Um ex-funcionário comunista chinês sem grande destaque, que em seu último cargo foi o segundo encarregado da agência de planejamento econômico da China, foi a julgamento na quarta-feira no Tribunal Popular Intermediário na cidade de Langfang, província de Hebei, Norte da China, enfrentando uma acusação comum no oficialismo chinês: aceitar cerca de US$ 6 milhões em subornos.
Liu Tienan, de 59 anos, foi ex-vice-presidente da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, uma agência econômica extremamente poderosa que dispensa permissões e licitações e direciona recursos para inúmeros projetos em todo o país. Observadores disseram que os subornos que Liu recebeu seriam muito maiores do que o valor levado ao tribunal – mas na cruzada do Partido Comunista contra a corrupção, mostrar valores demasiado elevados prejudicaria os esforços de propaganda.
Liu também foi ex-presidente da Administração Nacional de Energia. Durante seu mandato nessas duas agências, ele foi acusado de receber 35,6 milhões de yuanes (US$ 5,8 milhões) em subornos entre 2002 e 2012.
A acusação diz que Liu abusou do poder no cargo para obter lucros para si e seu filho Liu Decheng. O filho disse ter recebido subornos para estabelecer uma empresa, além de milhões em ações numa empresa de negócio de automóveis, uma vila de luxo e um carro Porsche, num total de US$ 2,7 milhões. O filho também ganhou mais de US$ 1,6 milhão em dinheiro, um carro Nissan Teana de US$ 55 mil e uma sinecura oficial com um salário de US$ 200 mil – uma renda anual extraordinária na China – e muito mais.
Liu se confessou culpado de todas as acusações e não levantou objeções, segundo a mídia estatal. Ele inclusive chegou a derramar lágrimas no tribunal, dizendo ter experimentado “doloroso arrependimento e remorso” ao longo do ano passado.
O escândalo de Liu se tornou público em dezembro de 2012, quando Luo Changping – o vice-editor-chefe da revista de negócios chinesa Caijing que tem contato próximo com o chefe anticorrupção chinês Wang Qishan – expôs na mídia social chinesa Sina Weibo sua corrupção, fraude acadêmica e ameaças de matar sua amante. Liu foi investigado pelas autoridades em maio de 2013 e eliminado do Partido Comunista Chinês (PCC) em agosto daquele ano.
Numa reviravolta incomum aos processos judiciais, o Ministério Público manifestou-se em favor de Liu. Eles disseram que ele teve uma “boa atitude” desde o início da investigação. Mais de US$ 3 milhões em subornos que as autoridades não recuperaram inicialmente foram confessados por Liu por iniciativa própria, disseram eles. Liu e sua família também entregaram US$ 5,6 milhões em subornos como um gesto de cooperação, acrescentou o promotor. Liu ainda escreveu um ensaio sugerindo como implementar efetivamente as medidas de combate à corrupção, na esperança de se redimir fazendo uma boa ação, segundo o tribunal.
A confissão completa de Liu pode trazer pânico aos funcionários com quem ele tem laços estreitos, especialmente os funcionários poderosos do PCC que o promoveram pelas fileiras do regime. Estes incluem, em particular, o ex-líder chinês Jiang Zemin, que governou a China entre 1989-2002 e manteve grande influência no PCC e no governo por mais uma década. Na internet chinesa, Liu tem sido chamado de “guardião financeiro” da rede de Jiang.
Observadores chineses veem a punição formal de Liu como outro movimento para liquidar a influência de Jiang Zemin na política chinesa. Jiang é visto como o maior “tigre” por trás de funcionários expurgados como Liu Tienan, porque partes da economia chinesa estiveram durante anos nas mãos de aliados de Jiang, incluindo partes da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, o monopólio estatal do petróleo, partes do sistema energético estatal, etc. Essas áreas também têm sido o foco da campanha anticorrupção de Xi Jinping, em que uma série de funcionários alinhados com Jiang Zemin foram expurgados nessas áreas.
O veredito contra Liu será anunciado em breve, disse o tribunal. Seu filho pródigo enfrenta um julgamento separado.