Igualdade Social – Impossível, perigosa e maléfica

14/01/2014 16:57 Atualizado: 14/01/2014 16:57

Muito se fala em igualdade social, mas raras são as ocasiões em que o olhar pousa sobre as consequências nefastas de se perseguir tal meta. Igualdade virou um sonho dos mais lindos na retórica excitada das esquerdas, contudo, sua aplicação resultou nos piores pesadelos vividos pela humanidade, pois enquanto muito eram iguais, alguns poucos eram mais iguais que os demais.

A brutalidade desencadeada pela busca frenética da igualdade sob a égide de “justiça social” é tamanha que levou (e ainda leva) civilizações ao colapso. Esse périplo utópico extermina as relações sociais baseadas nos “bons valores e costumes” e nutre uma imensa inveja e descomunal ódio de uma pretensa “maioria” – na verdade, um agregado de diversas minorias revoltadas, manipuladas pelo pálio de suas insatisfações – contra aqueles que são considerados os culpados por todas as mazelas sociais, os bodes expiatórios convenientemente criados para canalizar os ódios da massa e isentar os indivíduos da responsabilidade pelas consequências dos próprios atos, cujo nome muda de tempos em tempos: nobres, clero, senhores feudais, burgueses, capitalistas… e, mais recente, a classe média.

A classe média possui tudo aquilo que desperta os piores sentimentos na esquerda: trabalho, crescimento financeiro e pessoal por meio do próprio esforço, do mérito, da mobilidade social, que permite ao indivíduo ascender de classe sem a intervenção do Estado babá, etc. É a encarnação de tudo que a esquerda vampira pretende “combater”, devorar, aniquilar…

Quando se busca igualdade e, obviamente, “justiça social”, coloca-se um falso interesse coletivo acima dos interesses individuais. Em outras palavras, procura-se aniquilar a essência do indivíduo, ou seja, a busca pela satisfação de suas necessidades individuais em nome do coletivo, deslocando-o de sua condição de indivíduo para a de “massa”.

Deixamos de pensar por nós e passamos a pensar coletivamente, ou seja, em todos. Não interessam mais nossas vontades, desejos, anseios, interesses e necessidades, só os da massa. Anula-se a pessoa em nome do “bem maior” de “todos”. Um sonho bonito de se vender, mas impossível de se cumprir.

Todas as experiências de anular o indivíduo e gerar a igualdade na luta pela “justiça social” acabaram em abominações e terror. Os grandes exemplos continuam os mesmos: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e a China maoísta.

Só entre 1933 e 1934 foram levados à morte 14,5 milhões de ucranianos, sendo a maioria destes por meio da fome propositalmente instaurada. Outros dois milhões (aproximadamente) foram executados por “crimes” como roubar uma batata, ou poucos grãos para subsistência. O caso ficou conhecido como o Holodomor ucraniano e foi causado pelo regime comunista de Joseph Stalin na URSS.

Os ucranianos tinham uma forte identidade nacional e resistiam às coletivizações forçadas, com a desculpa da obtenção da “igualdade” e fim da “exploração” do proletariado. Contudo, nada causou maior exploração desses indivíduos do que o próprio regime que deles exigiu que fossem produzidos muito mais alimentos do que a capacidade que possuíam para tal (após a transformação das propriedades privadas agrícolas em fazendas estatais gigantescas), para abastecimento das principais cidades e centros urbanos da URSS. Stalin desejava quebrar a identidade nacional e destroçar a “humanidade” dos ucranianos para que fossem mais um povo oprimido e submisso.

