Internet estimula ativismo no Vietnã

24/05/2012 03:00 Atualizado: 24/05/2012 03:00

Manifestantes vietnamitas gritam slogans anti-China enquanto marcham durante um comício anti-China sobre as tensões no Mar da China Meridional, numa rua próxima à embaixada da China em Hanói em 17 de julho de 2011. (Hoang Dinh Nam/AFP/Getty Images)Como em muitos outros países autoritários, a internet abriu as portas para a dissidência e a crítica social, mas no Vietnã, ela também conecta a diáspora e atrai críticas às relações exteriores do país.

O Vietnã adquiriu conexão de internet na década de 90, e desde então os usuários no Vietnã têm aumentado rapidamente para 24 milhões de usuários em 2010, ou 27% da população.

Nos últimos anos, a explosão de ferramentas de mídia social trouxeram novos desafios à capacidade do partido estatal de controlar a opinião pública. Blogues e Facebook oferecem fontes alternativas de informação, que moldam o comportamento de jornalistas e das autoridades na vida real.

A internet tem facilitado a auto-organização entre os ativistas sociais, e suas muitas ferramentas de comunicação lhes permite reunir-se virtualmente, fortalecer amizades, e adquirir coesão como uma comunidade.

Blogues e redes sociais têm constituído uma esfera ciberpública que se expande além das fronteiras físicas da República Socialista do Vietnã, englobando a significativa diáspora vietnamita. Vietnamitas dentro e fora do país se conectam uns com os outros por blogues e Facebook.

Assuntos tabus

Discussões políticas sobre temas considerados tabus encontram fóruns abertos no ciberespaço. O mercado de ideias na blogosfera é muito mais diversificado do que os milhares de jornais oficiais, revistas, canais de televisão e portais da web rotineiramente controlados e censurados pelo Estado.

Intelectuais vietnamitas, cujas identidades são conhecidas do público, começaram seu blogue Bauxita Viet Nam em 2008 para transmitir sua “crítica multilateral” no controverso projeto de mineração no Planalto Central do Vietnã.

Logo, suas postagens de blogue abrangeram mais questões do que o projeto bauxita em si, desde reformas constitucionais a debates políticos em defesa da causa democrática, especialmente através do caso do advogado-ativista Cu Huy Ha Vu, detido em novembro de 2010 e preso por “propaganda contra o Estado socialista”.

A mídia estatal tem falado sobre o Bauxita Viet Nam como um “site reacionário”. O blogue, depois de ter sido invadido várias vezes, é agora um site Boxitvn.net, com dois blogues de backup. As autoridades bloquearam o acesso a estas páginas. Mas os internautas no Vietnã sabem como usar servidores proxy para ignorar o firewall. O Bauxita Viet Nam tornou-se um fórum de intelectuais dentro e fora do país para contribuir com suas visões críticas em debates políticos mais importantes e eventos sociopolíticos.

Um blogue famoso no Vietnã, o Anh Ba Sam, ou Murmurador, em anhbasam.wordpress.com, é dirigido por um ex-policial em Hanói, que também divulga sua identidade. Ele compila e analisa várias vezes ao dia todas as notícias e análises sobre o Vietnã de todos os tipos de websites e blogues: websites de mídias estatais, agências de notícias estrangeiras, blogues vietnamitas de artistas, ativistas políticos, jornalistas, poetas dentro e fora do país, e às vezes websites que são considerados pelas autoridades vietnamitas como “reacionários” e “sensíveis”, incluindo websites e blogues dirigidos por ativistas e grupos pró-democracia.

As pessoas vão a este blogue para obter informações sobre questões que são censuradas em mídias estatais, assim ele se tornou o blogue mais lido. Este blogue de notícias é a origem de uma piada que circula no ciberespaço vietnamita que resume o estado de coisas: O Murmurador comunica notícias oficiais, enquanto a mídia oficial apenas fofoca.

Pressão sobre a mídia oficial

Apesar deste mercado livre e vibrante de ideias no ciberespaço, algumas pessoas permanecem céticas sobre o que essa liberdade online significa para uma mudança real. Mas vários incidentes recentes têm revelado como o ativismo online e o da vida real podem ser complementares e como a internet mudou o debate político e o ativismo político na vida real.

