Financial Times quer promover a China, mas omite detalhes

20/05/2014 13:49 Atualizado: 20/05/2014 13:49

A China é um gigante econômico; isso não pode ser contestado. O que pode ser contestado é o desejo dos comentaristas econômicos de ignorar os Estados Unidos e propagandeá-la como a economia mundial número 1.

Esta semana, o Financial Times (FT) publicou um artigo dizendo que a China ultrapassará os Estados Unidos como a maior economia do mundo até o final de 2014. Eles citaram uma pesquisa interessante do Programa de Comparação Internacional lançado pelo Banco Mundial.

Para simplificar, a análise do Banco Mundial utiliza o conceito de Paridade de Poder de Compra (PPC) para comparar as dimensões relativas das economias, em vez de apenas dividir, por exemplo, o produto interno bruto (PIB) da China, medido em yuan, pela taxa de câmbio atual do dólar americano (atualmente, US$ 1 = 6,26 yuanes).

Usando essa medida simples, o PIB dos EUA foi de US$ 16,2 trilhões em 2012 e o da China foi de US$ 8,2 trilhões – ainda um longo caminho à frente.

Porque taxas de câmbio são influenciadas por outros fatores além do comércio ou da produção e consumo domésticos (fluxos de capitais e especulação, por exemplo), elas distorcem o consumo e a produção reais de uma economia local – o reflexo verdadeiro da riqueza de um país e seu poder econômico.

Por meio de uma série complicada de ajustes estatísticos, a análise de PPC do Banco Mundial remedia esta situação e calcula o tamanho relativo de diferentes economias usando uma taxa de câmbio unificada. O resultado da análise é que os consumidores de baixa renda em países em desenvolvimento podem realmente comprar mais produtos a preços locais, porque eles são mais baratos também.

A última vez que o estudo foi feito em 2005 a economia da China correspondia a 43% do tamanho da economia dos EUA. Os novos números de 2011 elevaram este valor para 87% – indicando uma aproximação rápida.

O diabo está nos detalhes

Mas os problemas começam aqui no artigo do FT, que reflete amplamente a opinião dominante de que a China está ascendendo e que os Estados Unidos estão em declínio.

Em primeiro lugar, é impossível determinar quando a China ultrapassará os Estados Unidos, até que o Banco Mundial faça outro estudo em alguns anos. Para saber por que, observemos o relatório original do banco:

“As mudanças nos índices de volume entre os anos de referência são devido a mudanças nos níveis de preços relativos, bem como em alterações nos níveis de volumes relativos. Como resultado, a taxa de crescimento relativo derivada dos índices não é consistente com aquela obtida de volumes de PIB estimados pelas próprias economias.”

Em outras palavras, os estatísticos estão nos dizendo que não podemos comparar maçãs com laranjas e que os ajustes complexos de poder de compra em termos relativos entre as economias não podem nos dar números de crescimento real sobre o tamanho da economia. Eles apenas fornecem um vislumbre momentâneo.

Se estamos interessados em crescimento relativo, podemos usar o que os departamentos de estatística dos Estados Unidos e da China nos dizem.

Aqui, o FT tropeça, ao assumir que o crescimento mais rápido do PIB chinês em yuan em comparação com o crescimento do PIB dos EUA em dólares desde 2011 compensará a diferença de 13% no PIB calculado segundo a metodologia da PPC.

Isto é comparar maçãs com laranjas, porque as taxas de crescimento derivadas dos cálculos individuais do PIB da China e dos Estados Unidos não refletem os ajustes de preço e volume relativos segundo o método da PPC, que sempre representa apenas um instantâneo no tempo.

Estatística e qualidade

Outro fator omitido pelo FT em sua análise é o problema dos enormes erros de amostragem admitidos no próprio relatório do Banco Mundial.

“[A] margem de erro pode ser de mais ou menos 15% para economias que diferem amplamente em suas estruturas de preço e econômica. Isto deve ser considerado quando se utiliza, por exemplo, as PPCs dos Estados Unidos, China, Índia e Brasil para comparar os países, não só entre si, mas também com as economias de países mais díspares, como a maioria das economias africanas.”

15%! Claro, essas margens poderiam oscilar em ambos os sentidos, o que significa que a China possivelmente já está no topo ou que demorará pelo menos mais alguns anos para chegar lá. A questão é: não é possível se chegar a uma conclusão definitiva.

Outro problema importante com a metodologia da PPC é que ela não pode medir com precisão a qualidade. E o método da taxa de câmbio também não pode, mas isto é digno de nota.

Enquanto consumidores podem ser capazes de comprar mais do mesmo produto na China por menos dinheiro, eles provavelmente também obterão qualidade muito inferior. Por outro lado, se eles querem obter o mesmo produto de qualidade na China, ele pode não existir ou custar muito mais caro para ser adquirido. Sobre a questão de quando a economia chinesa superará a dos EUA como a maior do mundo, só o tempo dirá. Mas se basearmos nossa comparação em paridade de poder aquisitivo, teremos de esperar alguns anos até que o Banco Mundial apresente seu próximo relatório.