Não foi considerada a impossibilidade do cálculo econômico numa economia planificada, ou seja, a impossibilidade de se estabelecer uma relação entre oferta e demanda para alocar corretamente os recursos. Resumindo, não é possível ao Estado calcular quanto realmente deve ser produzido e de que maneira deve ser distribuído para que atenda à demanda existente. O Estado também não pode calcular a demanda real com a ideia de atender a “todos” como uma coletividade uniforme. Sem a possibilidade de precisar a demanda, a produção e a logística de distribuição para comercialização, não foi possível gerir eficientemente os recursos disponíveis, resultando em escassez para a maioria, enquanto havia abundância para uma minoria pertencente ao “governo”. Como o Estado não é guiado pelo sistema de preços e pelo mecanismo de lucros e prejuízos este não conseguirá tomar uma decisão racionalmente, logo, produtos e serviços deixam de ser ofertados em locais onde há maior demanda por eles.

A oferta de produtos e serviços “gratuitos” (pagos pelos “contribuintes”) gera uma demanda infinita, sendo a oferta limitada o que se obtém é a escassez. Além disso, se não são os consumidores por meio da oferta e demanda que definem os preços, não há como saber o quanto é necessário investir, distribuir e comercializar (ou mesmo entregar “gratuitamente”) para atender a todos da melhor maneira possível, satisfazendo a todas as necessidades.

O Estado pensa: “Devo enviar mais farinha para A ou para B”, mas não consegue tomar a decisão racionalmente, pois não sabe qual a demanda nessas regiões pelo produto. Ao enviar para a região B por haver mais pessoas (por exemplo) o Estado terá que se perguntar: “Quanto devo enviar para que não falte farinha?” Contudo, não saberá responder pela impossibilidade de se medir a demanda e alocar corretamente os recursos. Se a região tiver demanda menor por farinha do que o Estado apostou que teria, então haverá excesso, enquanto se a demanda for maior, haverá escassez, o que ocorreu em todas as tentativas de se aplicar o socialismo-comunismo. Ironicamente, a máxima socialista-comunista de que “para que um receba mais, outro obrigatoriamente terá que receber menos” (como se a economia fosse um jogo de soma zero) é possível de ocorrer, exceto no próprio sistema socialista-comunista.

Outro detalhe interessante é que, como não há concorrência, o Estado não precisa se preocupar em investir na qualidade de produtos e serviços, pois é o único fornecedor/prestador, logo, além da escassez há também a baixa qualidade dos mesmos. Além de haver menos do que o necessário, ou mais, porém pessimamente alocado, os produtos e serviços disponíveis são ruins. Considere essa realidade na área da saúde ou da alimentação e o que haverá será desnutrição, fome e mortes, que poderiam ser evitadas. Considere isso na educação e o que se terá será um povo alienado, manipulável e ignorante.

Essas distorções criam os conflitos de classes, pois uns (do Estado e elites por ele criadas e mantidas) terão tudo, enquanto os demais (o povo) não terão nada. Mais uma vez, ironicamente, o que os esquerdistas dizem ser próprio do capitalismo só ocorre no sistema socialista-comunista.

Voltando à URSS. A pobreza foi socializada à população, enquanto surgiu uma elite estatal poderosa e abastada, mais exploradora e com recursos bem maiores que os bodes expiatórios da revolução (burgueses, ou Kulaks, no caso dos “grandes” fazendeiros, até o ponto em qualquer um que tivesse um fragmento de terra ou duas vacas era considerado um Kulak).

Na China maoísta ocorreu quase o mesmo, porém, a coletivização e tentativa de desenvolver a indústria à força mataram 45 milhões de chineses entre 1958 e 1962, segundo documentos do Partido Comunista Chinês (PCC), devido ao “plano” conhecido como “Grande Salto para Frente”, cujo slogan era “superar a Inglaterra em 15 anos”, pois esta era a maior potência industrial na época. No entanto, o ditador chinês Mao Tsé-tung não considerou a realidade que o desenvolvimento econômico não é controlável ao bel prazer do Estado, que não é possível efetuar o cálculo econômico na economia planificada ou centralizar e manipular a economia eficazmente.