No caso da expropriação de terras de Tien Lang no início de 2012, em que o cultivador de camarão Doan Van Vuon acabou usando armas caseiras em desespero para resistir ao assédio armado de oficiais locais, da polícia e do exército, a comunidade de blogueiros provou seu poder.

Jornalistas-blogueiros tomaram a iniciativa de visitar a família Vuon e investigar o incidente, e publicaram suas descobertas independentes e recomendações em seus blogues sobre o confisco ilegal das terras de Vuon e a destruição de sua casa. Em blogues e no Facebook, as pessoas circularam fatos novos, análises alternativas e contra-argumentações aos discursos das autoridades locais.

As fontes alternativas de informação na blogosfera tiveram um impacto sobre como jornalistas da mídia estatal perceberam e lidaram com o caso.

“O Facebook e blogues fornecem uma nova opção para os jornalistas e os cidadãos exercerem sua liberdade de expressão”, disse um jornalista veterano do Vietnã. “Graças a estas novas ferramentas, mesmo quando a mídia oficial recua e se confina, um espaço para a livre expressão ainda se abre. Blogues e o Facebook modelam o comportamento dos repórteres, porque antes as autoridades e a maleficência da mídia estatal não era descoberta imediatamente como é agora. As informações de blogues e do Facebook colocam pressão sobre a mídia oficial para fazê-los dizer a verdade em alguns casos, como no caso de Tien Lang.”

Ativismo político

Blogues e Facebook também fazem a diferença no ativismo político. Em junho e julho de 2011, na sequência de um ataque de barcos de patrulha chineses a um navio de pesquisa de petróleo vietnamita na costa sul-central do Vietnã, protestos anti-China foram realizados em todos os domingos em Hanói e Saigon durante dois meses, antes que as autoridades conseguissem suprimi-los.

Protestos similares anti-China foram realizados em dezembro de 2007 em Hanói, e em 2008, em Saigon, mas então os manifestantes não puderam organizar um segundo protesto. Um jovem manifestante do domingo sugeriu que o Facebook fez a diferença em 2011. A conectividade e intimidade no Facebook ajudaram a espalhar as vozes de apelo para resistir à China e elaborar estratégias para contornar o controle das autoridades.

As autoridades conseguiram deter os manifestantes de se reunirem aos domingos nas ruas. Mas eles não conseguiram impedir os ativistas de formar redes que continuam a se fortalecer, apesar do assédio e controle.

Na realidade, os manifestantes de domingo não pararam seus protestos. Eles apenas deslocaram-nos das ruas para muitos outros locais, e continuam a protestar por diferentes meios de expressão. Eles distribuem e usam camisetas, capas de chuva e bonés estampados com o símbolo impresso Não-U e o slogan, “Diga não à linha da língua de boi” (com o símbolo U cortado, também conhecido como língua de boi, representando as reivindicações chinesas de soberania pela maior parte do Mar da China Meridional), como uma maneira de continuar seus protestos de forma individual.

Eles formaram o clube de futebol Não-U para jogar aos domingos, outra continuação simbólica dos protestos de domingo, e formaram uma rede de amizade para apoiar-se mutuamente em momentos difíceis, quando a polícia os trata como criminosos por suas atividades patrióticas.

Suas atividades são relatadas nas páginas de membros do Facebook e blogues, onde eles compartilham fotos dos eventos, publicam discursos de conferências, e informam suas redes online da pressão das autoridades. Manifestantes do domingo não são apenas usuários do Facebook ativos e blogueiros. Eles realmente desafiam o poder na vida real.

É verdade que os que procuram exercer suas liberdades políticas ainda estão sempre em risco. As pessoas estão sendo detidas, processadas e presas por causa de blogues, protestos, ou organização de grupos políticos. O partido estatal pode sempre optar por usar seu aparato coercitivo para silenciar a dissidência. Porém, fontes alternativas de informação e interação no ciberespaço têm contribuído para expandir os limites do debate político e facilitar redes de indivíduos que compartilham ideias similares e capacitá-los como uma comunidade para desafiar o poder. É mais difícil do que nunca para o partido estatal controlar as mentes de seus cidadãos e seus laços humanos.

Huong Nguyen é um pesquisador do Centro para a Democracia Constitucional e estudante de doutorado em direito e democracia na Universidade de Indiana em Bloomington. Copyright © 2012, Centro Yale para o Estudo da Globalização.