Histórica emoção expressa no quadro ‘Boa sorte’ de E. Blair

12/08/2014 22:06 Atualizado: 12/08/2014 22:06

Edmund Blair Leighton (1852-1922) viveu numa época em que a arte acadêmica perdia seu apelo: sua ênfase na perfeição formal não conseguiu evitar que a maior parte de sua arte se tornasse genérica e sem inspiração. Ao mesmo tempo, a revolução industrial mudava dramaticamente a sociedade e também em larga escala.

O que caracteriza o trabalho de Leighton é seu amor por expressar o lado forte e bom da humanidade. Muito do seu trabalho tem um cenário medieval, não o da Idade Média das trevas, mas o que mostra vislumbres de um cavalheirismo medieval vibrante.

O silêncio íntimo (quase sagrado), bem como a honestidade de emoções que ele infunde em seus personagens faz seu trabalho destacar-se de muitos de seus pares acadêmicos cujas obras muitas vezes sofriam de superficialidade na dimensão emocional.

Embora as academias tradicionais treinassem alunos com perfeição técnica, eles não ensinavam – ou não sabiam como ensinar – os alunos a compreenderem a essência mais profunda da vida e do que significava ser humano.

A fim de tocar as pessoas num nível mais profundo, para inspirá-las e trazer à tona o melhor delas, a Renascença incutiu a ideia de que se deveria cultivar a si mesmo em primeiro lugar e em tantos aspectos quanto possível: social, intelectual, espiritual, artisticamente etc.

Infelizmente, este ideal se desvaneceu depois de Rubens, que pela maneira como viveu talvez tenha sido o último artista renascentista.

O trabalho em destaque neste artigo de Blair Leighton é chamado “Boa Sorte” (“God Speed”, em inglês). Na cena, um cavaleiro de armadura e pronto para partir para a guerra despede-se de sua amada. Ela amarra uma faixa vermelha em volta de seu braço, que significa que ele deve retorná-la. Este costume medieval – uma superstição se preferir – assegurava que as partes seriam reunidas, vivas e bem.

Um grifo, símbolo de força e coragem militar, adorna o corrimão das escadas que separam o casal. Ele parece perseguir a montaria do cavaleiro para acompanhar o resto da tropa.

A decisão já foi tomada. Eles optaram por não fugir de seu destino, eles escolheram enfrentá-lo da melhor forma que podem. Deserção e viver o resto de suas vidas como refugiados era aparentemente (assim esperamos) ainda menos do que eles queriam.

A riqueza de emoção enche o rosto do cavaleiro enquanto ele olha para sua amada. Seus olhos são algo triste, seu rosto impávido. É como se a concretude do momento finalmente se abatesse sobre ele: a realidade da partida, o perigo iminente, a angústia da separação, a incerteza de saber se veriam-se novamente.

E num nível menos emocional, ele enfrenta a possibilidade de perder não só ela, mas a própria vida.

Delicada e elegantemente, ela responde amarrando a faixa de retorno no braço do amado, expressando sua única esperança.

O terror da separação imposto sobre eles é temperado pela interação entre os dois, transformando o momento em algo inesquecível e poderoso. Não é este um par de opostos interdependentes em equilíbrio perfeito?

Pensando nele, ela muito sabiamente lhe dá o que ele mais precisará – um desejo inflexível de voltar. A pureza de seu gesto, honesto, simples, imaculado por gritos ou lágrimas, é uma memória que certamente permanecerá brilhando em seu coração, mesmo nos momentos mais sombrios da guerra. A memória poderia fazê-lo seguir em frente quando outros cavaleiros desmoronariam.

Sua atitude firme é tudo que ele pode deixar a ela, mas é uma semente que manterá suas esperanças vivas nos dias de solidão e de incerteza.

Wim Van Aalst tem mestrado em publicidade e design gráfico e é um pintor autodidata que ensina técnicas tradicionais de pintura a óleo