Ele também não considerou o caminho trilhado pela Inglaterra até se tornar a maior potência industrial da época. Em seu devaneio narcisista, Mao acho que realmente era capaz de forçar a China a se tornar uma Inglaterra mais rica e desenvolvida com um plano de 15 anos, que durou apenas quatro anos e resultou na miséria do povo e difusão da fome. Os alimentos, inclusive, foram utilizados como arma do Estado para exterminar todos os considerados inimigos da “causa”.

Como dito anteriormente, não só não houve igualdade como uns se tornaram mais iguais do que outros. Saiu-se da desigualdade relativa para a miséria absoluta. Sim, pois a desigualdade não é por si ruim. Se eu ganho mil reais ao mês e meu vizinho ganha R$1.001, logo, há R$1 de desigualdade entre nós, contudo, não será a desigualdade que me causará qualquer mal. Se eu ganhar R$100 mil e meu vizinho R$725 a desigualdade é muito maior, mas tudo dependerá de como cada um de nós fará a gestão desse dinheiro. Ora, eu posso ganhar R$100 mil e torrar R$120 mil, ficando em pouco tempo na miséria, enquanto ele pode arrumar um meio de gerir melhor os R$725 que ganha, investindo parte deles em qualificação profissional, por exemplo, ou não investir nada e apenas gerir eficientemente para a própria subsistência e aproveitar planos de carreira, cursos gratuitos, entre outros, como meio de melhorar a qualidade de sua mão de obra, valorizando-a e obtendo maior renda em longo prazo.

Portanto, é importante salientar que enquanto a desigualdade é relativa e não causa danos, a maneira como gerimos nossos recursos (profissionais, financeiros, materiais etc.) pode nos levar à miséria, sendo esta absoluta e causadora das mazelas sociais como a fome, a falta de acesso a itens básicos de higiene e limpeza, precarização das moradias etc.

Mas numa sociedade livre, sem a perseguição da “igualdade” e da “justiça social”, onde os indivíduos podem empreender e buscar a ascensão profissional, pessoal, social e financeira por meio do próprio esforço, mérito e trabalho duro, há a possibilidade da mobilidade social entre as classes, ou seja, um pobre pode se enriqueces ou atingir a classe média, melhorando sua vida e de sua família, assim como um indivíduo rico ou de classe média pode gerir mal os próprios recursos e cair na miséria. Tudo dependerá apenas do próprio indivíduo, sendo este responsável pelas consequências de suas escolhas e ações.

Já a tentativa de se criar uma sociedade “socialmente justa” e “igualitária” surgiu uma elite abastada mancomunada com o poder estatal, enquanto o povo sofria na miséria sem a possibilidade da mobilidade social (a não ser por meio do partido e da obtenção de cargos na máquina administrativa estatal, que mesmo assim seria bem limitado). Esta é uma sociedade planificada, onde os miseráveis são mantidos nessa condição, enquanto os governantes sobejam com a exploração da coletividade e controlam a escada de ascensão social. Por fim, na busca incessante e burra pela “igualdade”, surgiu as maiores desigualdades da história, gerou-se uma imensa miséria e perdeu-se a identidade e a liberdade individual, com milhões de vidas desperdiçadas em nome de uma utopia diabólica que no papel e discursos inflamados de seus adoradores traveste-se de oitava maravilha do mundo, mas na prática é o pior pesadelo que os seres humanos já tiveram e o maior terror que já vivenciaram.

A única igualdade benéfica que deve existir e ser preservada é a igualdade de todos os indivíduos perante a “Lei” (que deve ser justa e igual para todos). Esta é justamente a igualdade atacada pela esquerda que deseja sempre que sua mascote preferida: a(s) minoria(s) oprimida(s) seja mais igual que os demais. Nesse cenário, a igualdade absoluta prometida, sendo na verdade injusta e desigual, revela-se maléfica para o indivíduo.

Roberto Lacerda Barricelli é autor de blogs, jornalista, poeta e escritor

Esta matéria foi originalmente publicada pelo Instituto Liberal