Intelectual uigur sentenciado à prisão perpétua na China por pensar

24/09/2014 11:43 Atualizado: 24/09/2014 11:43

Num único termo que chocou observadores e deixou sua família cambaleante, o estudioso de economia e uigur moderado Ilham Tohti foi condenado e preso em 23 de setembro pelo resto da vida, após ser julgado pelo Tribunal Popular Intermédio de Urumqi, capital da Região Autônoma Uigur de Xinjiang, sob a acusação de “separatismo”. As economias de toda a vida de sua família também foram confiscadas.

Ilham Tohti, que ensinou na Universidade Minzu, em Pequim, era amplamente visto como um dissidente, embora de voz razoável e moderada, sobre as políticas étnicas do Partido Comunista Chinês em Xinjiang, o lar dos uigures, um povo muçulmano de língua turca.

Ele se opunha a Xinjiang se tornar um país independente – como implicado na acusação de separatismo –, e em vez disso escrevia sobre a necessidade de um diálogo mais aberto sobre as causas da desconfiança e tensão entre chineses da etnia dominante han e a minoria uigur.

Tohti administrava um website, escrevia ensaios e dava entrevistas à mídia ocidental, discutindo e criticando as políticas oficiais. Por isso, ele foi assediado e vigiado por vários anos, e agora, depois de ser levado de volta para Xinjiang pelas autoridades de segurança do regime comunista chinês, foi condenado à prisão perpétua. A punição extrema de Tohti pode ser vista pelos uigures como a extensão lógica da política repressiva de minorias que ele criticava.

Nos últimos anos tem havido um número crescente de relatos na mídia estatal chinesa, impossível de verificar, da violência uigur contra chineses han. A propaganda oficial tenta retratar estes atos como terrorismo islâmico motivado ideologicamente, enquanto uma visão mais amplamente compartilhada é que essas são medidas desesperadas de um povo que se tem sido aterrorizado por décadas.

No ano passado, a mídia estatal oficial de Xinjiang reportou repetidamente a respeito da crescente pressão sobre os costumes e modos de vida uigures, incluindo tentativas de impedir a comemoração do festival muçulmano do Ramadã, e restrições, por exemplo, ao uso de vestimentas muçulmanas, crescer barba e frequentar escolas religiosas. A presença de forças de segurança também aumentou enormemente, com acusações e condenação em massa, além de uma série de execuções sob a justificativa de terrorismo.

Mais chineses han estão sendo enviados para a região e autoridades locais têm oferecido incentivos para casamentos entre chineses han e uigures, o que é visto como uma política explícita de assimilação étnica. O professor-emérito Bruce Jacobs da Universidade Monash da Austrália caracteriza o domínio chinês em Xinjiang como nítido colonialismo.

O Congresso Mundial Uigur, sediado na Bélgica, afirmou: “Condenamos nos termos mais fortes possíveis” a sentença de Tohti. “Esse resultado é completamente inaceitável e ilustra claramente a falta de humanidade e respeito pelos direitos legais básicos por parte das autoridades chinesas”, disse o comunicado.

O crime

A lei sobre separatismo da República Popular da China descreve o crime de um indivíduo contra a “ditadura democrática popular e o sistema socialista”.

Atos que constituem separatismo, segundo a lei, incluem “incitar a desarmonia étnica”, “criar caos étnico” e “minar a unidade nacional e étnica”. As atividades específicas que entram em conflito com estas disposições são determinadas pelos tribunais, que por sua vez são controlados pelas autoridades do Partido Comunista.

Nicholas Bequelin, um especialista em Ásia da Human Rights Watch, escreveu no Twitter: “Em julgamentos como o de Tohti, o teste para o tribunal é se o réu criticou as políticas minoritárias do Partido Comunista ou não. Nada mais.”

Um moderado pelos próprios escritos

Um exame dos escritos de Tohti revela uma figura diferente da retratada na propaganda oficial. Num artigo de Tohti intitulado “Meu sonho e a carreira que escolhi”, publicado no website estrangeiro Democratic China, ele escreve sobre o que o levou a carreira de estudar as tensões étnicas entre chineses han e uigures.

“Depois de viajar pela Ásia central, Rússia, Sudeste Asiático e outras regiões, eu vi tantos casos vívidos de morte por vingança devido a conflitos étnicos, instabilidade política e falhas na mudança social. Isso gerou em mim um forte desejo de evitar que tal tragédia se repetisse na China. Isso me fez gradualmente investir todos os meus esforços na pesquisa e estudo da questão em Xinjiang e da questão na Ásia central.” Em outra linha, ele diz: “Estou preocupado com minha cidade natal, que meu país entre em caos e se fragmente.”

As sensibilidades políticas em torno da discussão normal das questões étnicas na China têm agravado o problema, escreve ele. “Não há sequer discussões públicas básicas sobre a questão entre intelectuais uigures e han. É uma situação extremamente anormal e terrível.”

Ele estabeleceu o website Uighurbiz “para permitir que pessoas das etnias uigur e han se comuniquem numa plataforma comum”, diz uma declaração. E continua: “Há naturalmente argumentos fortes quando existe comunicação, mas acredito que a controvérsia não é assustadora. É a suspeita e o ódio originados do silêncio que é assustador.”