Índíos conseguem transferir reunião com secretária de cultura para a ‘Aldeia Maracanã’
RIO DE JANEIRO – Indígenas representantes de pelo menos 12 etnias distintas ocupam desde as 16h30 desta segunda-feira o edifício do antigo Museu do Índio, ao lado do estádio Maracanã, na Tijuca, zona norte do Rio. Segundo eles, a ocupação é uma forma de pressionar as autoridades pela retomada do prédio, após uma audiência pública sobre a questão no Tribunal Regional Federal (TRF) do Rio de Janeiro no início da tarde, na Praça Mauá, no centro da cidade, que poderia ter concedido reintegração de posse aos índios. Como isso não aconteceu, as lideranças decidiram reocupar o espaço, que entendem ser dos índios por direito.
Os indígenas ocuparam o segundo andar do prédio, de difícil acesso, cantando, dançando e bradando “Aldeia resiste”. Manifestantes, entre eles black blocs, também correram para o local para apoiar a ação e permaneceram no térreo. A devolução do imóvel do século XIX aos índios começou a ser concretizada na terça-feira passada (30), após reunião entre a secretária estadual de Cultura, Adriana Rattes, e lideranças indígenas. O retorno dos índios ao prédio histórico também é uma das reivindicações dos protestos que sacodem a cidade e o país desde junho.
O líder indígena e professor Urutau Guajajara ligou para Adriana Rattes informando sobre o ato e propondo antecipar a reunião que terão amanhã para hoje, na ocasião da ocupação, no local, aproveitando também que mais etnias estariam reunidas. A secretária inicialmente hesitou, dizendo que não concordava com a ocupação, mas logo aceitou se dirir ao local. Às 18h a tensão aumentou quando a Tropa de Choque se posicionou para invadir o local caso os manifestantes não descessem. Os índios pediram compreensão dizendo que o protesto era pacífico e prometeram descer assim que a secretária chegasse, o que foi aceito pelo coronel Santana.
Com a chegada de Rattes, às 19h, a polícia se retirou do local, a seu pedido, atendendo aos ocupantes, e os índios desceram. O encontro, que se deu dentro do imóvel às 20h e durou cinco minutos, intermediado pelo advogado dos indígenas, Arão da Providência, ocorreu em volta de uma fogueira após um ritual de celebração da retomada do local.
A secretária pediu para que a discussão fosse retomada amanhã, dia 6, e reafirmou que a pauta será realmente o esboço de um projeto e modelo de gestão para o lugar como um centro de referência indígena. “Na última reunião, todos participaram com muito boas ideias e temos que discutir a forma de implementar essas ideias”, disse a Adriana, em referência à reunião do dia 30.
Rattes também aceitou transferir a reunião, inicialmente prevista para ser realizada na sede da secretaria, para o local, e autorizou a permanência dos índios, para pernoitarem e se prepararem para o encontro, marcado para as 14h. Os índios convocam a população e também solicitam doação de mantimentos como água, leite, colchonete, cobertor e higiene pessoal.
Com mais lenha na fogueira, pinturas corporais, chocalhos, danças e contorias, os rituais prometiam adentrar a madrugada. Do alto da torre do edifício, índios fazem vigília de segurança, e, na entrada, controlam o fluxo de pessoas. Doações de alimentos começaram a chegar às 20h10, permitindo a permanência dos índios no lugar.
Emancipação e intercâmbio
Única mídia no local a fazer transmissão ao vivo, o veículo independente Mídia Ninja passou o dia com os índios. Para o advogado dos indígenas da Aldeia Maracanã, Arão da Providência, a ocupação é autêntica e legítima. “Essa reintegração de posse não foi feita nem pelo estado, pela justiça, pelo ministério público, mas pela população na rua, pelo ‘tribunal popular'”, afirmou aos ‘ninjas’.
O professor Baré, da etnia Aruak, criado no Amazonas, explica que a ideia é fazer uma universidade indígena no local. “A projeção é que daqui há 20, 30 anos, índios possam estar saindo daqui formados, com um futuro brilhante pela frente, que os povos indígenas possam de fato tomar as rédeas de seus destinos”, disse ao veículo, citando a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU.
Graduando pela UERJ, Baré encontrou na educação o caminho para defender o seu povo e promover a diversidade cultural, beneficiando a população carioca e brasileira. Para ele, o fato de o TRF não ter concedido a reintegração mostrou que a decisão passa da alçada de Cabral. “Mas a força do bem, da educação e da emancipação passa por cima de qualquer máfia que possa existir”, completou, concebendo uma sociedade mais fraterna e uma democracia mais participativa.
Para Kawa Awa, de 23 anos, a retomada do edifício é simbólica e resultado da resistência indígena e apoio da população. “Há cinco meses atrás nós estávamos sendo violentamente expulsos daqui, com balas de borracha, gás de pimenta e bombas de efeito moral. Hoje nós demos a volta por cima e foi a polícia que teve que sair”, disse aos ‘ninjas’.
Esposa de Kawa, Majara, da etnia Tabajara e também membro da Aldeia Maracanã, disse em entrevista com o Mídia Ninja que o índio não tem restrição e que quem restringe o índio é o branco. “Que a dignidade humana possa ser respeitada na cidade, na favela, na floresta, onde o ser humano estiver.”
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