Hong Kong perde suas liberdades à medida que é assimilada pela China

07/04/2014 12:04 Atualizado: 07/04/2014 12:04

Dois proeminentes líderes políticos veteranos de Hong Kong estão visitando os Estados Unidos para expressar sua preocupação com os recentes ataques à democracia em Hong Kong e para alertar a comunidade internacional de que a democracia lá está se perdendo. As liberdades e os direitos que o povo de Hong Kong costumava ter estão sendo minados, disseram eles.

“Por muitos anos, Pequim tem adiado a democracia”, disse Martin Lee, um defensor de longa data da democracia que serviu no Conselho Legislativo entre 1985-2008 e é presidente fundador do Partido Democrático de Hong Kong. Ele falou ao lado de Anson Chan, o ex-secretária-chefe de Hong Kong, na Fundação Nacional para a Democracia (NED) em 2 de abril. A NED, uma organização sem fins lucrativos financiada pelo Congresso americano, que fornece subsídios para apoiar a democracia em todo o mundo, deu a Lee seu Prêmio Democracia em 1997.

“Nós deveríamos ter tido [a democracia] em 2007. Mas agora não a teremos em 2017, porque Pequim gostaria de dar ao povo de Hong Kong o voto – uma pessoa, um voto –, mas sujeito a nomeação de Pequim. Em outras palavras, Pequim nos dará o fantoche A ou o fantoche B e aleluia, elegemos um”, disse Lee.

Pequim anunciou recentemente que apenas pessoas “patrióticas” de Hong Kong podem se candidatar a chefe-executivo.

Conhecido por seus partidários como Fundador da Democracia de Hong Kong e desprezado por oficiais comunistas chineses, Lee, com 75 anos, nos lembra que em 1984, quando a Grã-Bretanha e a China assinaram a Declaração Conjunta, promessas foram feitas. A preocupação na época era que os cidadãos de Hong Kong fugissem em massa quando a República Popular da China assumisse o controle de Hong Kong em 1997.

Assim, o conceito de “um país, dois sistemas” foi concebido para garantir ao povo de Hong Kong, os investidores estrangeiros e outros que a economia e o modo de vida de Hong Kong não mudariam. A ilha de 7 milhões teria um grande grau de autonomia em relação ao continente, e seria chamada de Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAEHK).

A Declaração Conjunta afirma que o sistema capitalista de Hong Kong permanecerá por um período de pelo menos 50 anos, até 2047, e que o sistema comunista da China não seria imposto. Os direitos e liberdades – a Constituição de Hong Kong – são explicitados na Lei Básica, que afirma em seu artigo 26: “Residentes permanentes da RAEHK terão o direito de votar e de ser eleitos, de acordo com a lei.”

Muitos países, incluindo os Estados Unidos, deram suas bênçãos à Declaração Conjunta, disse Lee. “Todos os países que apoiaram a declaração, e continuam a apoiá-la, têm a obrigação moral de falar pelo povo de Hong Kong, quando algo, como hoje, está indo muito errado.”

Valores essenciais erodidos

Anson Chan falou da “interferência flagrante” de Pequim nos assuntos governamentais de Hong Kong. Ela disse que os “valores centrais” de Hong Kong de “abertura, transparência, igualdade, estado de direito, liberdade de expressão, especialmente a liberdade de imprensa”, foram corroídos com o aumento da interferência de Pequim.

Chan se identifica com o estado de direito presente durante o domínio colonial britânico, quando atuou como chefe do serviço público, um papel que ela continuou sob o regime de Pequim. Chan, de 74 anos, foi a primeira de etnia chinesa a ocupar a segunda posição mais alta no governo de Hong Kong.

“O povo de Hong Kong se orgulha do fato de que temos uma identidade distinta da China”, disse ela. Os valores fundamentais são protegidos nos termos da Constituição, a Lei Básica, disse ela.

Ela disse que Pequim não está respeitando o acordo de “um país, dois sistemas”. O Gabinete Central de Ligação de Pequim, estacionado em Hong Kong, “não tem qualquer papel a desempenhar no âmbito da Lei Básica” e não deve interferir na administração interna de Hong Kong, disse ela.

Chan disse que a única alternativa é a “pressão pela democracia plena”. Ela ajudou a lançar a campanha ‘Hong Kong 2020’, que exige o sufrágio universal para a eleição do chefe-executivo até 2017; e, o mais tardar até 2020, a eleição livre dos membros do Conselho Legislativo.

Lee disse: “Temos de fazer alguma coisa para impedir a erosão de nossa liberdade.”

Atualmente, as pessoas de Hong Kong não votam para o chefe-executivo, que é indicado e eleito por um comitê e em seguida nomeado por Pequim. Chan disse que, numa eleição justa e aberta, o comitê de nomeação não deveria aplicar restrições excessivas para evitar que outros se candidatem à eleição, como uma filosofia política.

Chan disse: “O chefe-executivo não tem mandato político para governar.” Os partidos políticos não são incentivados, essas condições criam um clima adverso para os negócios, disse ela.

Lee disse que a percepção pública sobre o chefe-executivo atual é que ele foi eleito por fraude. Ele não comanda “o respeito ou a confiança do povo de Hong Kong”.

Pequim tem de cumprir sua promessa, disse ela. “Vemos cada vez mais um governo paralisado.”

Perdendo as liberdades

Lee disse que Pequim quer controlar a imprensa. “Nós tínhamos quatro jornais independentes, mas agora só há um, o Apple Daily.” A China continental pressiona os anunciantes, alguns dos quais são bancos internacionais, para cessar a publicidade no Apple Daily. “Com isso ocorrendo, como podemos esperar que a liberdade de imprensa continue?”

O líder chinês Xi Jinping foi a Hong Kong dois anos atrás. Lee lembrou que Xi disse “ao Chefe de Justiça e outras autoridades numa ocasião pública que nossos juízes têm de cooperar mais com nosso governo… Como um líder comunista, ele espera que os juízes de Hong Kong se comportem como juízes chineses! Mas isso não está correto.”

A China continental tem um sistema de quotas, “um esquema de licença de mão única”, que permite que 50 pessoas entrem por dia, disse Chan e acrescentou que isso deve ser gerenciado melhor. Lee disse que o governo de Hong Kong não tem voz ou controle sobre quem pode entrar em Hong Kong. Ele descreveu como o sistema é abusado por espiões vindos do continente.

Chineses do continente entram em Hong Kong, obtêm um documento de identidade, em seguida retornam para o continente, esperam sete anos e voltam dizendo que residiram em Hong Kong pelo período de sete anos. O escritório de imigração não os verifica. Desta forma, eles garantem a residência permanente. Lee disse que eles se registram para votar e no dia da eleição eles são transportados do continente e votam como lhes é ordenado. Lee disse que há cerca de 300 mil desses indivíduos.

Lee está impedido de retornar ao continente, onde ele nasceu. Ele disse numa entrevista de 2008 à revista Time: “Como um cidadão chinês, eu não estou autorizado a voltar a meu país, mesmo que eu seja bem-vindo em qualquer outro país do mundo.”