Em um esforço para aumentar sua presença e influência na América Latina, a fim de ter acesso mais fácil às matérias-primas agrícolas e minerais do Sul, a China está com um de seus tentáculos voltados para a construção de grandes infraestruturas (ferrovias, estradas, Canal Nicarágua, etc.) destinadas ao transporte, no intuito de agregar um estímulo a mais para sua instável economia.
O polêmico projeto do trem interoceânico amazônico consiste na construção de uma linha férrea que ligaria o Atlântico (Brasil) e o Pacífico (Peru), atravessando regiões prístinas, com biodiversidade de valor inestimável, na selva amazônica brasileira e peruana, onde numerosos territórios indígenas se encontram estabelecidos.
O plano ferroviário ambicioso que a China está tentando desenvolver na América Latina – que levaria seis anos para ser construído e custaria cerca de R$ 39,04 bilhões – tem gerado indignação entre os povos indígenas, ativistas ambientais e grupos de defesa dos direitos indígenas.
A China e suas empresas, as mais beneficiadas
Se realizado, o gigante asiático seria o maior beneficiado em usufruir da linha férrea projetada em 5.300 km, da costa do Brasil ao Peru, possibilitando-lhe encurtar a distância para o transporte de mercadorias, reduzindo, assim, o custo e o tempo que seriam gastos em viagens marítimas.
O portal Diálogo Chinês informou que o presidente da Associação de Empresas Chinesas no Peru (PCEA), Gong Bencai, anunciou que a China International Water & Electric Corporation (CWE) é uma das empresas chinesas interessadas no projeto. CWE é uma subsidiária da gigante China Three Gorges Corporation (CTE), que era responsável pela construção da controversa barragem das Três Gargantas na China.
O alto custo social e ambiental da interoceânica amazônica
No passado, projetos semelhantes deixaram feridas profundas na selva amazônica, que ainda não foram cicatrizadas. A construção da ferrovia interoceânica amazônica causaria devastação e desolação para a vida dos povos indígenas locais, ao expor suas regiões para exploração industrial, mineração e comérico ilegal de madeira, promovendo a colonização de seus territórios e o uso indiscriminado dos seus recursos, observou Survival, uma ONG especializada em direitos dos povos indígenas.
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“Todo o projeto é uma grande promessa, mas deve ser bem feito ou pode tornar-se um pesadelo”, disse Kevin Gallagher, professor da Universidade de Boston e autor de estudos sobre a relação China-América Latina, em um diálogo realizado pela BBC . “Seria uma ilusão acreditar que não vai haver um impacto”, disse Paulo Adario, do Greenpeace.
“Os custos sociais e ambientais de um projeto, a forma como tem sido promovido, podem ser muito maiores do que o custo das obras”, diz Pedro Tipula, do Instituto Common Good (IBC), com sede em Lima, de acordo com o portal Diálogo chinês.
O diretor da Survival, Stephen Corry, disse no site da instituição que tais projetos “não são nada mais do que o roubo das terras indígenas e, como sempre, são realizados em nome do “progresso e desenvolvimento”.
Corry foi categórico sobre o futuro dessas populações, em caso de concretização da obra. “Muitos não sobrevivem à devastação de suas vidas e suas terras. Não se engane: para os povos indígenas esta ferrovia será um genocídio.”
Ninawa Kaxinawá, líder indígena cuja comunidade vive perto de uma seção da linha ferroviária proposta, disse à Survival: “Esta linha ferroviária é perversa e ameaça nosso povo. Para nós indígenas, e para os nossos familiares não contactados, este projecto representa um perigo mortal, que poderia destruir nossa floresta e as nossas vidas!”.