Lançamento do livro: Bitcoin, a moeda na era digital

10/03/2014 16:33 Atualizado: 10/03/2014 16:33

Há pouco menos de um ano decidi estudar a fundo o fenômeno Bitcoin e suas implicações na sociedade. O ceticismo e a desconfiança inicial logo deram lugar ao fascínio e à admiração. À época, numa série de artigos sobre o Bitcoin, concluí que “o projeto Bitcoin era revolucionário, sem precedentes e tinha o potencial de mudar o mundo de uma forma jamais vista”. Passados todos esses meses, posso afirmar sem dúvida alguma que essa conclusão foi reforçada ainda mais.

Esse período de estudo e investigação sobre o Bitcoin — que me forçou a entender melhor não somente a nascente moeda digital, ou criptomoeda, mas também a própria noção de dinheiro — acabou culminando numa obra completa, o primeiro livro em língua portuguesa sobre o fenômeno e o mais novo lançamento do Instituto Mises Brasil. Em Bitcoin — a moeda na era digital, procurei introduzir e explicar o funcionamento da nova moeda, além de contar um pouco da história dessa inovação e o contexto de seu nascimento.

Mas acredito que a contribuição mais original e mais importante seja a parte densa do livro em que aplico o ferramental teórico da Escola Austríaca de economia para analisar o Bitcoin. Por fim, dedico a última parte da obra à ideia de liberdade monetária e de como o Bitcoin se enquadra nesse ideal.

A verdade é que o Bitcoin é a maior inovação tecnológica desde a internet, é revolucionário, é sem precedentes e, reitero, realmente tem o potencial de mudar o mundo de uma forma jamais vista. À moeda, ele é o futuro. Ao avanço da liberdade individual, é uma esperança e uma grata novidade.

Acesse aqui a biblioteca do IMB para baixar o livro gratuitamente. Ou, se preferir, o livro também pode ser adquirido nas principais livrarias (como aqui e aqui) do país.

Publicamos abaixo o belo prefácio escrito por Jeffrey Tucker.

Boa leitura,
Fernando Ulrich

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Bitcoin, a nova moeda internacional

Por Jeffrey Tucker, IMB

Por muitos séculos, a moeda de cada país possuía nomes distintos — dólar, marco, libra, franco — para essencialmente a mesma coisa: uma commodity, geralmente ouro ou prata.

Cada moeda nacional era meramente um nome para um determinado peso de ouro. O dólar, por exemplo, foi definido como sendo 1/20 de uma onça de ouro, a libra esterlina como um pouco menos de 1/4 (exatamente 0,2435) de uma onça de ouro, e por aí vai.

Esses metais — ouro e prata — haviam sido voluntariamente selecionados pelo mercado em decorrência de suas propriedades únicas que eram particularmente adequadas à função monetária: durabilidade, divisibilidade, facilidade de reconhecimento, portabilidade, escassez (dificuldade de ser produzido em excesso) e uma razão valor/peso que não é nem muito alta e nem muito baixa.

Esse universalismo da moeda serviu muito bem ao mundo porque promovia o livre-comércio, auxiliava os comerciantes no cálculo econômico, e impunha um freio sólido e confiável ao poder dos governos. Ela limitava o impulso nacionalista.

Duas formas de nacionalismo arruinaram o sistema monetário antigo. Os próprios países descobriram que o melhor meio para aumentar o próprio poder era pela depreciação do dinheiro, o que acabava se mostrando menos doloroso e mais opaco do que o método tradicional de tributar a população. Para escaparem imunes desse processo, governos promoviam zonas cambiais, protecionismo e controle de capitais, desta forma removendo um elemento do crescente universalismo do mundo antigo.

Então, no início do século XX, os governos nacionalizaram a própria moeda, removendo-a do setor das forças competitivas de mercado. Os bancos centrais foram, nesse sentido, uma forma de socialismo, mas de uma variedade especial. Os governos seriam os arbitradores finais no destino do dinheiro, mas a gestão diária da oferta monetária ficaria a cargo de um cartelizado sistema bancário de reservas fracionárias, que agora contava com uma garantia de proteção contra falências — garantida pelos Bancos Centrais e pelos governos, e à custa da população.

Este novo poder de criar moeda foi imediatamente posto em prática durante a Primeira Guerra Mundial. Foi a primeira guerra internacional da história que obrigou toda a população a fazer parte de seu esforço, e que foi financiada por um endividamento estatal lastreado neste novo e mágico poder dos governos de usar o sistema bancário para criar receitas por meio da simples criação de dinheiro.

