A obesidade infantil é um reflexo da forma da nossa sociedade ocidental, onde se privilegiam as atividades intelectuais (saudáveis ou não) em detrimento das atividades físicas, onde se estimula constantemente o consumo de bebidas e guloseimas cheias de açucar e fast-foods, e onde o entretenimento vazio (fútil) é a mola que impulsiona a hipnose coletiva.
Essa parece uma crítica amarga, mas apenas serve de alerta para as escolhas, direcionamentos e os rumos que viemos tomando enquanto sociedade globalizada e suas consequências contra o desenvolvimento saudável das pessoas.
O documentário Muito Além do Peso mostra a realidade das crianças brasileiras que enfrentam o problema da obesidade: a discriminação que sofrem, a vontade de emagrecer, a sedução por parte da indústria alimentícia etc. Mostra a falta de opção por alimentos saudáveis e por uma vida saudável, devido aos ambientes sociais serem transformados pelos estímulos da indústria alimentícia.
Mostra também realidades assustadoras, como, por exemplo, que 56% dos bebes brasileiros tomam refrigerantes frequentemente antes do primeiro ano de vida – sendo que os refrigerantes contêm uma grande quantidade de açucar, além de uma série de produtos químicos artificiais; coisas que fazem muito mal para a saúde e o desenvolvimento das crianças.
De acordo com os dados do documentário, 33,5% das crianças brasileiras sofrem de sobrepeso ou de obesidade, ou seja, 1/3 da população infantil tem sido transformada em potenciais doentes a caminho de doenças degenerativas que vêm minando a humanidade contemporânea. Nas palavras do médico endocrinologista, Amélio F. de Godoy Matos, chefe do Serviço de Metabologia IEDE: “A obesidade está relacionada com as maiores pandemias modernas…com o diabetes, que é uma pandemia moderna, e ela é a causa maior do diabetes tipo 2. Ela está relacionada com as doenças vasculares, que é uma outra pandemia – é a maior causa de mortalidade do mundo atual, e ela vem da obesidade, do excesso de peso. Ela está relacionada com a depressão, ela está relacionada com o estresse; ela está relacionada com alguns tipos de câncer. As grandes pandemias modernas têm na sua base um excesso de peso.”
O mercado infantil multimilionário
No documentário pode-se constatar como as empresas que produzem alimentos destinados aos jovens e, especialmente, às crianças, investem pesado em estratégias comerciais para seduzir e cativar o público infanto-juvenil: elas obtêm lucros astronômicos a partir desse mercado e buscam sempre novas formas de cativar e estimular o consumo de seus produtos.
As crianças são tratadas como fontes de lucros perenes, para as quais se contrói um mundo especial baseado em formas e sabores extremamente sedutores: muitas grandes empresas alimentícias se especializam em criar esse mundo “doce”, agradável, hipnótico, que seduz e encarcera intencionalmente as crianças, tornando-as viciadas em seus produtos “encantados”. Uma das mães entrevistadas teve sua própria experiência nesse sentido trabalhando para o Mcdonald’s: “Eu trabalhei para o Mcdonald’s durante um ano e meio, fui gerente de projetos de TI, e eu deixei de trabalhar para eles, porque eu me sentia trabalhando para a indústria bélica, para a indústria de cigarros, isso tendo em casa uma consumidora [sua filha, Carol, de 8 anos]…Eu sentia que a Carol gostava tanto de ir no Mcdonald’s, tanto, por causa do brinquedo [brinquedos oferecidos em troca da compra de seus produtos]…É uma indústria que vive desse tipo de exploração, desse apelo para as crianças. Eu me sentia uma traficante, trabalhando com os vendedores de crack, tendo um viciado em casa…”
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Um estrago gigante para a sociedade e os indivíduos
De fato, essa indústria do fast-food, das bebidas açucaradas viciantes e das guloseimas encantadas funciona contra a própria saúde social de diversas formas: desvia a atenção das crianças do que é essencial para o fútil; estimula o engano através da inversão de valores, excluindo os alimentos saudáveis e importantes e incentivando o consumo de alimentos de baixa qualidade nutricional; é responsável pelo excesso de peso das crianças e adolescentes e forma uma base negativa nas impressões psico-sensoriais das mesmas, tornando-as viciadas em alimentos saborosos e geralmente danosos à saúde, contribuindo assim para as pandemias de doenças degenerativas, como o diabetes, as doenças cardiovasculares, o câncer, e contribui igualmente para estados psicológicos alterados, como a depressão, o estresse, a baixa auto-estima e outros.
O triste alerta que é dado no final do documentário é: de cada 5 crianças obesas, 4 permanecerão obesas quando crescerem… Quem se responsabilizará por elas? Quem se responsabilizará pela sua falta de saúde e pela sua infelicidade? Quem se responsabilizará pela sociedade problemática que estamos criando para o futuro?… Cabe a nós decidirmos se queremos esse futuro e se amamos nossas crianças a ponto de negarmos esse jogo e essse tipo de mentalidade doentia que se aproveita da inocência das crianças para enriquecer.
Veja o documentário Muito Além do Peso:
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