A economia nos fornece algumas leis verdadeiras, do tipo: se temos A, então temos necessariamente B, que gera C, que provoca D, etc. Algumas destas leis são verdadeiras em qualquer ocasião, isto é, A sempre é válida (a lei da utilidade marginal decrescente, as preferências temporais, etc.).
Já outras leis requerem que A seja considerada a priori como verdadeira antes que seus efeitos possam ser afirmados na prática.
A pessoa que identifica as leis econômicas e as utiliza para explicar fatos econômicos complexos está agindo como um historiador econômico, e não como um teórico econômico. Ele é um historiador quando procura a explicação causal dos fatos passados; e ele é um prognosticador quando ele tenta prever os fatos futuros.
Em ambos os casos, ele faz uso de leis absolutamente verdadeiras, mas precisa saber determinar quando alguma lei em particular se aplica a uma determinada situação. Adicionalmente, as leis econômicas são necessariamente qualitativas, e não quantitativas. Assim, quando o prognosticador tenta fazer previsões quantitativas, ele está indo muito além do conhecimento fornecido pela ciência econômica.
Algo que raramente é entendido é o fato de que as funções do economista num livre mercado são nitidamente distintas daquelas do economista num mercado regulamentado. O que pode fazer um economista num mercado totalmente livre? Ele pode explicar como realmente funciona a economia de mercado (uma função vital, principalmente porque os leigos tendem a considerar a economia de mercado como sendo um caos absoluto), mas ele pouco pode fazer além disso.
Contrariamente às pretensões de muitos economistas, ele seria de pouca serventia aos empreendedores num livre mercado. O economista não pode prever as futuras demandas do consumidor e os custos futuros tão bem quanto os empreendedores; afinal, se ele pudesse, então ele seria o empreendedor. Sabemos que o empreendedor está onde está precisamente por causa de sua superior habilidade de previsão do mercado.
As pretensões dos econometristas e de outros “modeladores” de que eles podem prever com precisão e acurácia a economia irá sempre soçobrar perante a simples, porém devastadora, indagação: “Se você pode prever tão bem, por que você não está no mercado de ações, onde previsões acuradas geram ricas recompensas?”
Não adianta rejeitar tal pergunta — como muitos têm feito — alegando que ela é “anti-intelectual”; este é exatamente o teste rigoroso a ser enfrentado pelo pretendente a oráculo econômico.
Ludwig von Mises demonstrou a falácia do termo “modelagem”, que é muito popular e que surgiu erroneamente (junto com muitas outras falácias cientificas) de uma analogia com as ciências físicas, nesse caso, a engenharia. Os modelos de engenharia fornecem a exata dimensão quantitativa — numa miniatura proporcional — do mundo real. Porém, nenhum “modelo” econômico pode fazer algo parecido.
Nos últimos anos, foram desenvolvidas novas disciplinas matemáticas e estatísticas cujas pretensões eram ajudar os empreendedores a tomar decisões concretas. Não é o objetivo aqui estipular se tais pretensões são válidas ou não; o objetivo é dizer que tais disciplinas não podem jamais fazer parte da ciência econômica, mas sim de um tipo de tecnologia de gerenciamento. O economista, nunca é demais repetir, não é um tecnólogo comercial.
Portanto, o papel do economista numa sociedade livre é puramente educacional.
Mas quando o governo — ou qualquer outra agência usando de violência — intervém no mercado, a “utilidade” do economista se expande. A razão é que ninguém sabe, por exemplo, quais serão as demandas dos consumidores no futuro, numa determinada área. Como explicado acima, num ambiente de livre mercado, o economista será naturalmente substituído pelo prognosticador empreendedor. Porém, quando o governo se intromete no mercado, criando várias intervenções e regulamentações, as coisas ficam muito diferentes, pois o problema agora é saber precisamente quais serão as consequências dos atos do governo.
Em resumo, o economista pode ser capaz de dizer quais serão os efeitos de um aumento na demanda por manteiga; mas isso será de pouca serventia, pois o empreendedor está majoritariamente interessado não nas consequências — as quais ele sabe muito bem para seus propósitos —, mas sim em saber se tal aumento irá ocorrer. Por outro lado, quando se trata de uma intervenção governamental, o “se” passa a ser exatamente o que os cidadãos irão decidir coletivamente. E é nessa situação que o economista, com seu conhecimento das várias consequências alternativas, ganha seu reconhecimento.
Ademais, as consequências de um ato governamental, sendo indiretas, são muito mais difíceis de serem analisadas do que as consequências de um aumento na demanda do consumidor por um produto. Isso requer que o raciocínio seja desenvolvido de forma dedutiva e em cadeias cada vez maiores, particularmente ao se considerar os objetivos dos criadores das políticas econômicas. A decisão do consumidor de comprar manteiga e a decisão do empreendedor de entrar no ramo da fabricação de manteiga não requerem um raciocínio dedutivo, mas sim uma compreensão clara dos dados concretos. Por outro lado, o julgamento e a avaliação de um ato governamental requer cadeias maiores de raciocínio dedutivo.
Assim, por duas razões — devido ao fato de os dados iniciais lhe serem fornecidos e pelo fato de as consequências terem de ser analiticamente exploradas —, o economista é bem mais “útil” na condição de economista político do que na condição de conselheiro comercial ou tecnólogo. Numa economia regulamentada, o economista frequentemente se torna útil aos empresários, uma vez que um raciocínio econômico mais elaborado se torna importante, por exemplo, para analisar os efeitos da expansão do crédito ou de um aumento nos tributos ou nas tarifas de importação. No geral, o economista se tornará importante apenas para espalhar esse conhecimento ao mundo externo.
O economista político, com efeito, é indispensável para qualquer cidadão que queira formular julgamentos éticos na política. A economia por si só jamais pode fornecer soluções éticas, mas ela pode sim fornecer leis existenciais que não podem ser ignoradas por qualquer um que esteja querendo formular conclusões éticas — da mesma forma que ninguém pode decidir racionalmente se o produto X é uma comida boa ou ruim antes de as consequências sobre o corpo humano serem apuradas e levadas em consideração.
Murray N. Rothbard (1926-1995) foi um decano da Escola Austríaca e o fundador do moderno libertarianismo. Também foi o vice-presidente acadêmico do Ludwig von Mises Institute e do Center for Libertarian Studies
Esta matéria foi originalmente publicada pelo Instituto Ludwig von Mises Brasil