Surgiu uma oposição intelectual a essas políticas nefastas durante o período entre-guerras. Os economistas austríacos lideraram a batalha em prol da reforma. A não ser que alguma coisa fosse feita para desnacionalizar e privatizar o dinheiro, alertaram eles, o resultado seria uma série infinita de ciclos econômicos, guerras, inflações catastróficas, e a contínua ascensão do Estado leviatã. Suas previsões foram assustadoramente precisas, mas não são motivo de satisfação, pois foram impotentes para impedir o inevitável.

No decorrer do século, a maior parte dos bens e serviços melhorou em qualidade, mas a qualidade da moeda — agora removida das forças de mercado — apenas piorou. Sob o controle do Estado, o dinheiro tornou-se o catalisador do despotismo.

Durante todas essas décadas, lidar com esse problema foi algo que intrigou os economistas. A moeda tinha de ser reformada. Mas o governo e os cartéis bancários não tinham nenhum interesse nessa empreitada. Eles se beneficiavam desse sistema infausto.

Várias conferências foram realizadas e centenas de livros foram publicados incitando uma restauração do antigo universalismo do padrão-ouro. Os governos, porém, ignoraram. O impasse tornou-se particularmente intenso depois de os últimos vestígios do padrão-ouro serem eliminados na década de 1970. Mentes brilhantes tinham prateleiras repletas de planos de reforma, mas tudo o que esses planos conseguiram foi acumular pó.

Essa era a situação até 2008, quando então Satoshi Nakamoto tomou a iniciativa incrível de reinventar a moeda na forma de código de computador. O resultado foi o Bitcoin, introduzido ao mundo no formato menos promissor possível. Nakamoto lançou-o com um livro branco num fórum aberto: “Aqui está uma nova moeda e um sistema de pagamento. Usem se quiserem.”

Para sermos justos, já haviam ocorrido tentativas prévias de projetar tal sistema, mas todas fracassaram por uma das seguintes razões: (1) eram normalmente propriedade de alguma empresa comercial e, portanto, já nasciam com os vícios da centralização; ou (2) não superavam o chamado problema do “gasto duplo”. [1]

O Bitcoin, por outro lado, era absolutamente não reproduzível e construído de tal modo que seu registro histórico de transações possibilitava que cada unidade monetária fosse conciliada e verificada no decorrer da evolução da moeda. Ademais, e o que era essencial, a moeda residia numa rede de código-fonte aberto, não sendo propriedade de ninguém em particular, removendo desta maneira o problema de um ponto único de falha.

Havia outros elementos também: a criptografia, uma rede distribuída, e um desenvolvimento contínuo tornado possível por meio de desenvolvedores pagos pelos serviços de verificação de transações por eles providos.

Dificilmente se passa um dia sem que eu — assim como muitos outros — não me maravilhe com a formidável genialidade desse sistema; tão meticuloso, tão aparentemente completo, tão puro. Muitas pessoas, até mesmo economistas da Escola Austríaca, estavam convencidas da impossibilidade de reinventar o dinheiro em bases privadas (F.A. Hayek foi a grande exceção, tendo sugerido a ideia ao redor de 1974). Entretanto, tornou-se um fato inegável que o Bitcoin existia e obtinha um valor de mercado. Dois anos após ter sido lançado ao mundo, o Bitcoin atingiu a paridade com o dólar americano — algo imaginado como possível por muito poucos.

Hoje, reverenciamos o acontecimento. Temos diante de nós uma moeda internacional emergente, criada inteiramente pelas forças de mercado. O sistema está sendo reformado não porque os Bancos Centrais o desejem, nem por causa de uma conferência internacional, ou tampouco porque um grupo de acadêmicos se reuniu e formulou um plano. Ele está sendo reformado de fora para dentro e de baixo para cima, baseado nos princípios do empreendedorismo e das trocas de mercado.

É realmente incrível o quanto todo o processo que se desenrola diante de nosso testemunho se conforma ao modelo delineado pela teoria da origem do dinheiro de Carl Menger. Há apenas uma diferença, que surpreendeu o mundo: a base do valor do Bitcoin jaz não no seu uso prévio no escambo, conforme Menger descreveu, mas sim no seu uso atual como um sistema de pagamento. Quão privilegiados somos de testemunhar esse acontecimento no nosso tempo!

E qual é o potencial? O Bitcoin tem todas as melhores características do melhor dinheiro, sendo escasso, divisível e portátil. No entanto, ele vai além: por ser ao mesmo tempo “sem peso e sem espaço”, ele representa exatamente o ideal monetário — ele é incorpóreo. Isso possibilita a transferência de propriedade a despeito da geografia a um custo virtualmente nulo e sem depender de um terceiro intermediário, desta forma contornando todo o sistema bancário, o qual foi completamente subvertido pela intervenção governamental.

