994. A expressão “Malvinas Argentinas” dá nome, entre outros, a um município na província de Córdoba, um estádio em Mendoza e um aeroporto em Ushuaia. E, ocasionalmente, a seleção argentina de futebol estende uma faixa com os dizeres “las Malvinas son Argentinas” antes de seus jogos – a situação começou a chamar a atenção da imprensa internacional na época da última Copa do Mundo, como num amistoso contra a Eslovênia.
A nova lei a respeito do transporte público não é a única manifestação argentina recente sobre a soberania nas ilhas. No último domingo (16), foi realizada em Buenos Aires a corrida “Malvinas, corazón de mi país”, que contou com mais de 10 mil inscritos. De acordo com a propaganda oficial do evento, tratou-se de “uma iniciativa para mostrar o melhor de nós mesmos: a solidariedade do povo argentino”. Não ficou claro a quem exatamente se referiria a “solidariedade” contida na descrição do evento, mas provavelmente trata-se de uma manifestação de apoio a todos os 3 (três) habitantes das Falklands que, em um referendo realizado em 2013, optaram pelo fim da soberania inglesa do arquipélago. Na ocasião, o pequeno grupo foi derrotado por 1.513 kelpers que preferiram continuar sendo britânicos – 99,8% dos votos válidos.
Aliás, se você lamenta ter perdido essa oportunidade única de entrar em forma e ainda provocar o Império Britânico, não se preocupe: uma segunda edição da corrida será realizada no próximo dia 6 de dezembro. Em uma estratégia similar à utilizada com movimentos de apoio ao governo no Brasil, o evento possui patrocínio estatal indireto, conferido pela Aerolíneas Argentinas (empresa com 100% de controle governamental).
Falando em aviões, há também boatos de que Cristina Kirchner esteja cogitando suspender a autorização para que um voo semanal da LAN entre Punta Arenas (Chile) e Mount Pleasant (Falklands) passe pelo espaço aéreo argentino, cortando assim a única ligação comercial regular que os kelpers atualmente possuem com o continente sul-americano. Caso os boatos sejam verdadeiros, a segunda criatura no mundo a se intitular “presidenta” terá de apressar sua decisão: planeja-se para 2016 um voo regular entre as Falklands e a ilha britânica de Santa Helena, 6.000 km mais ao norte e praticamente na metade do caminho entre Stanley e Londres. A rota abrirá novas possibilidades comerciais às Falklands e ajudará a estreitar os laços da colônia inglesa com a sua metrópole.
Até o momento o governo do Reino Unido não se posicionou oficialmente a respeito da nova legislação do transporte público argentino. No entanto, analistas diplomáticos creem que uma eventual resposta britânica tenda a ser parecida com a da foto abaixo: