Na antiga China, o jogo de Go era considerado uma arte junto com a música, a pintura e a poesia, porque assistindo uma partida entre profissionais se poderia perceber a beleza e o sentido de harmonia, proporção e estética do jogo como uma verdadeira forma de arte.
Há muitos e muitos anos, havia um homem chamado Yi Qiu. Sendo o mais habilidoso jogador de Go em sua região o apelidaram de “Go Yi Qiu”. Go Yi Qiu tinha uma reputação muito elevada entre os jogadores de Go, e uma grande influência entre o público, assim, certo dia, um vizinho muito invejoso teve a ideia de arruinar seu nome.
Uma tarde, enquanto Yi Qiu estava jogando Go, o homem enviou um músico para tocar o Sheng (um instrumento com treze canículas) perto dele. Yi Qiu estava tão distraído com a música melodiosa que perdeu o jogo.
Poucos dias depois, enquanto Yi Qiu estava em pleno jogo, uma pessoa se aproximou e começou a fazer perguntas inúteis dos princípios do jogo. Yi Qiu ficou tão atordoado que ele perdeu de novo. Consequentemente, as pessoas começaram a espalhar rumores, e diziam que o talento Yi Qiu era medíocre e que ele era um charlatão. Estes rumores lhe causaram grande tristeza e apreensão.
Um homem sábio, inteirando-se da situação, se apresentou para defender Yi Qiu já que estava seguro de que a perda de sua capacidade no Go não indicava mediocridade nem falta de habilidade.
Para incentivá-lo, o sábio lhe contou a história de um homem que uma vez foi o maior matemático do mundo. Um dia, trabalhando num problema de matemática, um grande ganso selvagem voou por cima de sua cabeça, emitindo um ruído estridente que o fez incapaz de resolver uma equação simples.
“Isso não significava dizer que ele era fraco em matemática”, disse a ele o sábio, “falhou simplesmente por causa da distração que o pássaro lhe causou.”
Esta analogia aplicada às partidas perdidas por Yi Qiu mostrava que o ocorrido não foi por causa da capacidade de seus adversários, mas pelas interferências externas. Seus espíritos foram distraídos por fatores externos, portanto, foram incapazes de se concentrarem nos cálculos ou na partida de Go.
“Os pequenos peixes que vivem nas profundezas e na escuridão não tem olhos, mas tem um ouvido muito desenvolvido. Devem concentrar-se em seu ouvido. Se você analisar com cuidado, trate sempre de ser constante. Para fazer algo bem, você deve permanecer constante e focado sinceramente em sua concentração. Não podemos ter sucesso se temos o espírito ausente, sem se envolver e sem concentração. Quanto àqueles que se dizem estudiosos e simplesmente leem em voz alta sem focar seu espírito sobre o estudo, mesmo que ouçam as palavras, não prestam atenção. Só enganam a si mesmos e aos outros”, disse o sábio.
Depois de escutá-lo, Yi Qiu seguiu o conselho do sábio homem: “permanecer constante”. Desde então, Go Yi Qiu ganhou cada partida e ninguém que teve a intenção de distraí-lo pôde consegui-lo.
O Go, simples e profundo
A história do Go remonta há uns 4.000 anos e suas regras se mantiveram praticamente inalteradas ao longo do tempo. O jogo é provavelmente originário da China ou do Himalaia, e se diz que o destino do Tibete foi decidido sobre um tabuleiro de Go quando o governante budista, para evitar a guerra e o derramamento de sangue, desafiou seus atacantes para uma partida de Go.
Madeira e pedra; círculos, linhas e retângulos. Com estes simples elementos, o Go evoluiu com paciente popularidade por quarenta séculos. Miniatura do universo, o jogo é tão simples que é profundo, tão profundo que muitos têm dedicado suas vidas em dominá-lo.
Diz a lenda que um andarilho viu dois anciãos jogando Go, se aproximou e perguntou: O que tem de interessante este jogo, que não estão presentes nenhum dos prazeres terrenos? Um dos anciãos respondeu: Para aqueles que olham com os olhos verão apenas um tabuleiro de Go, mas para aqueles que veem com o pensamento, o Go é o centro do universo, e entre as duas forças dispostas disputa-se a supremacia de um luta quase eterna.
As características do jogo
Estimado por aqueles que o jogam e desfrutado pelos que o apreciam sem serem protagonistas, o Go é um jogo de estratégia e suas regras são muito simples. Tal como o xadrez, os jogadores enfrentam as suas respectivas capacidades analíticas, mas no Go a intuição desempenha um papel muito mais importante.
O Go é um jogo de território. O tabuleiro, marcado por uma retícula de 19 x 19 linhas, pode ser considerado como um território que os dois jogadores terão de disputar. Um jogador tem um número suficiente de peças brancas chamadas “pedras” e o outro jogador peças pretas. O jogo começa com um tabuleiro vazio e os jogadores, em turnos alternados, colocam suas pedras, uma de cada vez, em pontos livres. Quem está com as peças pretas joga primeiro, e as pedras são colocadas nas intersecções das linhas, e não nos quadrados. Uma vez colocada uma pedra, ela não se move. No entanto, as pedras podem ser cercadas e, portanto, capturadas, sendo então removidas do tabuleiro como prisioneiras. Os jogadores geralmente iniciam a partida marcando as áreas que pretendem converter em seu território.
Durante o desenvolvimento, as lutas entre grupos de pedras inimigas conferem grande drama ao jogo, pois o resultado destas batalhas muitas vezes reflete-se em enormes trocas de território.
No final da partida, cada jogador conta um ponto para cada intersecção livre que tem em seu território, mais um ponto por cada pedra capturada. O jogador que somar mais pontos é o vencedor.
Capturar pedras é naturalmente uma forma de ganhar território, mas uma das sutilezas do Go é que a agressão nem sempre é rentável. As possibilidades estratégicas e táticas são infinitas, e o jogo sempre representa um desafio e uma diversão para jogadores de qualquer nível.
As personalidades dos jogadores se mostram muito claramente sobre o tabuleiro de Go. O jogo reflete as capacidades dos jogadores e a hora de equilibrar ataque e defesa, de fazer com que as pedras trabalhem de forma eficiente, de conservar a flexibilidade ao responder a situações mutáveis, de escolher o momento oportuno, de analisar exaustivamente uma posição e de reconhecer os pontos fortes e as fraquezas do inimigo.
Este artigo pertence a série “Histórias da antiga China”; para ler outros artigos da série, clique aqui.