Assim, o Bitcoin não apenas propicia a perspectiva de restaurar a solidez e o universalismo do padrão-ouro do mundo antigo, como também tem o poder de aprimorá-lo pelo fato de existir fora do controle direto do governo. Isto é, repito, digno de admiração.

Muitos têm alertado que governos não tolerarão que o sistema monetário seja reformado por um punhado de cyberpunks e seu “dinheiro mágico de internet”. Certamente haverá intervenções. Haverá regulações. Haverá taxações. Haverá também tentativas de controlar. Mas olhemos a história recente. Governos tentaram impedir e acabaram por nacionalizar os correios. Tentaram impedir o compartilhamento de arquivos. Tentaram acabar com a pirataria. Tentaram também suspender a distribuição online de fármacos. Tentaram acabar com o uso, a fabricação e distribuição online de drogas. Tentaram gerenciar e controlar o desenvolvimento de softwares por meio de patentes e leis antitrustes. Se tentarem barrar ou até mesmo controlar uma criptomoeda, não terão êxito. Serão novamente derrotados pelas forças de mercado.

E aqui está a ironia. A forma mais direta com a qual os governos podem controlar o Bitcoin é intervindo na conversão entre a moeda digital e as moedas nacionalizadas. Quanto mais eles intervêm, mais eles incentivam os indivíduos a adotar o Bitcoin e a permanecer em seu ecossistema. Todas essas tentativas poderiam acabar alimentando o mercado. Mas há outras razões, além dessa consideração, que fazem de uma criptomoeda algo irreversível: taxas de transações praticamente nulas, segurança, proteção contra fraude, velocidade, privacidade e muito mais. Bitcoin é simplesmente uma tecnologia superior.

Cem anos atrás, o desenvolvimento e o gerenciamento da moeda foram retirados das forças concorrenciais do mercado e entregues às mãos de políticos e burocratas. As consequências foram guerra, instabilidade econômica, perda do poder de compra, furto insidioso da poupança dos cidadãos, exploração em massa e a explosão do poder e tamanho dos Estados ao redor de todo o mundo. A criptomoeda não apenas proporciona a perspectiva de reverter essas tendências, como também a de desempenhar um papel crucial na construção de um novo mundo de liberdade.

O que podemos aprender com a recente história do Bitcoin? Seja honesto: praticamente ninguém pensou que isso seria possível. Os mercados provaram o contrário. A lição nos ensina a sermos humildes, a olharmos para além do nosso quadrado, e a estarmos dispostos a sermos surpreendidos, deferindo aos resultados da ação humana. E, principalmente, a sempre esperarmos que o mercado irá entregar muito mais do que jamais imaginamos ser possível.

Por tudo isso é tão importante o livro que você tem agora em mãos. Publicado pelo prestigioso Instituto Ludwig von Mises Brasil, nesta obra Fernando Ulrich explica o funcionamento e o potencial do Bitcoin em relação ao futuro da moeda, da política nacional e da própria liberdade humana.

Baixe o livro gratuitamente aqui ou compre-o nas principais livrarias (como aqui e aqui).
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Nota:

[1] Até a invenção do Bitcoin, em 2008, transações online sempre requereram um terceiro intermediário de confiança. Por exemplo, se Maria quisesse enviar $100 a João por meio da internet, ela teria que depender de serviços de terceiros como PayPal ou Mastercard. Intermediários como o PayPal mantêm um registro dos saldos em conta dos clientes. Quando Maria envia $100 a João, o PayPal debita a quantia de sua conta, creditando-a na de João. Sem esses intermediários, um dinheiro digital poderia ser gasto duas vezes.

Imagine que não haja intermediários com registros históricos, e que o dinheiro digital seja simplesmente um arquivo de computador, da mesma forma que documentos digitais são arquivos de computador. Maria poderia enviar a João $100 simplesmente anexando o arquivo de dinheiro numa mensagem. Mas assim como ocorre com um e-mail, enviar um arquivo como anexo não o remove do computador originador da mensagem eletrônica. Maria reteria a cópia do arquivo após tê-lo enviado anexado à mensagem. Dessa forma, ela poderia facilmente enviar aos mesmos $100 a Marcos. Em ciência da computação, isso é conhecido como o problema do “gasto duplo”, e, até o advento do Bitcoin, essa questão só poderia ser solucionada por meio de um terceiro de confiança que empregasse um registro histórico de transações.
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Fernando Ulrich é formado em administração de empresas pela PUC-RS, concluiu em julho de 2010 o programa de mestrado em economia austríaca coordenado por Jesús Huerta de Soto em Madri, Espanha, e atualmente trabalha no mercado financeiro. Ele também é colunista do site O Ponto Base. Mande-lhe um e-mail

Esta matéria foi originalmente publicada pelo Instituto Ludwig von Mises Brasil